Vara contesta tese ‘inventada’ por Pinhal

Ex-administrador da CGD saiu da prisão para ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito à gestão do banco público. Não quis falar sobre Vale do Lobo, mas acabou por não se conter.

Armando Vara avisou os deputados que fazem parte da comissão parlamentar de inquérito à recapitalização e gestão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) que não iria falar sobre o negócio de Vale do Lobo. No entanto, o antigo -administrador da Caixa acabou por revelar que o projeto teve luz verde por parte dos restantes administradores.

«Os factos relativos à concessão de créditos a Vale do Lobo são objeto da investigação da Operação Marquês, que está sob segredo de justiça. Por isso, não devo, por ora, pronunciar-me mais sobre qualquer questão relacionada com o financiamento a Vale do Lobo», afirmou ontem Armando Vara na sua declaração inicial.

No entanto, no decorrer da audição, Vara, que fez parte da administração da CGD entre 2005 e 2007, fez questão de frisar que a operação foi bem recebida por toda a administração: «Houve luz verde para a participação da Caixa no projeto, sem qualquer objeção». Mais tarde, acabou por reconhecer aos deputados que a operação não correu bem: «Eu olho para estas contas e reconheço que correu mal. Lamento que tenha corrido mal (…) É com dor que olho para trás e vejo o que aconteceu com aquele projeto».

Assalto ao BCP 

Vara explicou que uma das primeiras decisões da sua administração foi sair da carteira de ações do BCP: «Não víamos vantagem em ter participação daquela dimensão num concorrente».

Paulo Teixeira Pinto terá dito a Vara que aquela não era a melhor altura para a CGD sair do BCP, pois a sua posição enquanto acionista ajudava-os a protegerem-se contra possíveis ofertas públicas de aquisição (OPA). «Pediu que mantivéssemos pelo menos 1%», explicou o ex-administrador. Vara diz que quando saiu da Caixa, o banco público tinha menos de 5%, garantindo que a CGD «nunca teve qualquer intervenção nas guerras do BCP». Recorde-se que Armando Vara e Carlos Santos Ferreira saíram diretamente da Caixa para a liderança do BCP, em 2008. Vara garante que foi convidado por Santos Ferreira para integrar os altos quadros do banco privado apenas no final de 2007.

Questionado pelo deputado do PCP Paulo Sá sobre se o banco público deve financiar operações especulativas, Vara confessou «não morrer de amores por elas. Mas quando se está na banca, o que tem de se saber é se quando se empresta se irá receber». Em relação ao empréstimo a Joe Berardo para a compra de ações do BCP, o antigo administrador da CGD garantiu que as regras prudenciais foram cumpridas, mas não se lembra se participou na decisão de conceder este empréstimo em particular. Se o fez, explicou, é porque não encontrou problemas no processo: «As operações eram olhadas no seu aspeto legal e não no seu aspeto moral ou ético – o que estava em causa era a legalidade e a capacidade do mutuário de reembolsar», frisou Armando Vara, acrescentando que não conhecia Joe Berardo, que só o conheceu quando foi para o BCP.

Esta semana, o ex-administrador do BCP Filipe Pinhal disse naquela comissão parlamentar que um conjunto de entidades – entre as quais a CGD – e um grupo de personalidades – no qual estava incluído Joe Berardo, Manuel Fino e até Vítor Constâncio, Teixeira dos Santos e José Sócrates – tentaram forçar mudanças na administração do BCP.  Pinhal disse  que estes últimos constituiam «um triunvirato, que deu a bênção sobre toda a operação». 

José Sócrates reagiu a estas declarações de Pinhal acusando-o de «pura e velhaca maledicência» e Vítor Constâncio ameaçou mesmo processar o ex-administrador do BCP. Ontem, Vara também reagiu ao depoimento de Pinhal, falando numa «tese paranóica, inventada pelo setor a que pertence Filipe Pinhal e que acha que somos responsáveis por tudo o que aconteceu no banco. O BCP esteve sujeito a uma guerra interna que o poderia ter destruído e à qual a Caixa foi completamente alheia».