O Governo britânico de Boris Johnson volta à carga esta segunda-feira, após os deputados adiarem a votação do seu acordo de saída da União Europeia, este sábado. O revés obrigou Johnson a pedir relutantemente uma extensão do prazo do Brexit a Bruxelas, e agora o Governo tenta aprovar o acordo a tempo de tornar desnecessária essa extensão. Mesmo que o presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, deixe a proposta chegar ao Parlamento, esta pode sair de lá irreconhecível, graças às emendas da oposição – que pode acrescentar cláusulas como uma união aduaneira, ou que o acordo de saída tenha de ser aprovado num segundo referendo.
Esta última possibilidade parece ser a aposta do Partido Trabalhista, o maior da oposição. “Precisamos de uma emenda que diga que, qualquer que seja o acordo que é aprovado, deve ser sujeito a um referendo, onde o acordo é posto perante o público, questionando: ‘Querem sair nestes termos, ou preferem ficar na UE?’”, declarou ontem à BBC o responsável trabalhista para o Brexit, Keir Starmer – que sugeriu que, com essa emenda, o seu partido poderia aprovar o acordo de Johnson.
Nesse mesmo dia, centenas de milhares de manifestantes inundaram as ruas de Londres, exigindo um segundo referendo. Juntaram-se à mobilização pesos pesados dos trabalhistas, como o ministro sombra das Finanças, John McDonnell, a ministra sombra dos Negócios Estrangeiros, Emily Thornberry, e a ministra sombra do Interior, Diane Abbott – muito próxima do líder trabalhista.
“Sou uma remainer”, declarou Abbott, em aparente rutura com o Corbyn, que sempre defendeu um acordo de saída que preservasse direitos laborais e regulações ambientais. Enquanto Thornberry assegurava aos manifestantes que “o Partido Trabalhista é um partido do Remain”, Corbyn lançava um vídeo no Twitter em que prometia que “aqueles que votaram Leave ou Remain têm todos lugar no Partido Trabalhista”.
Entretanto, o Governo de Johnson qualificou a possível aposta dos trabalhistas num segundo referendo como “extraordinária”. “O Partido Trabalhista defendeu num manifesto – como nós fizemos – concretizar o referendo de 2016. Agora estão a tentar reverter isso e é uma clara quebra da confiança dos eleitores”, assegurou à BBC o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab. “Temos um acordo. Porque é que haveríamos de fazer um segundo referendo?”, questionou.
“Morto numa vala” Apesar de ter sido derrotado este sábado, Boris Johnson ficou muito mais próximo de uma maioria do que seria de esperar – 306 deputados do lado do Governo, 322 contra. O ministro dos Negócios Estrangeiros notou que o Governo “parece ter os números” necessários para aprovar o acordo no Parlamento – mas o mesmo já tinha sido dito antes de sábado. O resultado foi o primeiro-ministro ser forçado a pedir uma extensão do prazo limite do Brexit a Bruxelas – apesar de Johnson ter dito que preferia “estar morto numa vala” a ter de o fazer.
A relutância de Johnson ficou bem patente no modo que pediu a extensão, através de uma carta não assinada, seguida de outra carta – essa sim, assinada – em que assegurava aos líderes europeus que conceder uma extensão do Brexit seria um grave erro. “O pedido de extensão acabou de chegar. Vou agora começar a consultar os líderes europeus sobre como reagir”, tweetou o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk.
“Não podemos garantir que o Conselho Europeu vá conceder a extensão”, afirmou Michael Gove, responsável pelos planos de contingência para uma saída não negociada, ativados ontem. Fica em dúvida se se trata de um receio genuíno do Governo, ou se não passa de uma tentativa de mostrar que a escolha é entre o acordo de Johnson ou acordo nenhum.