Sabemos todos como os apoiantes da anterior solução governativa foram assumindo a autoria das medidas que conseguiram imediatos resultados positivos.
Nem por isso se viram recompensados.
Uns esvaíram-se em deputados, todos perderam votantes.
Foi mau. Perderam o pio.
Não atentaram na máxima desenvolvida por um personagem de Salman Rushdie que dizia: «Se tudo pode acontecer, é bom que nos certifiquemos de que nunca aconteça».
Claro que arrefeceram o entusiasmo do PS. Não deixaram que tomasse o freio nos dentes. A que custo, porém…
Fizeram uma curta festa pelo sucesso do obstáculo.
Ao lado, o protagonismo foi conquistado pelos animalistas reconvertidos em ambientalistas, ou pelo insólito livre, ou pela surpresa liberal, ou pela aventura do Ventura.
Foi sobre eles que os holofotes se colocaram.
Por uma vez, o Bloco bloqueou.
E tudo isto depois de uma campanha personalizada, na qual não se eximiu a passar a ridícula mensagem da Catarina Princesa dos pobres.
Mal agradecidos, concluiu-se que os pobres são republicanos como muitos catalães.
Era aqui que o poder se discutia e por isso deles me ocupo.
Do CDS restava a amarga experiência de demonstrar que existe.
Do PSD ficou a ideia do que poderia ter sido e não foi. De quem acorda tarde por gosto e se empolga ao serão.
De tudo isto ficou um PS remanescente.
Só, como António Nobre se definiu em verso.
Daqui partiu para o conforto de um Governo maior para parecerem muitos.
Mais alargado, menos familiar.
Mais Costa, menos diverso.
Com rédea curta.
É certo que, finalmente, é o partido mais votado mas a estratégia definida antes destruiu a legitimidade desse tipo de Governo por si só.
Um Governo, desde a anterior legislatura, não é propriedade do partido mais votado.
Portanto, vai depender dos acordos aqui e ali.
Como foi na realidade, e se recusa ter acontecido pelo acordo escrito que o Prof. Cavaco exigiu.
Se assim tivesse sido, teríamos assistido à vingança dos Távoras.
Mas, agora, vai ser mais evidente a habilidade da gestão dos recursos, a superação dos conflitos, a tolerância com a incapacidade de resposta dos serviços públicos.
O silêncio da denúncia passou a ser intolerável.
Todo este ambiente tornará, por outro lado, mais difíceis as dinossáuricas reformas estruturais que já ninguém atura.
Isto é, cria obstáculos reais a um entendimento à direita do PS.
Confronta-se o novo-velho Governo do PS com um requisito também anunciado por outro personagem de Rushdie: «É preciso enganar as pessoas para que elas aceitem novas ideias».
Resta saber se há, verdadeiramente, novas ideias e se as pessoas conseguem ser enganadas.
Elas querem ver melhorias significativas nas suas vidas, não apenas recuperações do perdido num momento triste.
A cada passo nos confrontamos com aqueles que se queixam amargamente de estar a viver pior do que em 1996. Ouvem-se os seus desabafos nas ruas.
Para bem do Estado, deixámos mal muitas pessoas.
E o Estado, pobre dele, não é o escudo da esquerda.
Enquanto que a pessoa é a essência do outro lado.
Talvez seja bom tentar encontrar outros objetivos, outra linguagem, outra vida.
Vivemos um acordo fingido.
Acordámos num desacordo anunciado.
A gerir o declínio.