Helena Isabel está habituada a ser pioneira. Foi pioneira na primeira telenovela portuguesa, Vila Faia (1982). Antes disso, fez parte da criação do Teatro Ádóque (1974), a primeira cooperativa de teatro de revista que foi um dos espaços emblemáticos de intervenção cultural no pós 25 de Abril. Decidiu que queria ser atriz desde menina, «maçou toda a gente» até o conseguir, e desde os 18 que trabalha na profissão com que sonhou. Fez-se atriz no teatro, junto de professores como Lia Gama ou Henrique Santana, e fez de tudo um pouco – desenhou figurinos, varreu palcos, montou e desmontou cenários. Depois, veio a televisão, onde aprendeu que, afinal, também gosta do «imediatismo». Nunca se desligou completamente nem de um, nem de outro meio e é assim que quer continuar apesar de hoje sentir que faltam papéis para atores mais velhos, uma opção que não compreende. E é contra o preconceito da idade que apareceu também o seu mais recente projeto, e que foi o mote desta entrevista: o site (http://helenaisabel.pt/) que lançou no passado dia 6, em que completou 67 anos, e que é também o primeiro projeto dedicado a motivar as mulheres mais velhas a tirarem o melhor partido de si próprias. E é por lá que começamos.
Como lhe surgiu a ideia para o seu site?
Houve uma determinada altura em que decidi escrever um livro sobre as mulheres mais velhas, contando a minha experiência e também falar um pouco das minhas escolhas. E a partir daí pensei: porque não um site? Isto no sentido de ser uma continuação lógica do livro, até porque com certeza há gente que não o leu. Achei que o site fazia todo o sentido num país onde as mulheres mais velhas se tornam quase invisíveis, sobretudo em algumas profissões.
Sente isso na pele?
Um bocado, sim. Sinto que há uma enorme preocupação com a juventude, com a frescura, com as caras novas que aparecem em detrimento de atores mais velhos que poderão não estar tão novos mas que têm mais experiência, e não só. Se formos ver no estrangeiro há lugar para toda a gente – há papéis maravilhosos para atrizes maravilhosas que já ultrapassaram os 70, até os 80; cada vez mais há séries com protagonistas mais velhos, por exemplo, Grace and Frankie, ou O Método Kominsky , que ganhou o Globo de Ouro de Melhor Série de comédia. E neste país continua a achar-se que não, que ser-se mais velho não interessa ao público, o que eu acho que é ridículo e completamente errado.
Até porque a maior franja da população é composta por pessoas mais velhas.
E as pessoas que vêm televisão também são. Foi por tudo isso que resolvi fazer uma coisa para as mulheres a partir, sei lá, do 50, para que se afirmem, que marquem a sua presença e que sobretudo não se esqueçam de que ainda podem ser úteis, fazer coisas interessantes e serem interessadas.
Essa lacuna de papéis é um tema que costuma falar com as colegas atrizes, é uma reflexão que fazem em conjunto?
Claro que sim. Se formos a ver, e sobretudo os produtos televisivos – que é onde hoje em dia os atores trabalham mais –, cada vez têm menos personagens mais velhas. É um facto.
Está a ser chamada menos vezes?
Nem sequer sou das pessoas que mais me posso queixar, mas o que é facto é que há atores mais velhos desempregados há muito tempo.
Como foi a sua aproximação às redes sociais? No início houve desconfiança e depois uma rendição?
Aderi logo. Para já interessam-me as novas tecnologias. Sou uma pessoa muito interessada por tudo o que se faz agora: na música, no teatro, nas novas tecnologias… Vivo muito o presente, não sou uma pessoa nada agarrada ao passado.
Não tem uma gota de saudosista?
Nada! Posso pensar que o passado foi bom mas penso logo a seguir que já lá vai, e é isso mesmo, é passado. E também não quero pensar muito no futuro para não deprimir, porque cada vez é mais curto. Então vivo o presente com toda a alegria com que possa ter e todo o interesse. A primeira rede onde estive foi o Facebook, e fui logo uma das primeiras, porque um amigo meu que se interessa imenso por tecnologia me mostrou e eu entrei logo. Depois quando surgiu o Instagram comecei a achá-lo muito mais interessante, parece-me que as coisas não se tornam tão violentas.
Mas também têm um enorme nível de exposição.
Sim, é verdade. O meu Instagram é sobretudo profissional, mas também é pessoal, e é aberto.
É evidente que não exponho muito a minha vida privada porque nunca expus enquanto não havia redes sociais, portanto não é agora que vou começar a fazê-lo. Não encontra fotografias minhas a acordar com um olho ainda fechado (risos). Sou uma pessoa mais discreta. Posso até pôr um jantar com amigos, mas só isso. E depois também acho que não sou muito autocentrada…
Foi sempre assim?
Sempre fui assim, e cada vez sou mais porque vejo tanta exposição da vida privada das pessoas que isso faz com que me retraia mais.
Nunca teve a sensação de que estava a ficar viciada em redes sociais?
Isto acaba por viciar um bocadinho. Por exemplo, eu acordar e não dar uma vistas de olhos não acontece, e isso se calhar já é um bocadinho viciante. Mas nessa ronda vejo sempre também as capas dos jornais e das revistas. E depois pouso o telemóvel e é que começo o dia. Agora não sou daquelas pessoas permanentemente agarrada ao telemóvel. Hoje vejo coisas aberrantes, como as pessoas estarem no teatro e agarradas ao telemóvel.
Mas a assistir a uma peça?
Pois! Já me aconteceu estar no palco e ver as luzes dos telemóveis porque as pessoas estão a trocar mensagens, ou a ver se têm correio. Para nós que estamos no palco é horrível, desconcentra completamente. Quando estamos a representar para um público temos uma massa escura à nossa frente, indiferenciada, e desconcentra imenso começar a ver umas luzes aqui e ali. Nestes últimos dois anos fiz duas peças de teatro e reparei que isso acontecia frequentemente. As pessoas não têm noção do mau que é para nós, em cima do palco, assistir a isso. É uma questão de senso comum – se vou ver um espetáculo é porque estou interessada nele.
Voltando ao site: os textos são todos seus?
Também tenho convidados, mas os textos são meus – também tenho vídeos em diversas situações.
Vai ser sobretudo aquilo que penso sobre a vida, sobre as coisas, e também vai ter secção de beleza,
de nutrição, exercício físico, tudo aquilo que penso que é importante para nós, mulheres, porque é um site especialmente dedicado às mulheres. Por outro lado, e como eu quero muito ouvir as pessoas e dialogar com elas, terá outro espaço de troca de mensagens, quero muito começar um diálogo.
E as dicas que dá são coisas que experienciou ao longo da sua vida e que lhe fazem sentido?
Vai haver de tudo. E vai se calhar mostrar um bocadinho mais de mim e que as pessoas não conhecem, porque sei que sou uma pessoa fechada, não dou muitas entrevistas nem falo muito da minha vida.
Já referiu várias vezes que preza muito esse lado privado. Foi sempre assim desde o início da sua carreira ou foi criando carapaça?
Sempre fui assim. Não sou uma pessoa muito aberta, nem na minha vida pessoal, quando conheço alguém, não me ponho logo a falar da minha vida. Sou uma pessoa fechada por natureza. Portanto não foi carapaça. Quando comecei a ser conhecida, e quando surgiram as revistas cor-de-rosa, as pessoas começaram a querer saber com quem é que eu namorava ou não, e eu sempre achei que essas coisas fazem parte da nossa vida privada. Nós temos uma vida tão exposta, temos de guardar alguma coisa para nós. Por isso é que nunca fiz entrevistas em casa.
Hoje as revistas cor-de-rosa são muito diferentes de quando começaram? Passámos a ter as
pessoas ‘famosas’ a ‘exporem-se’ elas próprias, a escolherem o que querem publicar. Acha que vocês próprios estão a matar os paparazzi?
Completamente! Mas isso não acho mal (risos). Acho que foi uma coisa boa das redes sociais.
Era horrível uma pessoa nunca se sentir à vontade. Fui várias vezes fotografada na praia, apareci várias vezes assim em capas de revista…
E como lidava com esse momento?
Era muito embaraçoso para mim. Ultimamente já ia à praia desconfiada, a olhar para todo o lado,
e já pedia aquelas coisas para pôr à volta com medo que me fotografassem. E isso passou completamente, isso hoje em dia não existe.
Vai estrear em breve a série Solteira e Boa Rapariga, na RTP.
Foi uma série que adorei fazer!
Qual é o seu papel?
Faço de mãe da Lúcia Moniz, uma mulher completamente maluca, e que viaja com as amigas para a Índia, que tem montes de namorados, e a filha é o oposto. Sossegadinha, não sai de casa, não tem namorado. E ela tenta aconselhar a filha no sentido de ter uma vida mais parecida com a sua. É uma comédia! Diverti-me imenso, adorei trabalhar com o Vicente Alves do Ó que não conhecia e de quem fiquei fã. O texto e a realização são dele, e acho que ele tem uma aptidão para este género fantástico, o que neste país é raro.
Vamos fazer uma viagem ao passado: o que diria à Helena de 30 anos? Diria para não gastasse energia em quê, que não valia a pena?
Acho que tudo o que fiz valeu a pena. Só nos podemos arrepender daquilo que não fizemos, e aquilo que fiz e fiz muita coisa – felizmente tive uma vida muito, muito preenchida, e espero continuar a ter. Não sinto que tenha esbanjado energias em coisas que não valeram a pena._Para já sempre vivi muito em relação à minha profissão – ser atriz sempre foi muito importante para mim. Depois foi na década dos 30 que casei, que tive um filho e que fui felicíssima. Nem sequer posso fazer a mínima crítica ao meu comportamento nessa altura porque fui tão feliz e foi tão bom (risos).
As mulheres mais velhas costumam dizer que tinham muito mais inseguranças quando eram mais jovens. É verdade?
Sim, isso é uma verdade. Eu era muito insegura, sempre fui. Continuo a ser um bocadinho, mas hoje em dia sou muito menos. Tenho muito mais noção daquilo que valho, tenho muito mais noção daquilo que faço bem ou menos bem – ou mesmo mal! E já não me preocupo… Quando somos muito novos há uma certa tendência para tentarmos agradar, ou uma pressão para que gostem de nós, que nos considerem profissionalmente. Hoje não sinto essa pressão. Se gostarem gostam, se não gostarem paciência. E se eu fizer uma coisa muito bem profissionalmente fico felicíssima, se fizer uma coisa menos bem também relativizo e penso que para a próxima farei com certeza melhor.
Acha que uma mulher mais velha é uma mulher mais livre?
De certa maneira sim. Nunca tinha pensado nisso sob essa perspetiva, mas sim. Somos mais livres no sentido de nos sentirmos menos pressionadas de tentar agradar a uma sociedade que às vezes também não nos dá nada em troca. Acho que cada vez mais as mulheres mais velhas têm tendência a fazer aquilo que lhes dá na gana e não fazerem fretes.
Já falou disso noutras entrevistas, que sente que a relação entre homens e mulheres está mais igualitária…
Está mais complicada, também!
Por que diz isso?
Antes, há muitos anos, as mulheres dependiam muito dos maridos e não se separavam, ou porque dependiam financeiramente, ou porque achavam que os filhos iam sofrer com isso…
Mas a sua mãe separou-se, numa altura em que era atípico.
Foi efetivamente um caso atípico, mas separou-se e nunca mais casou nem teve nenhuma relação, coisa que hoje seria impensável. E separou-se novíssima, com trinta e tal, quarenta no máximo. As pessoas antigamente casavam para a vida, hoje é, como dizia o Vinicius, é «eterno enquanto dure».
Nasceu em Lisboa, viveu sempre cá. Qual foi o bairro onde cresceu, o que recorda desse local?
Cresci no Areeiro. A minha memória mais antiga é a de ir a pé para a escola. Morava ali ao pé da Avenida de Roma, no cruzamento da João XXI, e ia a pé para a escola que era no Areeiro, uma coisa impensável, hoje ninguém deixaria um filho ir a pé para a escola aquele caminho todo. Naquela altura era tranquilo, íamos todos em grupo.
E memória de infância doce, que lhe roube um sorriso?
A vespa do meu pai. Recentemente andei a procurar fotografias por causa do livro e descobri uma foto com a minha mãe, a minha irmã, as três sentadas na vespa do meu pai, e bateu aí tanta saudade, logo a mim, que não sou nada saudosista! Salvo erro era uma vespa azul bebé. Fiquei a pensar que sempre tive o sonho de ter uma vespa, não me importava nada de ainda o concretizar.
Morou numa zona muito na moda…
Na altura era uma zona nova.
Quando dizia na moda referia-me ao facto de estar muito ligada aos movimentos que se juntavam no Vá Vá, por exemplo. Também fazia parte desses grupos?
Esses grupos do Vá Vá são todos um bocadinho mais velhos do que eu, e nessa altura não frequentava tanto. Quando comecei a frequentar já aquilo estava um bocadinho diluído, portanto não posso dizer que seja da geração do Vá Vá. Naquela altura eles teriam mais uns cinco anos do que eu, o que era uma diferença importante nessas idades. Com 15 anos eu não ia para o café passar a tarde sozinha, não me deixavam.
Houve algum espaço de convívio no bairro que tivesse sido importante para si ou começou noutro lado a explorar a sua veia mais artística?
Os meus pais sempre me levaram muito ao teatro, felizmente, primeiro aos teatros infantis e depois ao teatro de comédia. E houve uma altura em que quis muito estar do outro lado, todo aquele mundo me começou a fascinar. Sempre tive um temperamento artístico. Comecei por fazer ballet, e fiz durante muitos anos. Depois apaixonei-me pelo teatro – quando pensei em ser atriz, aos 15 ou 16 anos, pensei em ser atriz de teatro. Não havia sequer telenovelas.
E depois a partir daí qual foi o percurso até conseguir concretizar o sonho?
Andei a maçar toda a gente. Primeiro a maçar os meus pais, claro, a dizer que queria ser atriz, o que eles acharam péssimo. Hoje é uma profissão que dá imenso charme, mas naquela época não era, sobretudo para as mulheres. Mas lá consegui furar e fazer um pequeno papel numa peça de teatro.
Qual era a peça?
Chamava-se Os Direitos da Mulher, com a Lia Gama, que é a minha madrinha de teatro.
E fui começando devagarinho.
Antigamente começava-se muito devagar, hoje, vai-se logo para protagonista.
É bom começar devagar?
Acho que sim, penso que se aprende muito mais. Quando se vai para uma coisa com mais responsabilidade, uma protagonista ou assim, a pessoa já sabe mexer-se, já sabe muita coisa da profissão. Como não fiz o conservatório para mim foi uma aprendizagem muito importante começar assim, trabalhei com grandes nomes. A minha aprendizagem fez-se a trabalhar. Por isso é que aconselho toda a gente que vem ter comigo a dizer que quer ser ator ou atriz a ir estudar.
Li que quando começou no teatro se envolvia em tudo, até chegou a fazer os figurinos, entregou-se mesmo totalmente.
Completamente. Depois, naquela altura trabalhei muito no que nós chamávamos os grupos independentes, em que tínhamos que fazer tudo, desde passar o guarda-roupa a varrer o palco, e isso é também uma aprendizagem muito boa. Partilhávamos as tarefas todas porque éramos um bocadinho outsiders, não havia grandes apoios, como continua a não haver (risos). Há coisas que não mudam. E como sempre adorei roupa e sempre adorei desenhar, depois houve uma altura em que cheguei a desenhar figurinos.
Lembra-se para que peça?
A última que fiz foi para o Vânia do Tchekhov com encenação da Isabel Medina (em 2012).
Recorda alguma situação caricata desses tempos dos grupos independentes?
Tantas! Houve uma tournée que fizemos em África de oito meses…
Em que países?
Angola, Moçambique, e chegámos a fazer África do Sul, isto antes do 25 de Abril, ainda havia as colónias. Em Moçambique, na altura, as estradas eram picadas. Uma vez íamos da Beira para Quelimane, ou vice-versa, e ficámos empanados no caminho, no meio da picada. Felizmente passaram uns camiões da tropa que nos safaram (risos). Como esta tenho milhentas histórias.
Tinha consciência política nessa altura? Ter ido às colónias mudou-a?
Mudou muito. Quando fui para África trabalhar nessa tal tournée não tinha a mínima consciência política. Comecei a ver os horrores da guerra quando comecei a trabalhar lá e a visitar os hospitais. Chegámos a fazer espetáculos para as tropas e vi coisas tão horríveis que me despertaram uma consciência social que até aí eu não tinha. Também era muito miúda, tinha uns 18 anos. Fui para África uma adolescente e voltei uma adulta.
Depois qual foi o seu papel na criação do Ádóque?
Entretanto deu-se o 25 de Abril e nós tínhamos um grupo de tertúlias do qual fazia parte a Maria do Céu Guerra, o Francisco Nicholson, o Mário Alberto, o cenógrafo, e então começámos com o sonho de criar uma cooperativa de teatro de revista que era uma coisa que nunca tinha existido. Já tinha existido noutro tipo de teatros, mas em revista nunca. Então criámos realmente uma cooperativa, montámos um teatro no Martim Moniz e pronto, demos largas à nossa criatividade e foi um êxito. Eu estive pouco tempo, porque entretanto precisei de ser operada às cordas vocais e depois já não voltei a entrar, mas a companhia durou oito anos. Só saiu porque recebeu ordem de despejo, porque aquilo era assim um bocadinho clandestino (risos).
A primeira vez que entrou na televisão foi em 1965, no programa Riso e Ritmo.
Deve ter sido a primeira, mas foi uma coisinha muito pequenina. Lá está, eu estava sempre a tentar furar, a maçar as pessoas, a pedir para me deixarem ser atriz e fazer qualquer coisa nem que fosse entregar uma carta.
E dentro do meio quem era assim a grande figura que se tinha que maçar?
Na altura havia assim um grande empresário que era o Vasco Morgado e foi ele que levou comigo a pressioná-lo, e foi quem me deu oportunidade na tal peça dos Direitos da Mulher. Depois logo a seguir fui para África com a tournée.
Foram interpretar que peça?
Levámos sete peças no repertório! Por isso é que digo que o meu conservatório foi o palco. Trabalhei com o Ribeirinho, com o Henrique Santana, com a Lia Gama, que me ensinaram tudo. Comecei muito cedo e com grandes profissionais, tive essa sorte.
Quando começa a fazer novelas – e começa logo na primeira novela portuguesa, a Vila Faia –, não pára de fazer televisão durante muito tempo e afastou-se um bocadinho do teatro, ou esta perceção está errada?
Continuei sempre a fazer teatro, mas mais esporadicamente. Nos primeiros 11 anos da minha profissão fazia peças atrás de peças. Estava a fazer uma e já a ensaiar outra, e isso realmente quando comecei a fazer televisão alterou-se um bocadinho, mas nunca deixei de fazer teatro.
Sente o provérbio não há amor como o primeiro, prefere o teatro à televisão?
Não, gosto das duas coisas. São técnicas tão diferentes, mas ambas apaixonam-me. Por um lado, podemos preparar tudo muito melhor no teatro, estudar as personagens, o texto, mas por outro também gosto muito do imediatismo da televisão.
Qual foi o impacto da Vila Faia na sociedade?
Acho que foi enorme, porque até aí o país parava para ver as novelas brasileiras, que tiveram um enorme impacto na nossa sociedade em termos de comportamentos, de abertura, de maneira até de falar. Com a entrada das novelas portuguesas conseguimos um feito que, penso eu, histórico, que foi pôr as pessoas que estavam tão habituadas a ouvir ficção falada em português do Brasil a ouvir português de Portugal. No início diziam: ‘Ah, parece que não dá jeito’. Depois habituaram-se. Penso que, hoje em dia, as novelas portuguesas têm muito mais audiência do que as brasileiras, o que é extraordinário, uma coisa que nunca ninguém pensou que pudesse acontecer. Felizmente que é assim, porque deu imenso trabalho aos atores, desenvolveu inclusive a nossa televisão, a nossa ficção de uma maneira extraordinária, sobretudo a nível técnico, e para nós foi muito bom.
E também nisso foi pioneira.
Fui! Fui nas novelas com a Vila Faia, com o Ádóque, e também fui pioneira no programa que revolucionou o humor em Portugal, que foi O Tal Canal.
Muitas vezes é apresentada como a mãe do Agir e ex-mulher de Paulo de Carvalho. Isso aborrece-a?
Não, se eu também não fosse uma pessoa conhecida, sobretudo pelo meu trabalho, as pessoas não diziam: ‘Olha, é a mãe do Agir’. Se eu fosse uma ilustre desconhecida nem me reconheceriam. Não me maça de todo, e em relação ao meu filho, então, até me dá imenso orgulho.
Dão conselhos um ao outro?
Sim, e sobretudo criticamo-nos muito (risos). Fico muito contente porque ele sempre que vai lá a casa mostra-me tudo o que está a fazer, os clipes, as músicas, o que é sinal que ele também se preocupa com a minha opinião. E vice-versa.
Era muito galanteada na rua, como foi há pouco quando estávamos a tirar fotos, em que um senhor lhe chamou flor?
Aconteceu, acontece (risos). Agora os homens têm um certo constrangimento em dizer piropos, mas naquela altura ouvíamos de tudo, os agradáveis e os desagradáveis.
Lembra-se assim de algum engraçado?
O melhor piropo que tive até hoje, mas não foi para rir, foi porque me encheu de orgulho, foi a Eunice Muñoz que mo deu. Disse-me: ‘Estás tão bem, está tão bonita. Tens a cara que mereces’. Nunca mais me esqueci disto. É um cliché dizer que o nosso interior é que conta, mas é um cliché que é verdade.
Pegando nisso: não gosta de falar de questões de beleza. Nas entrevistas sente que é absurdamente maçada com isso?
Sinto! Às vezes quero falar do meu percurso profissional, ou de algum projeto que estou a desenvolver, e as pessoas só me perguntam ‘mas como é que faz para estar tão jovem’. Agora respondo: vejam o site (risos).