Esperavam que à 3.ª edição deste Barómetro houvesse mais medidas para mitigar este fenómeno?
Há uma indefinição política e estratégica de restruturação do sistema de saúde. Não é um problema só português, mas há países que estão a dar passos mais substantivos. Por exemplo, na Escócia o diretor regional da Segurança Social é também responsável pela Saúde, os problemas são geridos em conjunto. Nós infelizmente ainda não temos políticas ativas de restruturação do setor hospitalar e que integrem também uma resposta social. Há necessidade de criar uma agenda estratégica para o setor da Saúde.
Era possível ter sido feito mais?
Temos um problema grave de investimento. De 2009 a 2017 houve uma redução do investimento na Saúde e em 2018 houve um ligeiro aumento. Para restruturar é preciso investir. Os hospitais estão muito limitados pela reduzida autonomia. Para muitos dos doentes internados por motivos sociais, o desenvolvimento de soluções em ambulatório seria uma vantagem, mas quando os hospitais pedem recursos humanos para novos projetos, se o Ministério da Saúde percebe o que se pretende fazer, chega às Finanças e não entendem o que está a ser dito. Há uma barreira de linguagem.
Os pedidos continuam a ter de ir às Finanças?
Só as substituições de longa duração é que deixaram de ter de ir às Finanças, quando está em causa substituir pessoas ausentes por mais de 120 dias. É muitas vezes mais rápido contratar um médico do que um assistente operacional ou um técnico de serviço social. Há fenómenos pouco racionais do ponto de vista económico porque não existe conhecimento do setor. Temos um projeto mas se demora nove meses a haver uma autorização de contratação, o projeto dilui-se. Há uma frustração nos hospitais quando se tenta encontrar soluções.
A discussão da Lei de Bases da Saúde é uma oportunidade para avançar nesta área?
O que nos parece é que tem de haver um pensamento estruturado entre setores. O SNS para enfrentar os desafios precisa de uma resposta integrada com a Segurança Social. Mas para já há medidas que podiam ser implementadas – a majoração da comparticipação dos medicamentos para famílias com menos recursos, maior articulação entre os hospitais e equipas domiciliárias de cuidados continuados. Caso contrário, nas ondas de calor e frio vamos ter problemas de congestionamento dos hospitais quando há camas com doentes que deviam ter outras respostas.
Os casos de abandono de doentes nos hospitais são residuais?
Sim. São sempre dramáticos, mas a grande questão não é o abandono. Podia pensar-se: isto acontece porque as famílias não querem ter os doentes em casa. Não é verdade. As famílias não têm capacidade logística e financeira, muitas vezes é preciso adaptar as casas, as pessoas precisam de cuidados 24 horas. A discussão em torno dos apoios ao cuidador informal é muito importante mas ainda não é uma resposta efetiva. Vão avançar apoios mas em 2020 e como projeto piloto. Ao longo do tempo fomos desenvolvendo respostas para a parentalidade. A verdade é que ainda não soubemos reagir às situações de incapacidade e envelhecimento.