A liderança do Montepio volta a sofrer uma reviravolta. Depois de meses de impasse em torno de Dulce Mota como CEO – até aqui desempenhava funções de interina –, surge agora o nome de Pedro Gouveia Alves, até aqui presidente do Montepio Crédito e adminstrador não executivo, para liderar a instituição financeira. A informação foi avançada pelo Jornal Económico e confirmada pelo SOL.
O SOL sabe que o nome de Pedro Alves já está a ser analisado pelo Banco de Portugal e gerou consenso junto dos vários responsáveis, nomeadamente Tomás Correia, que lidera a Associação Mutualista Montepio e é dona do banco, e de Carlos Tavares, que ocupa o cargo de chairman da instituição financeira.
Cabe ao novo presidente a recuperação dos resultados do banco. O Montepio registou lucros de 3,6 milhões de euros no primeiro semestre, quatro vezes menos do que os 15,8 milhões de euros dos primeiros seis meses de 2018. A instituição financeira explicou que para esta queda do resultado líquido em 77% contribuíram fatores como «menor contribuição do Finibanco Angola (menos 5 milhões de euros) e a menor eficiência fiscal face à verificada no primeiro semestre de 2018 (mais 8,5 milhões em impostos)». Também a diminuição do produto bancário (menos 18,5 milhões de euros face a junho de 2018), conjugados com os impactos positivos resultantes da redução dos custos operacionais (memos 7,3 milhões de euros em relação ao período homólogo de 2018) contribuíram para esta redução dos resultados.
Equilibrar as relações entre trabalhadores e administração é outro desafio do futuro CEO. Tal como o SOL avançou, os resultados do inquérito levado pela Comissão de Trabalhadores da instituição financeira foram arrasadores, o que levou o conselho de administração a comprometer-se em apresentar «medidas o mais urgentemente possível para colmatar algumas deficiências apontadas».
Relação frágil
A relação entre Dulce Mota e Carlos Tavares foi-se deteriorando nos últimos meses e ganhou novos contornos com o lançamento do Banco de Empresa Montepio (BEM). Dulce Mota – como o SOL também avançou, em maio – não estaria confortável com este projeto e chegou mesmo a partilhar o seu descontentamento tanto internamente como externamente.
Lançado no início desse mês, o BEM tem como objetivo ficar com as mais importantes empresas clientes do banco, o que, no entender de Dulce Mota, estará a esvaziar a carteira de clientes do Montepio e a deixar a instituição financeira em maus lençóis. Na altura do lançamento, o projeto foi apresentado com a ideia de quer iria «ajudar a resolver problemas há muito identificados no nosso tecido empresarial, como os constrangimentos à capitalização e ao acesso a fontes de financiamento alternativas por parte das empresas». O objetivo seria «suprir falhas do mercado» e responder às necessidades de crescimento do tecido empresarial português, num universo potencial de mais de cinco mil empresas.
O BEM contará com dez espaços empresa – situados em Aveiro, Braga, Leiria, Lisboa e Grande Lisboa, Porto e Grande Porto, Faro e Viseu – e trabalha apenas com quem tenha uma faturação superior a 20 milhões de euros.
Joana Carvalho, Nuno Mota Pinto e Pedro Ventaneira assumiram as funções de administradores executivos do BEM, em agosto, depois de terem recebido luz verde por parte do Banco de Portugal. O nome de Joana Carvalho já tinha sido avançado pelo SOL, em fevereiro, e, na altura, ao que apurámos, esta escolha teria causado alguma tensão interna porque até à data não tinha sido feito qualquer convite interno.
Recorde-se que os estatutos do Banco de Empresas Montepio permite ter 12 administradores.
O SOL sabe que a ambição de Carlos Tavares é abrir o capital do BEM a investidores externos. Atualmente, o capital do banco de empresas é de 180 milhões de euros, mas poderá vir a ter de reforçar capital e a Associação Mutualista poderá não ter capacidade de injetar dinheiro. Aliás, essa hipótese de abrir capital a outros investidores chegou a ser referida por Carlos Tavares num encontro de quadros realizado em novembro, em Ílhavo.
Esta solução agora apresentada surge depois do nome de João Ermida não ter passado primeiro para CEO e depois para chairman. Esta última hipótese avançada por Carlos Tavares foi chumbada pelo Banco de Portugal por Ermida não ter experiência recente na atividade bancária e não cumprir as condições para o registo de idoneidade.
Contactados pelo SOL, tanto o Banco de Portugal como o Montepio não quiseram prestar qualquer tipo de comentários.
Tomás Correira mantém-se firme na Mutualista
Estas alterações na administração do banco surgem numa altura em que a Associação Mutualista Montepio (AMM) está a sofrer profundas alterações. A reunião do conselho geral está marcada para dia 24 de outubro e será a última antes da alteração dos estatutos e sua subsequente extinção, de forma a entrar em conformidade com o novo Código das Associações Mutualistas.
Segundo a proposta de novos estatutos, publicada em 2 de outubro, a Associação Mutualista Montepio terá quatro órgãos sociais: assembleia-geral, conselho de administração, conselho fiscal e assembleia de representantes. Desaparece o conselho geral. Em janeiro, Tomás Correia defendeu que não existia a necessidade de eleições antecipadas para os restantes órgãos, uma vez que na revisão de estatutos não há necessidade de alterar os poderes e o papel da mesa da assembleia-geral, Conselho Fiscal e Conselho de Administração, eleitos em dezembro de 2018. A revisão dos estatutos na Associação Mutualista Montepio deverá ainda alterar a duração do mandato dos órgãos sociais, provavelmente para quatro anos, face aos três anos de hoje.
O que é certo é que a idoneidade de Tomás Correia enquanto presidente da Mutualista Montepio está a ser avaliada, desde março, pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) e já levou o presidente da Mutualista a garantir esta semana que só irá sair da liderança «em boa ordem e quando entender», garantiu fonte oficial ao SOL, acrescentando que «não será seguramente no dia 24 de outubro» – reagindo desta forma às notícias que davam conta da sua possível saída no último conselho geral da AMM.
Esta assembleia-geral ocorre numa altura em que o Banco de Portugal (BdP) confirmou que vai recorrer da decisão do Tribunal da Concorrência que anulou as coimas ao Montepio e a oito antigos administradores, no valor de 4,9 milhões de euros, considerando que a sentença não se pronuncia sobre as infrações. Em causa está o facto de o regulador ter detetado falhas de gestão enquanto Tomás Correia exercia o cargo de presidente do agora denominado Banco Montepio, entre 2008 e 2015.
Além das falhas no controlo interno, o regulador aponta também o não respeito pelas normativas definidas nos regulamentos, que justificou a concessão de crédito de financiamentos de elevado montante a alguns clientes, nomeadamente a Paulo Guilherme e a José Guilherme. Este processo começou em 2014, com a auditoria forense à Caixa Económica Montepio Geral.
A entidade liderada por Carlos Costa «discorda do entendimento subjacente à decisão agora proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, que diverge, aliás, do teor de muitas outras que, ainda recentemente e sobre a mesma questão de direito, têm sido proferidas por tribunais superiores. Deste modo, o Banco de Portugal irá apresentar recurso das mesmas», declarou, na altura, em comunicado.
Entendimento diferente tem o Tribunal da Concorrência, que considerou que foi violado o direito à defesa na fase administrativa, determinando a anulação da acusação e das notificações emitidas e a devolução do processo ao BdP, para que este profira «nova decisão isenta dos vícios que decretaram a nulidade».