A pobreza como crime contra a humanidade?

«O mal da grandeza é quando ela separa a consciência do poder». William Shakespeare S e não transformarmos as periferias será um desastre, porque os centros das cidades vão tornar-se cada vez mais pequenos museus, centros comerciais a céu aberto» – quem o diz é Renzo Piano, arquiteto e prémio Pritzker.  Na mais recente edição…

«O mal da grandeza é quando ela separa a consciência do poder».
William Shakespeare

S e não transformarmos as periferias será um desastre, porque os centros das cidades vão tornar-se cada vez mais pequenos museus, centros comerciais a céu aberto» – quem o diz é Renzo Piano, arquiteto e prémio Pritzker. 
Na mais recente edição das conferências do Estoril, Bernard Kouchner, com o peso de uma vida rica e cheia de dedicação e trabalho a várias causas – de onde se destacam a de ativista por causas difíceis que estiveram na origem da criação dos Médicos Sem Fronteiras, dos Médicos do Mundo – e na sua condição de ministro (quer da Saúde, quer dos Negócios Estrangeiros) em França, quase no mesmo sentido, propôs que a pobreza possa ser considerada um crime contra a humanidade. Até porque os pobres, são pobres. E até politicamente é muito perigoso que se cataloguem divisões entre pobres de esquerda e pobres de direita. Uns prioritários, outros nem tanto, como se percebe que a extrema-esquerda quer impor. 
É um tema que não pode deixar de ser tratado como prioritário. À escala global, continental e nacional. 
Um tema que as Nações Unidas – e bem – têm tratado como fundamental no século XXI. 
E que não pode ser qualificado como um tema ‘politicamente correto’, seja nas cimeiras e nas conferências de países recetores de ajudas ao desenvolvimento, seja também nas cimeiras e conferências dos países e organizações ‘doadores’, e não só de dinheiro.

São muitos os indicadores económicos e sociais que nos devem fazer corar de vergonha, por confirmarem que a pobreza e as desigualdades económicas e sociais, estão a aumentar em muitos países e continentes. 
Com consequências que poderão vir a aumentar ainda mais as desigualdades, se não se inverterem estas tendências. Com a agravante dos impactos negativos das alterações climáticas à escala global – com a nomadização de milhões de pessoas, com a deterioração das condições de saúde e do acesso aos direitos fundamentais, como o acesso à educação, etc..

Existem vários tipos de pobreza. Como também existem vários critérios para a definição de pobre e de pobreza. 
Um pobre na Europa é uma pessoa com os mesmos problemas que um pobre no Biafra, no Bangladesh ou na Mongólia? 
A problemática da pobreza é complexa. 
Existem, aliás, novas pobrezas. Que são as mais difíceis de debelar. Porque as pobrezas mais clássicas, infelizmente, são as de sempre – associadas à falta de habitação, educação, saúde, trabalho, etc..
As ‘novas pobrezas’ são tão ou ainda mais perigosas. Porque estão associadas àquilo que os mais antigos e sábios classificavam e chamavam de pobreza de espírito e de caráter. Onde a valorização do que é ético, do que é moral, é verdadeiro ou falso, é gelatinoso e variável, conforme os interesses em jogo. Interesses de grupo ou pessoais. Mas, apesar de um cidadão mediamente formado priorizar o combate às pobrezas clássicas, as novas pobrezas andam à solta. E devem merecer o devido acompanhamento, a par do poder negativo das novas ignorâncias. 

Mas, sobre as outras pobrezas, parece-me que faz todo o sentido que se assuma a pobreza como um crime contra a humanidade. 
É polémico? 

É. Mas a ser assim classificado ajudará e muito, em muitos países e em vários continentes, a combater as ‘pobrezas clássicas’ e também ‘as novas pobrezas’.
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