Alcançar o mesmo lugar, ou até mesmo superar, o resultado que obteve em Pequim em 2008 – 5.º lugar, que é ainda a melhor classificação que Portugal conseguiu nuns Jogos Paralímpicos – é o objetivo de Sara Duarte que tem o sonho de participar nos Jogos Paralímpicos de Tokyo 2020. Garra e ambição não faltam a esta atleta – o único entrave é mesmo o monetário. «Gostava de repetir ou superar! O pódio é sempre o sonho de um atleta e é isso que nos move e nos faz trabalhar, empenhar e lutar por um desporto com qualidade e dignidade», diz ao b,i.
É preciso recuar no tempo para perceber os entraves de uma das principais representantes portuguesas na modalidade paradressage (vertente de competição da equitação terapêutica). Em 2014, após 10 anos de trabalho e várias conquistas, o cavalo Neapolitano Morella faleceu, vítima de uma cólica, o que a impediu de estar presente nos Jogos Paralímpicos do Rio 2016. E com isso perdeu o apoio dos patrocinadores.
Agora de mangas arregaçadas e com um novo companheiro, o Daxx du Hans, está preparada para, quase aos 35 anos, começar do zero. Para tal, Sara ainda precisa de angariar 20 mil euros para poder participar nos próximos Paralímpicos. Depois de uma pequena tentativa em setembro passado, este ano acabou por abrir uma conta solidária. A ideia partiu da mãe e a conta, neste momento, acumula 1600 euros – ainda assim, um valor muito longe do necessário. «Já várias pessoas me tinham falado na hipótese de avançar com uma campanha de crowdfunding. Em setembro aventurei-me, mas só um senhor é que me ajudou. Já este ano a minha mãe quando viu que poderia fazer uma angariação de fundos no seu aniversário, lembrou-se que poderia ser uma maneira de me ajudar e arriscou. Neste momento, já tenho uma conta solidária, quem quiser ajudar pode fazê-lo através do IBAN», revela.
Os 20 mil euros servirão para conseguir realizar as provas internacionais necessárias, durante este ano, e assim alcançar os mínimos para poder estar presente nos Jogos de Tokyo 2020. Sara Duarte explica que, sem atingir estes mínimos, não consegue ser selecionada. E apesar das despesas ficarem a cargo do Comité Paralímpico cabe aos atletas os pagamentos dos três anos que antecedem as provas internacionais, Campeonatos da Europa e do Mundo. «Ultimamente só tinha os Jogos Santa Casa, que patrocinava a equipa onde pertencia, ou seja dividido por seis atletas, mas como saí do centro deixei de ter esse apoio», explica, adiantando que mesmo sendo atleta do Sporting, recebendo do clube leonino um patrocínio individual, tal não é suficiente.
Para trás ficou também a Academia Equestre João Cardiga, onde Sara chegou em 1999, para se iniciar na prática de equitação adaptada. «Passados 20 anos achei que estava na altura ou de parar ou de mudar, decidi pela mudança e tive bastante apoio por parte de amigos e conhecidos do meio, se vai ajudar ou não, não sei. Vamos ver», diz ao b,i.
Um longo caminho
Sara Duarte teve o seu primeiro contacto com o hipismo aos sete anos de idade. Na altura, por indicação médica, a mãe inscreveu-a numa escola de equitação para experimentar a hipoterapia –um método terapêutico destinado a pessoas com deficiência, e Sara tem paralisia cerebral com 72% de incapacidade física. Este método baseia-se na convivência do indivíduo com o cavalo. Daí nasceu a paixão pelos cavalos e pela equitação.
A atleta estreou-se nos Jogos Paralímpicos em Pequim 2008 e conseguiu logo alcançar o quinto lugar. «A experiência foi brutal. Não estava à espera. Não tinha mínimos para participar, mas a federação internacional fez um convite e aceitei. Era a única representante portuguesa. Dentro dos nossos limites conseguimos uma classificação muito boa, de que ninguém estava à espera, nem nós, que trabalhámos para isso», refere.
No ano seguinte a cavaleira chegou ao terceiro lugar no Campeonato da Europa 2009, realizado na Noruega, e em 2012 participou nos Jogos Paralímpicos, em Londres, onde ficou em nono lugar.
O Neapolitano, da raça Lipizanner, foi oferecido à atleta depois de um apelo feito pela cantora Simone de Oliveira num programa de televisão. O criador de cavalos desta raça (da Escola de Viena de Áustria), nos Açores, ouviu o pedido e respondeu. Juntos, cavaleira e cavalo atingiram resultados notáveis, por isso a morte do Neapolitano afetou Sara a «todos os níveis». «O cavalo tinha 13 anos, estava a fazer boas provas, e todo esse trabalho acabou por ir água abaixo. Se não tivesse morrido provavelmente conseguia ir ao Rio de Janeiro. Foi um choque, estava com ele há 11 anos». Ausente do país, a cavaleira assistiu a esta perda à distância, mas a verdade é que não podia fazer nada. «Só um milagre o podia salvar: sofreu uma cólica intestinal e as cólicas nos cavalos são fatais. É raro um cavalo sobreviver», salienta. Só em 2016 é que conseguiu ocupar o lugar do antigo companheiro com o Daxx du Hans.
Apesar da sua paixão pelos cavalos, os sonhos de Sara não ficam por aqui. Com Mestrado em Ciências Farmacêuticas, da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, exerce a sua profissão numa farmácia comunitária.