Anunciou que vai deixar a política ativa. Estava cansada?
A minha vida profissional passou quase toda pela política. Fiz por muito pouco tempo advocacia. Vim para o Parlamento, em 1995, como assessora jurídica convidada pelo Paulo Portas e vou sair agora porque só tinha duas hipóteses: ou ficava na política para sempre ou procurava outra coisa. É horrível anunciar ao mundo que fiz 50 anos, mas a verdade é que se fizesse mais um mandato teria 54 anos. Já não teria outras hipóteses profissionais. Na política uma pessoa corre o risco de se acomodar ou então de se saturar.
Já estava saturada?
Não queria que nenhuma dessas coisas acontecesse comigo. Não me quero acomodar à política e também não me quero saturar.
Sabe o que vai fazer a seguir?
Ao longo destes três mandatos tive vários convites, mas para fazer bem o meu trabalho tinha de me dedicar em exclusividade ao Parlamento. A área em que adquiri mais experiência foi na Saúde. Foi talvez a área em que recolhi mais conhecimento, mas também tenho experiência na área da Segurança Social. Neste momento, não tenho nada de concreto, mas vou utilizar a experiência que adquiri e rever as solicitações que me foram feitas.
Entrou na política a convite do Paulo Portas….
Sim. Convidou-me para ser assessora jurídica.
Já o conhecia?
Conhecia-o porque ele era diretor de O Independente e estava a fazer o estágio no escritório que tratava dos processos do jornal. Como pode imaginar choviam processos. Acabei o estágio e fui para um escritório grande, mas ao fim de seis meses houve as eleições legislativas em que deixamos de ser o partido do táxi. Nessa altura, fui convidada para vir para aqui como assessora jurídica.
Teve dúvidas em aceitar?
Tive um dia para decidir e pensei: se não é agora que vou à aventura, com 24 anos, não vai ser nunca. E aqui estou.
Nessa altura tinha alguma admiração pelo Paulo Portas?
Tinha. Absolutamente. Tinha uma enorme admiração por ele como cronista. Hoje vejo que o jornal cometeu alguns excessos, mas vou achar sempre que O Independente foi uma pedrada no charco.
Como viveu esse tempo do cavaquismo? Havia aquela ideia dos novos ricos…
Era quase uma miúda, nessa altura, e na verdade os meus dias eram ocupados a tratar da parte jurídica.
Só veio para Portugal com 18 anos. Foi um choque deixar a Bélgica com essa idade para viver em Portugal, que na altura era um país ainda muito atrasado?
Foi quando entrei para a faculdade. Cresci na Bélgica. Hoje em dia Portugal está muito diferente. O Portugal de 1988 era muito diferente de um sítio cosmopolita como Bruxelas onde conviviam pessoas de vários países. Nesse sentido foi um choque. As coisas evoluíram muito em Portugal
Se dependesse de si, teria vindo?
Ainda pensei em ficar lá e tirar o curso de arquitetura. Havia lá faculdades muito boas. Tinha esse sonho, mas os meus pais pressionaram-me para voltar.
Na Bélgica frequentou a Escola Alemã…
Sim. Os meus pais quiseram que aprendesse alemão que é uma língua que dificilmente se aprenderia de outra maneira.
Fala várias línguas…
Tenho essa sorte, mas tenho que começar a ler mais em alemão ou corro o risco de me esquecer.
Foi convidada por Paulo Portas para entrar na política e ficou sempre muito colada à imagem dele. Isso incomoda-a?
É verdade. Houve uma altura em que isso me perturbava um bocadinho. Não foi só o país que mudou. O CDS também mudou. Era um partido muito confinado e houve uma altura em que senti que era vista como a pessoa do Portas. Mas trabalhei aqui muitas horas a fazer pareceres jurídicos. Era esse o meu trabalho, numa fase inicial.
Sentia que havia quem achasse que não tinha vida própria?
Houve uma altura em que talvez me sentisse menorizada. Hoje em dia não tenho problemas nenhuns com isso. Ele foi um excelente líder e não tenho problemas em ser conotada com o portismo.
Acha que Paulo Portas vai voltar à política? Por exemplo, como candidato à Presidência da República?
Não vejo outro cargo com o percurso dele.
Gostava que ele fosse candidato?
Gostava. Ele adora política. Não sei o que vai na cabeça dele, mas gostava que fosse candidato depois de o atual Presidente da República cumprir mais um mandato. Hoje em dia não tenho nenhum problema em me assumir como portista e vejo-o como um excelente candidato e uma pessoa que poderá exercer com excelência o mandato de Presidente da República. Mas isso depende dele.
Fotografia de Miguel Silva
Sempre foi de direita ou teve dúvidas em alguma fase da sua vida? No outro dia ouvi a sua amiga Ana Bola dizer que a Teresa Caeiro é mais de esquerda do que muitas pessoas de esquerda…
Não, não… Sou de direita. Às vezes penso: será que poderia ter pertencido a outro partido? A resposta é não. Mas essas coisas são ditas por pessoas que são minhas amigas.
Mas também porque houve algumas matérias em que se aproximou das posições da esquerda, como na questão da despenalização do aborto…
Essas questões não estão relacionadas com a direita e a esquerda. Ainda há poucos dias, num debate no Colégio Moderno, dizia: a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) é um ser mínimo que se puder progredir vai ser uma pessoa como vocês. O que pensava e continuo a pensar é que não é criminalizando que se resolve o problema. A solução passa por medidas de apoio às pessoas. E passam também pela prevenção.
Não se revê naquela ideia de que a esquerda tem mais sensibilidade social?
Isso não é verdade. A maior vitória da esquerda foi ter tomado para si o monopólio das preocupações sociais. O CDS tem tantas ou mais preocupações sociais do que a esquerda. Mesmo há pouco tempo apresentamos uma proposta para apoiar o cuidador informal.
O Governo de Pedro Passos Coelho, que foi apoiado pelo CDS, não ajudou muito a combater essa ideia de que a direita não tem tanta sensibilidade como a esquerda para algumas questões sociais.
O tempo da troika é o tempo da troika. Não me canso de lembrar que foi José Sócrates quem chamou a troika.
Mas este Governo conseguiu ganhar apoios com a ideia de que acabou com a austeridade dos tempos da coligação PSD/CDS.
Isso é uma tremenda injustiça. Mas acho que o primeiro-ministro cometeu um erro colossal ao dizer que tinha acabado com a austeridade. Somos um país na corda bamba. Há poucos países no mundo que tenham tido três resgates em trinta anos.
Mas o PS continua à frente nas sondagens…
As pessoas têm a perceção errada de que estão a viver melhor. Temos uma carga fiscal exorbitante. António Costa é um grande negociador, mas a verdade é que não teve em conta o interesse do país.
Porquê? Porque fez o acordo com a esquerda em 2015?
Foi um truque. Fez batota. Há muitas coisas que António Costa não teria feito se não estivesse capturado pelo PCP e pelo BE. Mais tarde ou mais cedo as pessoas vão sentir nas suas vidas o impacto desta governação e vão sentir que muitas coisas que lhe foram prometidas não correspondem à realidade. Isso é uma das coisas que os portugueses não perdoam.
Acredita que a direita pode voltar ao poder nas próximas eleições legislativas?
Veremos. A verdade é que não estamos a crescer ao nível de países equiparáveis ao nosso. Não se justificam estes festejos. Há muito descontetamento. Os enfermeiros, os professores, os polícias… Toda esta gente está descontente com o Governo, porque compraram a ilusão que António Costa lhes vendeu.
A direita está a passar por um momento menos bom. O CDS conseguiu ultrapassar melhor o facto de a direita não ter ficado a governar?
Vejo o CDS a crescer e a alargar o seu espetro. Isso é um motivo de grande orgulho. O CDS representa uma direita moderna. Não há há nenhum país civilizado que não tenha partidos de direita. Hoje podemos dizer que somos um partido de direita. Sem complexos. Portugal ainda vive com os complexos do pós-25 de Abril.
A direita viveu durante muito tempo o trauma do salazarismo?
Durante muito tempo e talvez ainda hoje a direita apareça associada ao salazarismo. Não faz sentido nenhum. Não faltam casos de países civilizados que vivem completamente à vontade com partidos de direita no poder. Ainda vivemos com esse estigma que é completamente errado. A direita não tem de ser retrógrada ou contra as liberdades. Pelo contrário. Para o CDS o maior valor são as liberdades individuais.
Foi secretária de Estado da Segurança Social e da Cultura. Como é que foram essas experiências? Fez tudo o que queria ou sentiu o peso da máquina do Estado?
A Segurança Social é um Ministério gigantesco e importantíssimo, porque lida com as nossas vidas desde que nascemos até morrermos. Essa experiência tem tanto de importante como muitas vezes de frustrante. É um bocadinho como o Parlamento.
As decisões demoram mais tempo do que deviam?
As coisas demoram a serem feitas. Orgulho-me muito de ter conseguido criar o regime de cruzamento de dados entre a Segurança Social e as Finanças. Toda a gente me dizia que ia ser impossível e consegui fazer. Mas são máquinas muito grandes e muito pesadas que às vezes trituram as decisões políticas que são tomadas.
No Governo liderado por Pedro Santana Lopes foi secretária de Estado das Artes e dos Espetáculos. Hoje teria aceite este cargo depois de ter sido avisada em cima da hora de que ia mudar de pasta?
É uma coisa que me persegue. Espero que caia no esquecimento das pessoas. É uma coisa de que me arrependo. Não há nada mais estúpido do que as pessoas dizerem que não se arrependem de nada. Arrependo-me de imensas coisas.
Essa é uma delas? Arrependeu-se de não ter rejeitado o cargo depois de ter sido rejeitada como secretária de Estado da Defesa?
É uma das coisas de que me arrependo. Estava a subir as escadas do Palácio da Ajuda e recebi um telefonema do então primeiro-ministro [Santana Lopes] a dizer: estivemos aqui a ver, já falei com Paulo Portas, e você afinal não vai para a Defesa e vai para as Artes e Espetáculos. Nesse momento devia ter virado as costas e devia ter descido as escadas em vez de ter continuado a subir. Mas aquilo já era um Governo tão fragilizado.
Nem teve muito tempo para pensar se ficava ou não…
Não tive tempo e ia ser mais um episódio num Governo que já estava a começar mal. O outro Governo já tinha terminado mal e aquele estava a começar com muita tibieza.
Ficou magoada?
Não é essa a palavra certa. Senti-me insultada. A palavra é mais essa.
Fotografia de Miguel Silva
Como deputada gosta mais de estar na oposição ou no poder?
Do ponto de vista da execução é mais difícil estar com o poder, porque a maior parte da legislação relevante e efetiva depende do Governo e, portanto, os deputados que apoiam esse Governo sentem um certo espartilho. Por outro lado, estando na oposição é mais fácil fazer debate político, mas é muito mais estéril.
É isso que acontece agora?
Quando há uma maioria de esquerda a probabilidade de conseguirmos aprovar iniciativas nossas é muito reduzida.
Lamenta que seja assim?
Lamento. Por acaso é das coisas que lamento verdadeiramente na política. Infelizmente, não há margem e não há um clima que não seja o tudo ou nada. Lamento que não se tentem encontrar pontes para conseguir um consenso em determinadas matérias. Há questões muito importantes, muitas delas não necessariamente ideológicas, em que as partes se podiam endenter.
Qual é a razão para que os partidos tenham às vezes dificuldade em falar uns com os outros?
Dou-lhe o exemplo da Lei de Bases da Saúde. Seria desejável que se encontrasse uma lei de bases duradoura e por questões estritamente ideológicas está a ser difícil encontrar um consenso entre os partidos.
A culpa é só da esquerda?
Ainda esta semana ouvi a Catarina Martins [coordenadora do Bloco de Esquerda] a dizer que está a negociar com o Governo para que as propostas deles sejam aprovadas, deixando de fora a lei de bases do centro-direita. Isto é um exemplo. Há uma grande diferença entre a realidade e a ideologia e uma enorme hipocrisia do lado da esquerda.
Como seria o país governado pela esquerda?
Ia correr muito mal, porque a esquerda gasta como se não houvesse amanhã para satisfazer os seus eleitores . Mais ano menos ano lá estaríamos outra vez a pedir um resgate e a ser obrigados a aplicar medidas de austeridade muito penalizadoras. Se estivesse no lugar do António Costa não caía nessa porque o preço a pagar é muito elevado.
Como é que assistiu a esta polémica à volta da nomeação dos familiares dos ministros e secretários de Estado?
A questão da ética na política gere-se sobretudo através do comportamento das pessoas que é depois punido ou valorizado através do voto. Não creio que possa haver uma lei que consiga ser tão densa, tão densa, que impeça esses comportamentos inadequados. É uma questão pessoal, do responsável político, e de quem o tutela, mas em última análise a sanção vai ser aplicada através do voto.
Tem receio que casos como este tornem cada vez mais distante a relação entre os políticos e os eleitores?
Vejo com enorme preocupação a forma como os políticos são encarados. Quanto mais forem fustigados menos pessoas vão querer fazer política, ou seja, piores pessoas quererão vir para a política. Isso é muito perigoso.
Mas há políticos que têm comportamentos censuráveis e não faltam casos nos últimos tempos…
Nós somos 230 [deputados] e às vezes são meia dúzia que têm práticas pouco éticas e condenáveis. O que me assusta é pensar que as pessoas com qualidade podem não querer fazer política. Isto é um discurso difícil de fazer, porque os políticos devem ser totalmente escrutinados, mas se são sempre apelidados de bandidos corremos o risco de ninguém querer vir para a política. Quem é que vai querer sair do seu escritório ou do seu consultório para se vir juntar a pessoas que são tratadas como bandidos.
Os políticos ganham mal?
Isso é outra questão. Ninguém tem coragem de dizer que os políticos não são bem pagos. Há quem pense que devíamos pagar para ser deputados. Tenho honra em ser deputada. É uma honra ter sido eleita, mas fico esmagada quando alguns contaminam o todo e fico preocupada com o futuro porque são precisas pessoas com qualidade.
Já vi várias vezes, nas chamadas revistas cor-de-rosa, a falarem da sua vida privada. Gosta de aparecer ou é coisa que a incomoda?
Respondo-lhe de uma maneira muito simples: nunca fui capaz de me googlar e penso que nunca vou ser capaz de o fazer. Sou incapaz.
Mas convive bem com isso?
Não. Não convivo nada bem. Se convivesse bem, ia ver o que dizem sobre mim. Prefiro desligar-me. Pode não acreditar, mas nunca fui capaz de pôr o meu nome no Google.
Não é vaidosa?
Acho que sou mais medrosa. Tenho medo do que possa encontrar (risos).
O seu filho, que tem 12 anos, lida bem com o facto de ter uma mãe conhecida?
Não liga nada. Nem pensamos nisso lá em casa.