Quem sai aos seus não degenera», «tal pai, tal filho», «filho de peixe sabe nadar». A sabedoria popular nunca falha – ou quase nunca -, e neste caso, aplica-se perfeitamente. Aliás, a Fórmula 1 em específico tem convivido bastante ao longo dos anos com este fenómeno: os filhos de grandes pilotos que acabam por se tornar também eles grandes pilotos. Alguns (poucos) até melhores. Graham e Damon Hill e Keke e Nico Rosberg conseguiram o feito-mor (pai e filho campeões mundiais); Gary e David Brabham, Nelson Piquet Júnior e Michael Andretti tentaram orgulhar da mesma forma os pais Jack Brabham, Nelson Piquet e Mario Andretti, mas nunca o conseguiram. E depois há o caso único dos Villeneuve: Gilles, o pai, foi vice-campeão mundial em 1979 e viria a falecer três anos depois, aos 32, no auge da carreira; seria o filho, Jacques, a conseguir a consagração maior em 1997, derrotando… Michael Schumacher.
E é do apelido Schumacher que trata este artigo. O maior campeão da história da Fórmula 1 (sete títulos mundiais) ainda não recuperou totalmente do grave acidente sofrido em dezembro de 2013, quando se encontrava a fazer ski nos Alpes franceses. Consigo estava o filho Mick, na altura com apenas 15 anos mas, a exemplo do pai (bem como do tio, Ralf, que também competiu durante vários anos na Fórmula 1), também um amante das corridas motorizadas – começou a competir nos karts aos nove anos. Durante vários anos, correu ‘escondido’ sob o pseudónimo Mick Betsch, numa demonstração clara de que pretendia trilhar o seu próprio caminho e fugir ao peso do apelido – com tudo o que isso acarreta.
Em 2014, já depois de vários pódios e um terceiro lugar no Campeonato Alemão de Karts de juniores, passou a ser apenas Mick Júnior, sagrando-se vice-campeão mundial e europeu na categoria de juniores. A partir do ano seguinte, quando fez a transição para a Fórmula 4, abandonou os medos e ‘tornou-se’ o Mick Schumacher. Rapidamente mostrou habilidade e predicados que o fizeram saltar de categoria e em 2017 estreou-se na Fórmula 3 pela Prema Powerteam, equipa com ligações à Academia de Pilotos da Ferrari. Ficou em 12.º no primeiro ano – um prelúdio para o que estava para vir: a vitória no Campeonato da Europa, conseguida na passada semana ‘em casa’, no emblemático traçado de Hockenheim (Alemanha). E isto, três meses depois de ter vencido a primeira corrida em Fórmula 3… no mesmo circuito onde, 26 anos antes, o pai havia conquistado o primeiro dos seus 91 triunfos na Fórmula 1: Spa-Francorchamps, na Bélgica.
Sem pressas para o topo
De imediato se começou a avançar com a possibilidade de ver Mick subir à Fórmula 1, a exemplo do que aconteceu recentemente com Lance Stroll ou Esteban Ocon. O jovem piloto não enjeita a possibilidade, mas aborda o assunto com uma assinalável maturidade. «Agora já podemos pensar na próxima aventura, mas prefiro andar em frente de forma gradual, passo a passo, preparando-me da melhor forma. O mais importante é tomar sempre a decisão mais correta e é isso que vamos fazer nas próximas semanas. Todos os pilotos têm o objetivo de chegarem à Fórmula 1, que é a categoria rainha onde estão os melhores. Falámos com algumas equipas para encontrar a melhor estratégia para o próximo ano mas só quero dar o salto quando estiver 100 por cento preparado», comentou após o triunfo.
A verdade é que já há equipas a posicionar-se para o receber. Entre os quais a Ferrari, claro. «O mais importante é deixar o Mick crescer sem acrescentar pressão. Os resultados recentes são muito bons e espero que tenha uma grande carreira. Com o nome como o dele, que escreveu páginas históricas do percurso da Ferrari, a porta de Maranello vai estar sempre aberta, claro, mas sem queimar passos. O que vai ou não fazer a seguir é uma decisão dele e da família mas temos de deixá-los aproveitar. Repito sempre isto: mantém-te focado, concentrado, mas ao mesmo tempo diverte-te, cresce devagar mas com certezas, e depois veremos o futuro”, referiu no mês passado Maurizio Arrivabene, líder da escuderia italiana, com o chefe da Mercedes, Toto Wolff, a dizer que Mick «tem todas as condições para ser um dos maiores».
Gerhard Berger, ex-piloto e atual presidente do DTM, foi ainda mais longe: «O Mick parece o pai. Levanta-se como o pai, anda como ele. Dei-me conta até que tem os braços do pai, mas o mais importante é que tem os genes competitivos do pai, sobretudo nesta fase final do Campeonato. Se continuar assim com este rendimento, o seu caminho vai levá-lo à Fórmula 1.»
E até a concorrência mostra entusiasmo com a possibilidade. «O Michael é considerado o melhor piloto de todos os tempos, é o que tem mais títulos mundiais e o Mick está a fazer um trabalho fantástico – é óbvio que tem imenso talento, como o pai tinha. E é também um grande miúdo. Tem feito parte da nossa equipa nalguns fins de semana, é muito atento e tem um grande talento. O nome não vai ser um peso, na minha opinião. Aliás, acho que vai ser fantástico para o desporto”, comentou recentemente Lewis Hamilton, que este domingo se pode sagrar pentacampeão mundial.