Os centros urbanos em Portugal e a cidade de Lisboa, em particular, vivem um problema crescente com a habitação que o ‘mercado’ não se mostra capaz de resolver e os poderes públicos tardam em contrariar.
É inequívoco que existe um desequilíbrio entre a oferta e a procura de habitação em Lisboa. Faltam habitações com preços comportáveis para famílias com rendimentos médios, faltam habitações de cariz social, faltam habitações para alugar e faltam habitações para estudantes.
A especulação imobiliária que tem estado na ordem do dia resulta, sobretudo, do desequilíbrio entre a oferta e a procura. Trata-se de um fenómeno recente e, talvez por isso, os mecanismos para assegurar a justiça fiscal perante a dita especulação possam não estar ajustados a esta nova realidade. Importa, neste contexto, distinguir uma venda ocasional de um particular da obtenção de mais-valias por parte de empresas e fundos imobiliários que se dedicam a esta atividade. No entanto, importa ter presente que a especulação imobiliária deve ser combatida, sobretudo, através do aumento da oferta.
O Estado e as autarquias podem e devem ter um papel essencial no reequilíbrio do mercado ajustando a fiscalidade, criando programas de oferta de habitação pública para arrendar, disponibilizando alojamentos para estudantes, utilizando os imóveis públicos em programas de habitação, mantendo o parque habitacional público em condições de ser utilizado ou não contribuindo para a especulação imobiliária com os imóveis de que dispõe.
A oferta de habitação para arrendamento começou por ser dinamizada pela reforma do arrendamento urbano e dos instrumentos para a reabilitação urbana em 2012, embora com alguns aspetos que deveriam ter sido corrigidos (nomeadamente quanto à proteção dos mais idosos e do comércio tradicional), coincidiu com o aumento da procura de habitação para aluguer de curta duração (alojamento local) que prejudicou a sua eficácia. Tal fenómeno deve ser ajustado com incentivos fiscais ao arrendamento de longa duração de modo a aumentar a respetiva oferta, bem como com a criação de um seguro de renda que promova maior segurança para os proprietários. Lamentavelmente, o atual Governo, que tanto criticou a reforma anterior, ainda não tomou nenhuma medida de incentivo ao arrendamento.
A cidade de Lisboa tem uma situação particular de carência de habitação. Mas a autarquia dispõe de um parque habitacional e de património em que devia investir em vez de alienar e que há muito deveria ter colocado no mercado de arrendamento, seja através da reabilitação de edifícios dispersos pela cidade em mau estado, seja com a utilização de fogos devolutos em bairros municipais. São milhares de fogos do município que deveriam estar disponíveis em programas públicos de habitação.
Existem também alguns milhares de fogos de particulares que estão devolutos. Quanto a estes, importa criar mecanismos eficazes de promoção da sua utilização. O agravamento do IMI aplicável nestes casos não se tem mostrado eficaz e importa aperfeiçoar este mecanismo.
A cidade de Lisboa tem a particularidade de concentrar um património imobiliário do Estado considerável, muito do qual em mau estado, devoluto, ou em vias de ser alienado. Importa que o Governo se comprometa com este património na resolução do problema da oferta de habitação, disponibilizando-o para programas públicos de habitação para arrendar.
O problema da habitação em Lisboa é um problema sério e deve merecer o empenho do Estado e da autarquia com mais concretização e menos promessas e um compromisso político que ultrapasse posições dogmáticas ou acusações cruzadas.