“Todas as semanas me pergunta se tenho pensamentos negativos. Ainda não se deu conta de que a única coisa que tenho são pensamentos negativos?”, confronta a sua terapeuta Arthur quando não se tinha transformado em Joker no filme em que Todd Phillips leva o realismo social às histórias de superheróis. Não será preciso que venha o tempo determinar o lugar que ocupará Joker na História desse cinema. E depois de uns Globos de Ouro em que, para lá de Phoenix, o filme de Todd Phillips pouco deu nas vistas, as nomeações dos BAFTA ontem conhecidas vêm abrir a possibilidade para um cenário diferente. Joker é o filme mais nomeado para os prémios da Academia Britânica de Cinema e Televisão do próximo dia 2 de fevereiro.
Se os personagens existissem fora dos filmes, talvez os pensamentos negativos de Joker o fizessem duvidar, sobretudo depois e nos Globos de Ouro do último domingo o filme não se ter afirmado para lá de Joaquin Phoenix. Numa edição em que os grandes favoritos — O Irlandês, de Martin Scorsese, e Marriage Story, de Noah Baumbach — se transformaram em grandes derrotados, levaram a melhor 1917 e Era Uma Vez em Hollywood. Como nas nomeações, Joker acabou por passar despercebido também nas contas finais, ao não ter vencido nem na categoria de Melhor Filme – Drama nem de Melhor Realizador, para as quais estava nomeado. Os dois Globos de Ouro entregues no Beverly Hotel à produção que a DC Films estreou com um Leão de Ouro em Veneza foram para a banda sonora de Hildur Guðnadóttir (Melhor Banda Sonora – Filme) e, naturalmente, para Joaquin Phoenix (Melhor Ator em Filme – Drama).
“Normalmente é frustrante não compreendermos as motivações das personagens; com esta tornou-se libertador perceber que poderia ir em qualquer direção”, disse Phoenix a propósito da construção do personagem que o coloca talvez mais próximo do que alguma vez tenha estado de vencer o seu primeiro Óscar em fevereiro.
A verdade é que o Globo de Ouro que venceu no domingo foi apenas o segundo da sua carreira. Nessa noite Melhor Filme, na categoria Drama, foi 1917, de Sam Mendes, também Melhor Realizador. E o vencedor do prémio de Melhor Argumento – Filme foi Quentin Tarantino, por Era Uma Vez… em Hollywood. Para essa categoria não chegou sequer a ser nomeado Joker, escrito por Phillips e Scott Silver para um filme à procura da nunca antes fechada origem do mais temível dos vilões do universo DC Comics, que nos BAFTA surgem nas nomeações ontem anunciadas entre os concorrentes ao BAFTA de Melhor Argumento Adaptado, ao lado de Martin Scorsese, com O Irlandês, Anthony McCarten, com The Two Popes, ou ainda Greta Gerwig, com Little Women, que também realizou.
E se os Globos de Ouro são frequentemente apontados como um bom medidor de pulso para o que trarão um par de meses depois os Óscares, vêm neste 2020 as nomeações dos BAFTA baralhar para voltar a dar. Entre os mais nomeados continuam, em dez categorias, a mega-produção de Scorsese para a Netflix, que no domingo não venceu um único Globo de Ouro, e o filme em que Tarantino recua à Hollywood da década de 1960 para ficcionar uma real causa para o homicídio de Sharon Tate pelo grupo de Charles Manson, bem como, logo de seguida, com nove, a história passada na I Guerra Mundial de Sam Mendes.
Todos eles ultrapassados por Joker, que reúne um total de 11 nomeações, incluindo Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Fotografia, Melhor Ator Principal, Melhor Argumento Adaptado, Melhor Banda Sonora, entre várias outras categorias técnicas. Depois dos últimos Globos de Ouro, nada como esperar para ver no que dão estes BAFTA, que anualmente premeiam o melhor do cinema e a televisão internacionais e britânicas. E o que o próximo mês lhes reserva para os Óscares.