Há cerca de três anos que a PJ procurava o paradeiro do traficante por suspeita de estar envolvido na Operação Aquiles. No entanto, o seu nome não está só associado a este caso. Franklim Pereira Lobo tem um grande historial de relações menos amigáveis com as autoridades.
Antes de entrar no mundo da droga, Lobo já tinha o registo criminal manchado: o cadastro estava pintado com vários crimes que iam desde burlas a assaltos à mão armada. Contudo, a verdadeira reviravolta na sua vida ocorreu há 20 anos, altura em que começou a ser apontado como um dos maiores traficantes da Europa.
Lobo decidiu aventurar-se e criar alguns negócios na área do imobiliário, entre outras. Mas o seu lado empresarial nunca convenceu as autoridades, que sempre questionaram de onde vinha o dinheiro que mantinha as suas empresas a funcionar. As autoridades acreditavam que o dinheiro provinha do tráfico de cocaína.
O caso foi-se adensando e as forças policiais decidiram investigá-lo. O desfecho acabou por ser o esperado: Franklim é detido e leva as autoridades a acreditar que conseguiriam desmantelar os vários cartéis que traficavam cocaína e que estavam a usar Portugal como porta de entrada para distribuir o produto pela Europa.
O entra-e-sai da prisão começa a 16 de outubro de 1999. Lobo fica hospedado num quarto de hotel com dois agentes que estavam encarregados de o vigiar. As autoridades acreditavam que ele estava a ajudá-las a encontrar os traficantes de cocaína. No entanto, Franklim acaba por conseguir enganar os agentes e, a meio da noite, sem que se saiba como, o narcotraficante salta do primeiro andar do hotel e coloca-se em fuga.
Um ano depois é condenado a 25 anos de prisão, mas só passados quatro anos é novamente detido. Foi encontrado em Espanha, onde fazia uma vida luxuosa e era dono de várias empresas imobiliárias. É extraditado para Portugal, mas ainda não seria desta que ficaria atrás das grades. A sua defesa faz um pedido de habeas corpus depois de ter conhecimento de um erro processual. O pedido é aceite e Franklim sai em liberdade, voltando a fugir.
Em 2005, Lobo volta a aparecer nos radares da polícia. É encontrado do outro lado do Atlântico, no Brasil, onde a PJ acreditava que mantinha ativa uma rede de narcotráfico.
Passados dois anos, o julgamento que decorrera em 2000 e que o sentenciara a uma pena máxima de prisão é anulado por causa de um erro processual e volta a ser repetido, mas, desta vez, a sentença é diferente: Franklim acaba por ser ilibado pelo mesmo tribunal que o condenara pelos crimes de associação criminosa e tráfico agravado. Em 2008, volta a ser absolvido pelo mesmo tribunal num processo de branqueamento de capitais.
Mas a teia não termina aqui. Em 2009, o narcotraficante é novamente detido por suspeita de tráfico de estupefacientes e associação criminosa. É sentenciado, cumpre a pena e é libertado.
Operação Aquiles
Mas o enredo não acaba aqui. Em 2016, o narcotraficante voltou a ser novamente procurado pela polícia no âmbito da Operação Aquiles. As autoridades queriam deter o suspeito, que estava a viver em Espanha, mas este voltou a antecipar-se e fugiu para Marrocos, tendo estado desaparecido até agora. Três anos depois, o maior traficante de droga português seria finalmente detido e para ser julgado num processo à parte da Operação Aquiles.
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Esta operação – que conta com 27 arguidos, entre os quais dois antigos inspetores da PJ – chegou aos tribunais em outubro do ano passado. Na primeira sessão de julgamento, António Joaquim Benvinda, informador da PJ, revelou que o ex-coordenador da PJ Dias Santos era conhecido como “o facilitador de negócios da droga”. O arguido prestou declarações via Skype por se encontrar ao abrigo do programa de proteção de testemunhas. “Dias Santos era o facilitador dos negócios, ele ajudava. A ideia que se tinha era que ele ajudava a facilitar negócios de droga”, afirmou.
Durante a sessão, António Benvinda descreveu uma das operações, que visava a entrada de um carregamento com mais de 200 quilos de cocaína em Portugal, com a ajuda de Dias Santos. Segundo a versão do arguido, João Freitas, a ponte entre Benvinda e os traficantes colombianos – e que também é arguido no caso -, contactou-o para o ajudar a trazer a droga da Colômbia para Inglaterra, pedindo-lhe para falar com o ex-coordenador da PJ de forma a facilitar a entrada da droga em Portugal. Nesse sentido, Benvinda falou com Dias Santos, por ser conhecido como “o facilitador de negócios”. Estava tudo combinado: o contentor entraria no país e depois seria entregue a João Freitas, que o levaria para Inglaterra.
António Benvinda disse ainda que o ex-coordenador da PJ estava envolvido com Ricardo Macedo – coordenador da Polícia Judiciária responsável pela investigação do tráfico marítimo – e que os dois tinham acordado receber 15% do valor do carregamento. Mas este acabou por ser alvo de uma ação policial no Montijo.
Dias Santos contactou Benvinda dizendo-lhe que a operação tinha sido cancelada porque, quando entrou em Portugal, a droga foi apreendida pela PJ, tendo sido encontrada dentro de latas. A versão, contudo, não coincidia com a dos traficantes, que diziam que a droga tinha sido colocada debaixo de paletes. Apesar das discrepâncias, a cocaína nunca apareceu.
Sem qualquer pista sobre o paradeiro da droga, Benvinda começou a ser ameaçado. Foi nesse momento que decidiu denunciar o caso às autoridades, completou em tribunal.
Em fevereiro, o inspetor-chefe da PJ, Bruno Lopes, revelou noutra sessão do julgamento que Dias Santos e Ricardo Macedo “foram apanhados a colaborar com os traficantes”.
Em causa estão crimes de tráfico, corrupção e associação criminosa. A acusação do Ministério Público sustenta que, pelo menos desde 2006, existiam suspeitas sobre a atuação de Macedo e Dias Santos e que estes estariam ligados ao mundo do tráfico de droga. Em 2013, uma informação das autoridades norte-americanas confirma as suspeitas: os dois estavam a fornecer informações às organizações criminosas, tendo-se iniciado uma investigação.
[artigo originalmente publicado no jornal i 14 de março de 2019]