A Câmara Municipal do Barreiro vai avançar com o concurso público para um megaprojeto imobiliário na Quinta Braamcamp no espaço de um mês. A garantia foi dada ao SOL por Rui Braga, vereador da Gestão e Reabilitação Urbana da autarquia. No entanto, este é um investimento que está longe de gerar consenso: apesar de uma sondagem pedida pelo executivo mostrar que 90% apoiar a requalificação deste espaço, o movimento ‘A Quinta do Braamcamp é de Todos’ pondera avançar com uma ação judicial para travar a venda do espaço.
Tal como o SOL já tinha noticiado, em causa está um concurso que terá como valor base cinco milhões de euros e implicará um investimento privado na ordem dos 60 milhões de euros. Está ainda prevista a criação de mais de seis dezenas de empregos. O concurso, confirmou agora Rui Braga, será aberto daqui a cerca de um mês. «Estamos a trabalhar nas peças concursais, naquilo que vai ser a definição das regras [do concurso]. Esse trabalho ainda não foi entregue [à Câmara] e esse é um passo determinante para depois o presidente decidir qual a altura» de avançar com o concurso, explicou o vereador.
Numa sondagem promovida pela Aximage, a que o SOL teve acesso, 91,1% dos inquiridos consideram que este investimento é uma mais-valia para o Barreiro. «A sondagem demonstra que 76,5% dos cidadãos entrevistados concordam com a alienação dos terrenos da Quinta Braamcamp, que obriga os compradores a cumprirem o projeto de requalificação que está previsto para toda a zona», refere a sondagem. O documento explica que este projeto prevê que, «dos 21 hectares de terrenos, 95% serão ocupados por zonas desportivas e espaços verdes, com a edificação de um campo de futebol, zonas de lazer e de desporto náutico. Os restantes 5% serão destinados à construção de habitação».
Como o SOL já tinha avançado, um dos interessados neste projeto é Carlos Matos, um emigrante português em França, que garantiu que, apesar de não ser fácil agradar a todos, iria ter em conta a questão ambiental. Este é, até ao momento, o único que fez chegar uma carta à autarquia a fazer uma proposta, garantiu Rui Braga, que mostra convicto que cheguem mais. «Já tivemos conversas com mais investidores e em sede de concurso aparecerão mais interessados. Essa é, pelo menos, a nossa expectativa», avança.
Uma âncora de desenvolvimento
André Carapinha, um dos responsáveis pelo movimento ‘A Quinta Braamcamp é de Todos’, explica ao SOL que, durante o ano de 2017, «foi feita uma compra aprovada por unanimidade por todas as forças políticas da autarquia», acrescentando que a resolução da câmara que acompanhava essa compra dava garantias de que seria para «usufruto público». «Este ano fomos confrontados com uma intenção de venda e construção imobiliária, que não só não foi aquilo que foi aprovado quando a compra foi realizada, como nunca foi apresentada na campanha eleitoral», acusa. Nessa altura, segundo André Carapinha, foi apresentada uma proposta para um parque temático com um roda gigante, um projeto que considera «espalhafatoso». «Não quer dizer que não fosse um modelo bom mas não tinha nada a ver com o que agora querem fazer», acrescenta.
Agora, este movimento de cidadãos alerta para o potencial daquela zona do Barreiro, que, defendem, será colocado em causa com este megaprojeto: «A Braamcamp é um espaço ribeirinho único, com uma importância ambiental, com um grande potencial ambiental e muito turístico», com potencial para «se tornar uma âncora de desenvolvimento sustentável no Barreiro», projeto que considera ser «completamente perdido com esta opção, que vai privilegiar o imobiliário e não a qualidade de vida dos cidadãos».
Questão ambiental
Uma das questões que mais preocupa os responsáveis pelo movimento ‘A Quinta Braamcamp é de Todos’ é a ambiental. André Carapinha explica que o Plano Diretor Municipal (PDM) do Barreiro está desatualizado e data de 1994. «O PDM permite, de facto, a construção daqueles 30 a 40 fogos, mas segundo a nossa interpretação, se o PDM fosse revisto agora, à luz dos regulamentos ambientais e da carta de risco das alterações climáticas – que demonstra onde há risco de cheias -, nunca seria autorizada a construção de apartamentos ali», uma vez que o espaço se situa numa zona, segundo André Carapinha, que a carta refere como sendo de perigo maior.
«Achamos um contrassenso completo o facto de se autorizar a construção à luz de um PDM que toda a gente concorda que está obsoleto, incluindo a autarquia». E acusa: «Por isso é que está com muita pressa em vender a quinta, porque sabe que, após a revisão do PDM, nunca mais poderá vender aquilo com aquelas condições de construção».
Para tentar evitar a construção, o movimento garante estar a estudar todas as opções a nível jurídico. «Estamos a estudar todas as opções a nível jurídico. Não sei se será uma providência cautelar, eventualmente a figura poderá ser a ação popular, mas estamos a trabalhar nesse sentido.», garante.
‘Não foi feito estudo ambiental’
O vereador da Câmara do Barreiro discorda da posição deste movimento de cidadãos e desvaloriza a questão do PDM, explicando que é uma situação que já está a ser revista. «Esse grupo de cidadãos parece mais uma intervenção política do que propriamente vontade de discutir o futuro da Braamcamp», acusa Rui Braga, admitindo que o PDM está desatualizado, mas que está a ser feita uma revisão, que será entregue às entidades competentes para que possa ser analisado ainda este ano. «Mas não tem nada a ver com ter pressa em colocar isto no mercado», garante o responsável.
Questionado sobre o facto de ter sido realizado um estudo de impacte ambiental, Rui Braga garante que essa «é uma falsa questão». O vereador diz que o estudo não podia ter sido feito porque «não há nenhum projeto em cima da mesa». Explica ainda que só depois de a Câmara escolher o projeto vencedor é que será visto se o mesmo cumpre com o enquadramento legal estabelecido.
A promessa ficou feita: «nada vai nascer na Quinta Braamcamp sem que todos os aspetos técnicos e ambientais sejam salvaguardados. Até porque há mais entidades que têm de opinar naquele território», disse, referindo-se à administração do Porto de Lisboa e à Associação Portuguesa do Ambiente.