Após duas semanas de protestos massivos no Líbano, o primeiro-ministro libanês, Saad Hariri, anunciou esta terça-feira a sua demissão. O objetivo é pôr fim ao impasse entre manifestantes e a coligação de Governo do Líbano – que inclui quase todos os partidos. A demissão do primeiro-ministro recebeu forte oposição dos xiitas do Hezbollah – considerados a principal força política do país – e há poucos indícios de que possa acalmar a situação. “O nosso problema não é Hariri pessoalmente”, explicou ao Guardian um manifestante, Ali Dirani, de 33 anos. “Hariri é descartável para o regime confessional que estamos a tentar derrubar”.
Recorde-se que após décadas de sangrenta guerra civil entre os principais grupos étnicos do país – sunitas, xiitas, cristãos maronitas e drusos –, o confessionalismo foi inscrito na Constituição libanesa. Ou seja, o poder tem de ser dividido entre confissões religiosas: o Presidente tem de ser maronita; o primeiro-ministro, sunita; e o presidente do Parlamento, xiita.
Apesar de este sistema ter evitado conflitos de maior, a falta de resposta à crescente crise económica e à corrupção sistémica no Líbano espoletou manifestações generalizadas contra o Governo – que mostram uma unidade incomum num país dividido por sectarismos. “A única coisa boa que fizeram foi unir-nos”, gritou uma mulher durante um protesto, por entre milhares de bandeiras do Líbano, segundo o Washington Post. “Somos todos libaneses e odiamos-vos”.
“O elo mais fraco” Apesar de a demissão do primeiro-ministro ser “uma grande vitória” para os manifestantes, disse à Al Jazira Rami Khouri, professor de Políticas Públicas na Universidade Americana de Beirute, Hariri também era “o elo mais fraco” da coligação de Governo. E muitos notam que já não é a primeira vez que o primeiro-ministro anuncia a sua demissão como forma de negociação: já fez o mesmo em 2017, quando entrou em conflito com o Hezbollah, acabando por voltar atrás.
Agora, a grande questão é se o Hezbollah irá ceder à pressão dos manifestantes ou não – e tudo indica que não. Ainda esta terça-feira, apoiantes do grupo xiita, vestidos de preto e armados com bastões, atacaram e incendiaram um acampamento dos manifestantes anti-Governo em Beirute, avançou a Reuters. Ainda recentemente, o líder do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah, exigiu que as estradas bloqueadas pelos manifestantes fossem reabertas e sugeriu que os protestos eram financiados por inimigos estrangeiros.