A Rússia fez um esforço extraordinário para influenciar o sentido de voto dos afro-americanos ao mesmo tempo que tentava dissuadir o eleitorado democrata de votar nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016, afirma um relatório encomendado pelo Comité de Inteligência do Senado e revelado ontem pelo “New York Times”.
Além de explicar como Moscovo interferiu nas eleições, o documento, encomendado pelo comité à empresa New Knowledge, especializada em cibersegurança, alerta para os riscos de essa mesma interferência continuar nas redes sociais: “As operações de interferências ativas e contínuas permanecem em várias plataformas”. Uma segunda campanha, explica o “New York Times”, continua a ser desenvolvida nas redes sociais em relação à guerra civil na Síria, favorecendo o presidente Bashar al-Assad, aliado de Moscovo. E, em 2017, quando a comunidade de informações dos EUA se debruçava sobre o Facebook e o Twitter, Moscovo passou a focar-se no Instagram.
O relatório agora divulgado junta-se a um outro encomendado pelo mesmo comité à Universidade de Oxford, revelado no domingo pelo “Washington Post”. Ambos os documentos basearam-se em informações fornecidas pelo Facebook, Twitter e outras redes sociais e provam as suspeitas da comunidade de informações norte-americana durante as presidenciais.
O documento revelado ontem estabelece uma ligação entre o presidente russo, Vladimir Putin, e a interferência nas eleições ao acusar a empresa Internet Research Agency (IRA) – comummente apelidada de fábrica de trolls -, que pertence a Yevgeny Prigozhin, oligarca próximo de Putin, de ser a responsável pelas centenas de contas que disseminaram informações falsas para influenciar segmentos do eleitorado.
As contas focavam-se num tema, partilhavam informações falsas e construíam audiências, passando de seguida para outro tema que, porventura, dividisse a sociedade norte-americana. Depois, com as audiências já criadas, vinha a partilha de informações confidenciais que colocassem em causa os adversários de Trump, nomeadamente a então candidata democrata Hillary Clinton, beneficiando a campanha do primeiro. Para o provar, o relatório elenca uma série de contas e os conteúdos por si partilhados, apresentando tendências relativamente a temas e períodos temporais.
Neste sentido, afirma o documento, a interferência foi desenhada para atacar Clinton, impulsionar a campanha de Trump e acentuar as divisões presentes na sociedade norte-americana.
Entre as inúmeras comunidades existentes nos EUA, uma foi especialmente visada: a afro-americana, um velho alvo dos tempos da Guerra Fria. “Os esforços mais prolíficos da IRA no Facebook e no Instagram visaram especificamente comunidades afro-americanas e parece terem-se focado em desenvolver audiências afro-americanas para os recrutar”, lê-se no documento, referindo que uma série de sites sobre ativismo negro foram também criados. Os serviços secretos russos também terão chegado a recrutar norte-americanos de todas as etnias, especialmente afro-americanos, para organizarem eventos políticos que aprofundassem as divisões no país.
A par da investigação à interferência russa pelo procurador especial Robert Mueller, este relatório dificulta a narrativa de Trump e coloca em causa a sua legitimidade enquanto presidente democraticamente eleito. A Casa Branca ainda não reagiu à divulgação dos relatórios.