Despesas das famílias triplicaram

Em 2017, as despesas das famílias com cuidados de saúde no privado tornaram a crescer. Os gastos nos hospitais privados ultrapassaram pela primeira vez os 700 milhões.

Despesas das famílias triplicaram

As despesas das famílias no setor privado da saúde atingiram novos recordes. A trajetória tem sido de sucessivo aumento, mais acelerado do que a evolução da despesa pública em saúde. Dados divulgados esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)revelam, por exemplo, que a despesa das famílias com hospitais privados, sem contar com as comparticipações a cargo de eventuais seguros e subsistemas de saúde, totalizou 704 milhões de euros em 2017. É três vezes mais do que o que se registava no virar do milénio: no ano 2000, as famílias gastaram 232 milhões de euros em consultas, cirurgias e internamentos em hospitais particulares.
 
Sempre a subir

Não é só nos hospitais privados que as famílias estão a gastar mais. Os dados do INE revelam que as famílias contribuem com 27,7% das despesas em saúde, além do financiamento do Serviço Nacional de Saúde por via dos impostos. 
Esta fatia, aliás, é das maiores a nível europeu. Um perfil divulgado em 2017 pela Comissão Europeia sobre a Saúde em Portugal, apenas com dados até 2015, concluía que a despesa pública em saúde era 70% da média da UE, com os pagamentos diretos das famílias a destacarem-se: na altura já rondavam os 28%, quando a média na União Europeia era de 15%. A informação disponibilizada pelo INE revela que, enquanto a despesa corrente pública em saúde ainda não regressou aos valores pré-crise, embora registe um aumento  pelo terceiro ano consecutivo para os 11 576 488 000 euros em 2017 (11,6 mil milhões de euros), as despesas das famílias têm subido praticamente todos os anos, atingindo um novo máximo em 2017, de 4 806 359 000 euros (4,8 mil milhões). No ano 2000, a despesa pública em saúde foi de 7 581 487 000 euros e nesse ano os pagamentos diretos das famílias representaram 2 687 849 000 de euros.


 
Em que gastam as famílias

Apesar das despesas em hospitais privados serem a rubrica em que se verifica um dos maiores aumentos relativos, as despesas das famílias com saúde repartem-se por vários tipos de cuidados. 

Tendo em conta a análise para 2017, divulgada pelo INE, os portugueses gastaram 1 999 162 000 de euros (quase 2 mil milhões) em clínicas privadas de ambulatório e ainda 1 457 695 000 euros em consultórios médicos, incluindo de medicina dentária. Em relação a 2010, trata-se de um aumento de 3,5% e 2,2%, respetivamente. Nos hospitais privados a despesa das famílias em 2017 é 55% superior a 2010, ano em que se verificaram pagamentos na casa dos 450 milhões de euros. Nos hospitais públicos houve lugar ao pagamento de 68 milhões de euros em taxas  moderadoras. As famílias gastaram ainda 136 milhões de euros em centros de análise e diagnóstico e ainda 11 milhões de euros em cuidados domiciliários. Uma rubrica mais significativa são os encargos nas farmácias, que, contudo, têm estado a baixar, uma tendência já associada ao aumento da quota de utilização de medicamentos genéricos que em Portugal era historicamente baixa. Ainda assim, os portugueses gastaram em 1 109 241 000 de euros nas farmácias.


 
Falência do SNS

Conhecidos os resultados do INE, que prevêem um aumento da despesa pública em saúde de 2018 de 5,3% e um aumento da despesa privada em 4,6%, a Ordem dos Médicos defendeu que a trajetória comprova a falência do SNS. «Só a despesa das famílias em saúde subiu 4,4%, sobretudo pelo recurso aos hospitais privados», assinalou a Ordem, em comunicado. «O SNS está muito enfraquecido na sua resposta e é esta falência que está na base da procura de serviços privados e de seguros por parte dos cidadãos. Não nos podemos esquecer que há muitos portugueses sem capacidade económica para tal e, por isso mesmo, é inadmissível que um serviço público de saúde esteja a perder a sua função de equidade e coesão social». A mesma leitura tinha sido feita recentemente pelo PSD num debate sobre o acesso à Saúde no Parlamento. «Os únicos a quem este Governo nunca faltou foi aos serviços privados de saúde a operar no país. Nunca os privados fizeram tanto dinheiro com a saúde em Portugal, dinheiro feito à conta da falência do SNS. Quem tem dinheiro recorre ao privado», disse o deputado Ricardo Baptista Leite. Os dados mostram que a trajetória de maior recurso ao privado não é fruto apenas dos últimos anos, mas persiste.