O Registo Comercial português, no âmbito das competências que lhe são atribuídas, revela-se um verdadeiro entrave ao Direito de Estabelecimento e Liberdade de Prestação Serviços no âmbito da União Europeia por via do preciosismo burocrático-administrativo desnecessário que impõe a entidades europeias não-portuguesas.
Desde a incapacidade permanente em compreender a língua inglesa, francesa ou espanhola no âmbitos de documentos apresentados pelas entidades estrangeiras que pretendem registar as suas representações em Portugal e ainda exigirem um sem número de documentos adicionais para além dos estritamente previstos no n.º 2 do artigo 40.º do Código do Registo Comercial (i.e.: documento comprovativo da deliberação social que estabelece a representação em Portugal; o texto completo e atualizado do contrato de sociedade e de documento que comprove a existência jurídica deste contrato).
Veja-se que nada é dito no n.º 2 do Artigo 40. do Código do Registo Comercial quanto à necessidade dos documentos exigidos referirem o objeto social (ou CAEs – Códigos de Atividade Económica) da empresa que pretende abrir representação em Portugal. Não obstante, e ainda que nada seja dito na Lei, as Conservatórias vêm dizer que é obrigatório a referência do objeto social/CAEs em tais documentos. Ou seja, as Conservatórias portuguesas entendem, sem fundamento legal aparente ou lógico, como cada país deve emitir os seus documentos de registo comercial (tal não deveria surpreender o estimado leitor, quando a Autoridade Tributária e Aduaneira espera, pedantemente, que as suas congéneres estrangeiras assinem e carimbem documentos por si emitidos!).
Veja-se, por exemplo, o caso de uma sociedade inglesa constituída depois de outubro de 2009. De acordo com a legislação daquele país as empresas constituídas depois dessa data não são obrigadas a registar um objeto social ou CAE, exceto indicado em contrário nos seus próprios estatutos, podendo ab initio prosseguir qualquer atividade que seja legal. Ou seja, o contrato de uma sociedade inglesa ou galesa e o documento que comprova a existência da mesma no Reino Unido não fará menção do objeto social ou CAE. Não obstante, as Conservatórias em Portugal farão um finca-pé perante a entidade estrangeira de que não constituirá representação da empresa inglesa sem documentos que mencionem o objeto social ou CAE, ainda que exista um representante legal que se responsabilize pela declaração do mesmo perante as autoridades portuguesas ou que a classificação estatística dessa empresa-mãe possa ser verificada online mediante acesso gratuito ao registo congénere.
Estes entraves burocráticos colocados ao investimento em Portugal têm que ter um fim. Não podem os organismos portugueses, no seio do seu provincianismo, exigir mais do que aquilo que se encontra previsto na Lei nem ditatorialmente impor a países terceiros, e em especial no seio da União Europeia, que adotem as práticas e as formas portuguesas no âmbito da emissão de documentos (ainda para mais quando estes estão notarizados e apostilados).
De facto, fazem falta formulários Europeus multilingues de utilização obrigatória a nível empresarial, um pouco à semelhança dos formulários multilingues de nascimento e casamento/união civil para acabar com os entraves das conservatórias. Talvez não fosse má ideia a ministra da Modernização do Estado propor algo do género no Conselho da União Europeia.
Segundo o psicólogo canadiano Laurence J. Peter: «A burocracia defende o status quo no tempo em que quo já perdeu o seu status».