«Esta zona está muito melhor desde que fizeram obras de requalificação ao prédio», disse ao SOL a gerente de uma das duas lojas tipicamente portuguesas que ocupam o rés do chão do famoso ‘prédio [Ricardo] Robles’, nome do ex-vereador do Bloco de Esquerda (BE) e dono do edifício. Além de parecer quase pintado de fresco e do comércio que se começa a instalar por lá é também possível ver, através das varandas, que o prédio já é habitado.
Embora não comente quaisquer polémicas, a gerente que preferiu anonimato, garantiu que, tanto para o turismo como para os locais, as obras vieram dar um novo ar aquela zona de Lisboa. Conta até, a título de curiosidade, que quem procurar o prédio no Google Maps vai poder perceber o contributo que o projeto de reabilitação veio dar ao prédio.
As duas lojas que ficam na Rua do Terreiro do Trigo, conta a gerente, abriram em novembro e são os turistas quem mais as visita. Como em muitos dos negócios, esta afirma que a atividade «depende da sazonalidade», mas garante que «tudo está a correr bem».
O prédio – que vai do número 6 ao 26 – já esteve à venda por 5,7 milhões de euros e conta com 11 apartamentos que vão desde os 25 até aos 41 metro quadrados e já esteve envolvido em forte polémica, ao ponto de levar o bloquista a renunciar ao mandato na Câmara de Lisboa por considerar que «criou um enorme constrangimento» à sua «intervenção como vereador».
O espaço com um total de 728 metros quadrados esteve à venda na agência Porta da Frente Christie’s, um site dedicado à venda de imóveis de luxo, caracterizado como ‘investimento em área prime’ com apartamentos para ‘short term rental’. No anúncio, em julho de 2018, podia ler-se que todos os apartamentos tinham cozinha equipada, vidros duplos e piso em madeira tábua corrida. E explicava também que este se situava junto ao Museu do Fado e do Largo do Chafariz de Dentro, ou seja, dois pontos turísticos fortes.
No entanto, a história deste prédio nem sempre foi tão feliz como o ambiente que se vive naquela zona de Lisboa nos dias de hoje.
Ricardo Robles e a irmã Lígia compraram este mesmo prédio em 2014 à Segurança Social por 347 mil euros. Para isso, os proprietários recorreram a ajuda de familiares e de dois empréstimos em dois bancos distintos: Montepio e Caixa Geral de Depósitos, segundo o Jornal Económico.
O prédio, que se encontrava degradado e com necessidade de obras profundas, levou a que os irmãos investissem cerca de 650 mil em requalificação.
Antes das obras moravam cinco inquilinos no prédio, mas apenas um casal aceitou fazer um novo contrato de arrendamento de 170 euros de renda mensal com um contrato de oito anos. Já o dono de um restaurante colocou os irmãos Robles em tribunal, exigindo uma indemnização de 120 mil euros por causa das obras que fez ao longo do tempo, depois de os proprietários se terem oferecido para pagar cinco mil euros. Hoje são poucas as pessoas que falam sobre quem habita aqueles apartamentos e se são casas de primeira habitação ou para arrendar.
Mas o dono do restaurante não foi o autor da única queixa. Em julho de 2016, os vizinhos das traseiras fizeram queixa, alegando que estas prejudicavam a propriedade onde viviam, mas a Câmara de Lisboa defendeu a requalificação, uma vez que estas faziam parte do Plano de Urbanização do Núcleo Histórico de Alfama e Colina do Castelo. As razões apresentadas prendiam-se com o telhado de duas águas e a construção sobre a Muralha Fernandina.
As obras foram para a frente e o prédio das Alcaçarias do Mosteiro perdeu a vista para a rua e para o rio, devido ao andar extra e à mudança do telhado.
Depois de feitas as obras e de requalificado o prédio, Ricardo Robles viu o prédio ser vítima de vandalismo. «Aqui podia morar gente», podia ler-se nas paredes deste prédio que entretanto já desapareceu. Frase que era o antigo slogan do Bloco de Esquerda em 2010, que propunha a recuperação de casas em avançado estado de degradação para arrendamento.
O prédio entrou ainda mais na mira da atualidade, uma vez que Ricardo Robles acusava o governo que integrava de promover a especulação imobiliária e chegou mesmo a propor a criação de uma imposto especial, «taxa Robles», que iria incidir em quem compra e vende num curto espaço de tempo.