Há meses que o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fala no «negócio do século», um suposto acordo para pôr fim ao conflito entre Israel e a Palestina. Washington indicou que o acordo seria divulgado no início de junho – após o Ramadão – mas entretanto, esta semana, o jornal Israel Hayom disse ter tido acesso aos pontos principais da proposta, a partir de documentos do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita.
Os pontos revelados vão ao encontro das intenções do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que prometeu anexar os colonatos israelitas na Cisjordânia. Os acordo divulgado diz que estes «permanecerão nas mãos de Israel» – com a perspetiva de crescerem com o acréscimo das áreas entre colonatos isolados. Netanyahu já tinha dito ao jornal Ysrael Hayom que as suas condições eram que «nenhum colono seja deslocado, controlo de território a oeste do Jordão e nenhuma divisão de Jerusalém». Todas elas figuram no acordo.
«A anexação dos colonatos significa legalizar a ocupação», afirmou ao SOL Nabil Abuznaid, embaixador da Palestina em Portugal. O embaixador nota que a Autoridade Palestiniana não teve acesso ao documento, tendo sido apenas informada através dos media. Mas tendo em conta o que foi divulgado, Abuznaid, não tem dúvidas de que a proposta é de um «acordo tendencioso», que «só trará mais sofrimento aos palestinianos». O embaixador conta que apesar das promessas de Netanyahu, «nada foi feito ainda» para anexar colonatos, mas que talvez o primeiro-ministro israelita seja «encorajado a fazê-lo devido ao novo acordo».
O embaixador da Palestina desconfia da capacidade de Trump para agir como mediador quanto ao assunto, notando como o seu Executivo «cortou toda a ajuda humanitária [norte-americana] aos palestinianos». «Parece-lhe que possa haver um acordo justo assim?», questiona Abuznaid, salientando que muitos dos conselheiros mais próximos de Trump são «maioritariamente judeus de direita, nem sequer são judeus liberais, representam a população israelita de direita».
A abordagem musculada de Trump à diplomacia internacional está bem patente no «negócio do século», prometendo cancelar todo o apoio a ambas as partes caso não concordem com as medidas – assinalando em particular que no caso palestiniano «não permitirá que nenhum país do mundo transfira dinheiro para eles».
Abuznaid assegurou que não há qualquer hipótese da Autoridade Palestiniana aceitar estas condições. Caso Trump cumpra as ameaças, o embaixador tem dúvidas sobre o futuro. «A Palestina vai sobreviver e creio que vencerá no fim. Mas quanto à Autoridade Palestiniana, se vai colapsar ou não, isso é uma história diferente».
Recorde-se que o conflito Israel-Palestina é o motivo dos apelos do Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), que pediu que Conan Osíris não fosse a Telavive representar Portugal na Eurovisão – até através de uma carta de Roger Waters. Contactada pelo SOL, Esther Mucznik, especialista em cultura judaica, qualificou o boicote como «um absurdo», afirmando que hostilizar os artistas israelitas «é hostilizar a consciência crítica de Israel, calar uma voz crítica».
Questionada sobre o facto de a artista que conseguiu a vitória de Israel, Netta Barzilai, ter cantado na banda da marinha israelita – acusada de crimes de guerra pelos palestinianos – Mucznik assegura que «ela é livre de cantar para quem quiser», salientando que a Eurovisão será em Telavive, «a cidade mais democrática, mais viva, mais criativa». Já Ben White, membro do BDS, garantiu numa entrevista ao i que a cultura tem um papel importante nas «batalhas de propaganda» do Estado israelita, e que tanto «a gastronomia, a música ou a vida noturna em Telavive fazem parte do chamado rebranding de Israel».