João Ribas voltou ao Jardim dos Coruchéus, mas em forma de homenagem. Quatro anos depois da sua morte, o cantor punk tem agora um mural em Alvalade, local onde nasceu e onde deixou a sua marca e a que chamava ‘a capital da capital’. A iniciativa coube à junta de Freguesia «que assim procurou homenagear o músico, cuja vida e carreira profissional estiveram profundamente ligados a Alvalade. João Ribas viveu toda a sua vida em Alvalade, freguesia à qual os seus percursos pessoal e profissional estão indelevelmente ligados. Foi aqui que surgiram as suas bandas, era aqui que se realizavam os ensaios e alguns dos vídeos das músicas têm Alvalade como cenário», explica a entidade ao b,i.
O mural é da autoria de João Morais e foi criado a partir de uma fotografia de Pedro Lopes tirada nesse jardim. «Muitos dirão que os Coruchéus eram a segunda casa dele. Mas eu direi que o Jardim dos Coruchéus foi para o meu irmão, durante grande parte da sua vida, mais do que uma segunda casa. Foi uma extensão da sua casa, no número 96 da Avenida de Roma», referiu a irmã do músico durante a cerimónia de inauguração. Segundo Isabel Ribas, era neste local que Ribas «se encontrava e convivia com os amigos», funcionando também este espaço como «sala de ensaios, sala de aula, escritório e local de eleição para refletir ou relaxar».
Esta ideia não é nova. Nos últimos anos, esta Junta de Freguesia tem vindo a promover várias obras de arte urbana, «por entender que esta forma de expressão contribui não só para o embelezamento do espaço público mas também para a criação de ligações da comunidade com o ambiente que a rodeia», lembrando que «tem olhado para a arte urbana como forma de gravar para a posteridade a memória de alguns dos seus nomes maiores». E dá, como exemplo, os dois murais inaugurados recentemente dedicados ao arquiteto Nuno Teotónio Pereira e ao escritor José Cardoso Pires.
Mas a homenagem ao músico punk pode não ficar por aqui. Em marcha está uma petição para mudar o nome do jardim dos Coruchéus para jardim João Ribas. Uma mudança que, no entender da Junta, faz todo o sentido. «É uma questão que colocamos na nossa agenda há muito, desde o falecimento de João Ribas, e pela qual continua a pugnar. Também é essa a vontade da sua família, amigos e admiradores».
A petição foi apreciada pela Assembleia Municipal de Lisboa, em 2014, que aprovou por unanimidade e aclamação um parecer da Comissão Permanente de Cultura, Educação, Juventude e Desporto que manifestava posição favorável a esta alteração. No entanto, a atribuição do nome do músico ao jardim é uma questão da competência da Comissão Municipal de Toponímia. «Segundo informações recolhidas pela Junta de Freguesia de Alvalade junto da Câmara Municipal de Lisboa, a apreciação da atribuição de topónimo não teve ainda lugar por não terem decorrido cinco anos desde a morte de João Ribas – princípio que consta da Postura Municipal sobre Toponímia e Numeração de Polícia», refere.
Nome incontornável no movimento punk
Antes dos Tara Perdida – formados em 1995 e regressados em 2013, com o álbum Dono do Mundo, depois de um interregno de cinco anos -, o músico já tinha tido várias aventuras punk. Sobretudo com os Ku de Judas e os Censurados, bandas que formou durante a década dos 1980 com o seu grupo de amigos de Alvalade, onde era uma espécie de herói local.
A vida de João Ribas confunde-se com a própria história do punk em Portugal. «De facto, o punk afirma-se em Portugal a partir de Alvalade, embora sempre numa lógica underground, de não-reconhecimento», chegou a revelar Paula Guerra, autora do livro Palavras do Punk, lembrando ainda que este era então «um bairro residencial habitado por uma classe média-alta aberta às influências externas, onde os discos iam chegando». E onde havia , sobretudo, muitos adolescentes – alguns dos quais nunca cresceram totalmente, como João Ribas.
Em 2009, antes da estreia dos Tara Perdida no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, o músico, em entrevista à Lusa, dizia: «Acho que continuo a ser a criança que sempre fui, continuo um Peter Pan. Claro que há responsabilidades, mas ao nível musical sempre fui assim. Continuo a dizer que o punk é eterno, as regras estão feitas e não mudam».
Mas apesar da fidelidade ao passado e ao punk, chegou a admitir que a idade acarretou uma evolução: «Cresces e crias o lado filosófico da situação e acho isso normal. A nível de letras é isso que estamos a fazer, numa onda mais ‘cool’. Até porque não somos uma banda política. A minha política é o trabalho».
O músico morreu, em abril de 2014, com 48 anos vítima de doença respiratória.