O antigo governador do Banco de Portugal (BdP) afirmou que o banco central não tinha (nem tem) condições para travar o empréstimo da Caixa Geral de Depósitos (CGD) a Joe Berardo, apontando o dedo ao banco público.
“O Banco de Portugal, como supervisor, não tem poderes legais para aprovar operações de crédito cedidas pelos bancos, nem tem poderes para as anular ou fazer reverter. Isso não existe como poder de supervisão em nenhum país europeu ou em qualquer outro país desenvolvido”, disse numa entrevista à TSF e ao Diário de Notícias.
Constâncio voltou a frisar que não teve conhecimento prévio da operação, contrariando o que foi dito por Filipe Pinhal, ex.administrador do BCP, na comissão de inquérito.
“Aquilo que aconteceu foi que, em certo momento, vários acionistas do BCP pediram autorização para ultrapassarem uma posição no capital superior a 5 % e, de acordo com a lei em vigor, ao Banco de Portugal para tomar uma decisão que não é autorizar, é não objetar – uma ligeira diferença que não faz porventura para os nossos ouvintes muita diferença, mas era não objetar. O Banco de Portugal para tomar essa decisão tinha que investigar duas coisas que, obviamente, foram investigadas pelos serviços. Primeiro: que a entidade requerente tinha idoneidade, isto é, que não tinha nenhum caso antigo ou pendente de processos criminais ou administrativos ou disciplinares. E a entidade requerente neste caso era a Fundação Berardo. Que já tinha, aliás, nessa altura, mais de 3% do capital do BCP porque obviamente as fundações são investidores, todas as fundações que conhecemos. Portanto, primeiro, verificar a idoneidade. Em segundo lugar, verificar a origem dos fundos para evitar que pudessem ser, enfim, fundos clandestinos e não legais. E nesse sentido, os serviços do Banco de Portugal obviamente pediram ao requerente que demonstrasse qual era a origem do dinheiro. E o requerente demonstrou, exibindo um contrato de empréstimo que já tinha assinado com a Caixa Geral de Depósitos, antes, em maio. O que ilustra que, de facto, o Banco de Portugal, o supervisor, nunca tem conhecimento antecipado das decisões de crédito que os bancos vão tomar nem as pode fazer anular. E portanto, foi verificado que os fundos tinham origem legal, a idoneidade. Não havia nada, nenhum registo contra a entidade, e a entidade tinha um balanço sólido”, afirmou o antigo governador do BdP.
Vítor Constâncio frisou que a Caixa podia ter travado o empréstimo, apropriar-se das ações e vendê-las. Mas não o fez. Porquê? “Não posso responder porque essas decisões são da exclusiva responsabilidade dos órgãos de gestão da Caixa, como é evidente. Que não tem que informar o Banco de Portugal, que o Banco de Portugal não pode alterar… Qualquer que seja a decisão que a gestão da Caixa tome sobre essa execução do contrato, o Banco de Portugal não pode alterar”.