Sónia Araújo, 49 anos, está à frente daquele que talvez seja o mais antigo programa de entretenimento em televisão portuguesa em exibição nos dias de hoje: a Praça da Alegria. Um formato ao qual a equipa quer trazer conteúdos novos, e que, num ano em que os resultados do segmento da manhã deram que falar como nunca, trouxe surpresas, como o pico de audiências registado em novembro. Para lá do trabalho, falou-se da vida, da infância entre as praias de Leça e aldeia da avó materna, em Trás-os-Montes, numa conversa que decorreu ainda em dezembro, na Fábrica do Braço de Prata, em Lisboa.
Vê as audiências todos os dias? Houve um pico muito falado em novembro.
Já houve uma fase em que ia ver mais. Agora não vou ver todos os dias. Gosto de respirar. Acho mesmo que este tipo de programas precisam de tempo, e está provado que o day time precisa de tempo para as pessoas se habituarem. Isto é cíclico: já estivemos em cima, já estivemos em baixo, já estivemos no meio. Já conhecemos todas as realidades, e portanto não é uma coisa que me stresse ao ponto de estar diariamente a ver audiências como quem está diariamente a ver a sua página das redes sociais. Não o faço com essa sofreguidão, mas obviamente que muitas vezes vou sabendo, ou porque os meus colegas comentam, porque li nas redes sociais ou porque sai uma notícia. Claro que vamos estando atentos, que é um trabalho que o próprio programa faz. Estamos todos a trabalhar em rede e trabalhamos também para isso. Mentiria se dissesse que não fico feliz por não ter audiência, claro que toda a gente quer que o seu trabalho seja visto pelo maior número de pessoas. E fico muito contente que tenha acontecido. É engraçado que (o pico de audiências) tenha acontecido com um produto como o cantares ao desafio, que chama um bocadinho as pessoas às raízes e àquilo que é a nossa cultura. E mostra realmente que a Praça é tem um conteúdo diferenciador e que isso pode trazer público para o programa.
E acha que traz novo público ou traz um velho público que já estava habituado a ver e que voltou?
Queremos que aconteçam as duas coisas, obviamente. Gostamos muito que o público que já está habituado a ver a Praça da Alegria há mais de 25 anos continue connosco e tenha sempre um novo alento para ligar a televisão de manhã, mas também gostamos de ir buscar novos públicos, claro que sim.
Quando têm um pico muito bom vão ali buscar algum tipo de inspiração para os alinhamentos seguintes, ou é algo visto como um episódio esporádico?
É pensado, sim. Se há alguma coisa que achamos que correu bem claro que podemos replicar. Agora não acho que o devamos fazer até à exaustão, devemos dar ao público alternativas e outras coisas. Pelo menos é a minha visão, mas não sou eu que mando no programa, é um trabalho de equipa.
Isso leva-nos para a questão de tentar fazer algo diferenciador num programa que já é muito antigo. Esse exercício faz-se acompanhando o pulso de quem vos vê e da própria mudança dos tempos ou sente que é extremamente difícil inovar num produto com estas características?
É um desafio constante, diário. Acho que a Praça é uma equipa, e a Praça tem uma equipa pequena. Se compararmos com outros programas, nós realmente somos poucos. Agora é uma equipa pequena que já tem um know how de trabalhar em conjunto de vários anos, que também já conhece bem o público, que está muito rotinada a trabalhar neste horário e sob pressão, em condições extremas muitas vezes, e se calhar a fazer das tripas coração para ganhar em algumas coisas. Mas acho que é perfeitamente possível um programa estar enraizado mas também ter algo novo, e é esse o nosso desafio. Cada vez que temos um novo cenário, por exemplo, isso acaba por ser para todos uma lufada de ar fresco.
É como mudar a decoração da casa?
É isso mesmo.
Lembra-se de quantos cenários já foram?
É uma boa pergunta, mas já perdi a conta.
E o preferido, qual é?
É sempre o atual!
Está diariamente em direto durante três horas há muito tempo. Foi aproximando o seu eu à apresentadora de tal maneira que não há grandes diferenças entre a Sónia com a câmara ligada e desligada?
Não sou muito diferente daquilo que as pessoas veem, por isso não tenho de fazer um grande exercício de me despir de mim e montar a personagem. Se calhar por isso é que na rua, com ou sem maquilhagem, me reconhecem facilmente. Mas consigo desligar-me perfeitamente. Em casa gosto é de paz e sossego, o que com três filhos não é fácil. É uma casa muito barulhenta. Mas consigo ter o mundo em que estou a trabalhar e que tenho que ser uma coisa, mas depois consigo ser um pouco mais calma e não tão extrovertida como na televisão.
A sua família partilha dessa perceção ou os seus filhos têm aquelas coisas de lhe dizer que na televisão está sempre bem disposta e em casa anda sempre a chateada?
(risos) Chateada acho que não. Mas é curioso a minha filha ter às vezes a ideia de que na televisão tenho uma voz diferente. Deve ser a voz colocada, mas faço-o de forma inconsciente.
Ao vivo tem pouco, mas tem um bocadinho de sotaque do Porto, mais do que na televisão.
Lá está, é inconsciente: não faço nem para ter nem para deixar de ter. Se calhar a partir do momento em que se ligam as câmaras o chip muda um bocadinho a minha postura. E muda também para falar um português completamente correto, que é a nossa missão e é nossa responsabilidade. Tenho esse cuidado, e quando não acontece peço imensas desculpas. Sei que não tenho muito sotaque do Norte, ou do Porto, mas às vezes até faço para ter em coisas muito pontuais.
Foi sempre assim ou quando chegou à televisão tinha mais sotaque?
Não, sempre falei assim.
Nasceu no Porto, foi criada na zona do Palácio de Cristal.
Sim. Nasci no hospital de Santo António onde a minha mãe, que é enfermeira, sempre trabalhou.
E o seu pai?
Era profissional de ótica. Teve durante muitos anos uma ótica, agora já está reformado, já não tem a loja.
Teve uma mãe que trabalhava por turnos.
A minha mãe sempre teve uma vida muito ativa, sempre trabalhou por turnos e sempre gerimos isso em casa, eu e o meu irmão, que é mais velho – tem mais três anos e meio do que eu. A minha mãe ora fazia manhãs, tardes ou noites e portanto o meu pai também era muito presente. Quando ela não estava era ele que tratava de nós, tudo o que a mãe fazia o pai fazia. Até me penteava, fazia-me os tótós.
Se fechar os olhos e voltar à infância, qual é a melhor memória que lhe vem à cabeça?
Acho que as coisas boas que vêm logo são sempre as férias, em primeiro lugar. A praia, claro.
E qual era a vossa?
Lá no Porto íamos muito ou para Leça ou para a Foz, e também para a Madalena. Uns anos mais tarde, mal eu sabia que iria viver na Madalena.
Ainda mora lá?
Agora não, mudei-me há dois anos para Canidelo. Mas desde que me casei vivi sempre na praia da Madalena, para onde ia em miúda. Também ia ao Algarve, obviamente.
Na altura em que as viagens…
Isch! Lembro-me de dormirmos até uma vez em Évora, para fazermos a viagem em etapas (risos).
E carro atulhado, outro clássico.
Claro, mas quando íamos para a aldeia íamos mais ainda de casa às costas. Parte das férias era na praia e a outra parte era na aldeia dos meus avós maternos, que é em Trás-os-Montes. Para nós, crianças, era uma sensação de liberdade maravilhosa, porque assim que chegávamos lá os meus pais quase que nos largavam. E nós lá íamos. Conhecíamos toda a gente, não havia perigo de automóveis, os carros chegavam lá e encostavam – o que se via nas ruas, na altura, era os burros e os machos. Eu e o meu irmão íamos para os campos com os meus avós plantar batatas, ou às vindimas. Dávamos umas voltas de macho, tratávamos dos coelhos… A vida do campo era uma delícia.
Cumpria depois o que os seus avós lhe mandavam ou era uma miúda mais traquina?
Um bocadinho as duas coisas. Tínhamos a grupeta de amigos e íamos fazer piqueniques para Santa Bárbara ou para o moinho, e achávamos aquilo uma grande aventura.
E nas aulas? Nessa altura já sentia vontade de se exprimir de outra forma, que veio a ser através da dança?
Não foi propriamente na escola, mas a par da escola. Fui sempre uma aluna mediana, mas ia-me safando bem. Tirava melhores notas nas disciplinas de que gostava mais, sempre mais virada para as Letras e Línguas. Com nove, dez anos, já gostava muito de ver dança na televisão. Nunca tive ninguém na família ligado à dança.
E a alguma outra arte?
Nem isso. Veio comigo. E comecei a massacrar os meus pais para me porem numa escola de ballet. E eles acederam, mas sempre com a condição de que não baixasse de rendimento na escola. E assim fui levando até ao secundário. É curioso porque sempre acharam que eu era uma miúda muito tímida – e sim, eu não era tagarela, não falava alto, e acho que ainda hoje sou reservada. Mas não sei explicar: sempre adorei o palco. É um bocadinho um contrassenso, mas o palco era outra forma de comunicação, e a dança em particular sempre me fascinou.
Esse paradoxo acontece a muita gente tímida, de se encontrar perante a multidão.
É verdade, foi o que me aconteceu. Através da dança a pessoa comunica com o corpo, os olhos, acontece uma magia qualquer que não sei explicar. Esteja sozinha ou acompanhada, para mim o palco é fascinante.
Na televisão a experiência é diferente, não tem esse público ali, mesmo à mão. Desde o início percebeu logo que estava a falar para o país inteiro?
Para o mundo inteiro! Acho que quando se começa não se tem muito essa noção, senão fugia a sete pés. Entrava em pânico e não dizia mais nada. Quando se começa é mesmo naquela ‘estou a falar para meia dúzia de pessoas que estão aqui atrás das câmaras e para os meus colegas e pronto’. Fui tendo essa noção aos poucos.
Quem começa hoje já não sentirá isso, porque tudo o que é feito ou dito é depois escrutinado de uma maneira muito imediata nas redes sociais. Nesse sentido, é mais difícil?
Aparecer não será tão difícil – qualquer pessoa pode ter um canal no Youtube e pode começar por aí. E não vem mal ao mundo começar por comunicar dessa forma e a partir daí criar algo mais consistente. Agora, é uma grande responsabilidade. O difícil é depois manter-se, ter público e ter a consciência de que pode estar a ser veículo de coisas muito boas e muito más.
Os apresentadores que começaram na sua altura tinham uma escola completamente diferente?
Tinham, mas eu não tive propriamente escola de televisão, a minha formação nem era Jornalismo, fui um caso um bocado atípico.
Mas cresceu a ouvir comunicadores que faziam um trabalho sem rede, com telepontos inexistente ou rudimentares, e quando chegou ainda estavam no ativo.
Sem dúvida, e foram a minha referência. E foi assim que aprendi, nunca aprendi com teleponto. É verdade que hoje as pessoas que chegam têm a vida muito mais facilitada nesse sentido, sem dúvida. A minha escola, como diz, foram os profissionais com que me fui cruzando e com os quais tive a sorte de ir aprendendo. Tirei o curso de Direito e a televisão nem estava muito nos meus planos, o que eu queria era dançar. E entrei na televisão pela dança, mas fui fazendo um programa, depois outro e outro e a coisa deu-se.
Na altura a rede era interior, vinha da preparação?
Sim, e continuo a trabalhar nesse método. Tenho de confiar é no meu trabalho, não estar à espera que alguém vá fazer por mim.
Ou diga as perguntas ao ouvido.
Exatamente. Entro no estúdio às 8h00 da manhã e já tenho que ter a lição estudada de véspera, porque já recebi a documentação. A partir do momento em que a recebo, mesmo sendo à noite, a minha obrigação é preparar-me o melhor possível com o tempo que me derem, e não ir em branco para um programa de três horas em direto, sem saber quem vou ter à minha frente. Isso seria uma grande falta de respeito, nunca seria capaz de trabalhar assim.
Olhando em retrospetiva, qual foi o grande ensinamento que retirou do ballet e de toda aquela disciplina?
Isso mesmo: a disciplina. De horários, em primeiro lugar, que antes já tinha aprendido com os meus pais e que hoje passo aos meus filhos. Acho que qualquer atraso que tenhamos é uma falta de respeito para com quem está à nossa espera. Depois a disciplina connosco, de termos prioridades na nossa vida . E a disciplina de saber que se queremos algo temos que trabalhar para isso, porque as coisas não caem do céu. Portanto, se eu queria atingir um determinado nível na dança, sabia que tinha que sacrificar alguns fins de semana com amigos. E por isso tinha que me dividir muito bem, focar-me nas coisas e dedicar-me a elas.
E havia espaço para o improviso no meio da disciplina?
Claro, tem que haver! A pessoa não pode ser completamente quadrada. Se há coisa que adoro é extravasar.
E qual foi o seu grande extravaso na adolescência?
Acho que tenho mais agora do que na adolescência (risos). E felizmente o meu programa também dá às vezes para improvisar e dizer alguns disparates controlados, o que acho muito saudável. Mas tinha os meus momentos, claro. Para já também aprendíamos na escola a improvisar – e o melhor improviso é aquele que está mais ou menos ensaiado. É engraçado fazer essa pergunta, porque na Royal Academy of Dancing nós todos os anos éramos examinadas por professores ingleses, que vinham cá, para passarmos de grau.
Daqueles professores com um ar muito sisudo?
Terrífico! Ficávamos mesmo muito nervosas, lá está, a disciplina também nos deixava muito tensas. Nesse exame havia sempre uma parte em que tínhamos improviso: o pianista tocava uma música e agora dança. Quando no ballet clássico tínhamos o aquecimento na barra, tínhamos o solo preparado no centro, tudo com tempo contado e esquemas. E depois a improvisação.
E agora vê isso como uma boa metáfora para a sua vida?
Então não é! Temos de nos habituar a tudo, tantas vezes temos de improvisar e dar a volta.
E depois no meio disto tudo temos uma Sónia que vai para Direito. Como?
Tinha que ter um plano b. Que resposta tão previsível, não é? Mas é a verdade. Só que, na altura, não tinha bem consciência disso.
Mas foi um plano b pesado.
(risos) Pois, mas como sou tão casmurra decidi, mesmo quando aquilo já não era a minha vida, levar aquilo até ao fim. Sabia que a dança em Portugal era muito difícil. Não temos grande tradição nem grandes companhias, agora felizmente começamos a ter bailarinos excelentes a ganhar competições lá fora, mas tudo isso sai-lhes do bolso. Eles vão porque têm famílias que os patrocinam. A carreira de um bailarino é muito curta, a reforma é miserável. Comecei a pensar nisto tudo, sempre com os meus pais a dizer para pensar.
Percebo isso tudo, mas não respondeu ainda. Direito porquê?
Porque via aquelas séries americanas e achava que aquilo é que era. E depois fui por exclusão de partes. Ainda pensei tirar Jornalismo, mas depois achei que não era bem a minha onda – mal eu sabia que ia parar à televisão. Depois pensei em Turismo, mas o Direito pareceu-me mais interessante e entrei na Universidade Lusíada do Porto. Mais ao menos ao mesmo tempo em que entrei para a faculdade, vim a Lisboa fazer um casting para bailarinos. E a partir daí comecei a tirar o curso ao mesmo tempo que estava a trabalhar.
E como aparecem os espetáculos de magia? Foi assistente do Luís de Matos.
Foi antes. Uma colega minha do ballet já era assistente do Luís de Matos. Ele precisava de mais assistentes e queria alguém que tivesse alguma postura de palco e com algumas noções de movimentação. Fui fazer o casting com ele e fiquei, acabei por trabalhar alguns anos com o Luís. E foi pela porta da magia que fiz o primeiro programa de televisão, antes só tinha feito uns comerciais.
Qual era o programa?
Isto é Magia, em 92/93.
Ainda fez o estágio em Direito?
E fiz o exame de admissão à ordem. Estagiei num escritório de advogados no Porto e depois tive que entregar a cédula profissional, porque não era compatível. Lembro-me perfeitamente de uma vez em que já estava a fazer televisão e chegaram a reconhecer-me no tribunal. Já não estava a achar graça nenhuma àquilo porque queria manter uma postura muito séria.
E depois veio logo a Praça?
Depois do Luís de Matos fui fazer o 1,2,3, ainda a estudar. E foi um tempo difícil e maravilhoso: por um lado estava a na faculdade e quase sem assistir às aulas, porque estava a viver aqui em Lisboa de segunda a sexta. Isto no terceiro, quarto ano. Ia ao Porto aos fins de semana, os meus colegas davam-me as aulas e de cada vez que tinha que ir fazer exames dispensavam-me do programa. Quando fiz o casting viram no meu CV que estava a estudar Direito e foram fantásticos. Quem teve essa conversa comigo foi o Carlos Cruz. E foi assim que consegui conciliar o programa, que durou duas ou três séries de 13 episódios.
Como foi morar em Lisboa nessa altura? Foi a primeira vez que saiu de casa dos pais.
Pois foi. Com 21 anos, 22, foi uma descoberta. Quando vim fui morar seis meses para Sesimbra. Atravessava diariamente a ponte 25 de Abril, mas ia sempre ao contrário do trânsito. O nosso trabalho como bailarinos, nessa altura, era super profissional. Funcionávamos como uma companhia de dança: tínhamos aulas todos os dias, de manhã, e à tarde aprendíamos a coreografia da semana. Era um tempo em que havia também condições para o fazer.
Isso hoje já não existe?
Não, não há esse tempo, nem há condições para se fazerem altas produções com altos bailarinos, alto guarda-roupa, alto cenário. Na altura havia e foram momentos fantásticos. Estava a viver um sonho: estava a dançar, a descobrir um mundo completamente novo em televisão, a ganhar o meu dinheiro e a minha independência e a descobrir uma cidade no auge da minha juventude.
Foi o crime perfeito.
(risos) Os meus pais deitaram as mãos à cabeça quando vim para Lisboa. Mas provei que conseguia, fui super atinada, mas também conheci tudo o que havia para conhecer nessa altura. Corri as capelinhas todas, também com um grupo de bailarinos… Divertíamo-nos muito, mas trabalhávamos também muito. Depois dessa calmaria toda de viver seis meses em Sesimbra fui viver para o Bairro Alto, o oposto completo. Era muito engraçado porque o Bairro Alto durante a semana era uma coisa e ao fim de semana era outra completamente diferente, em que as pessoas se conheciam todas. E depois ainda fui uma temporada morar para Belém.
E voltou à base do Norte quando foi para a Praça.
Exato, voltei para o Porto.
Qual é o lado mais feio de trabalhar em televisão, o mais difícil de lidar?
É aquela fase em que somos muito tenrinhos e em que ainda não sabemos lidar bem ou com a imprensa que fala mal de nós, ou porque são injustos ou porque querem explorar demasiado a nossa vida privada, que sempre preservei muito.
Conseguiu sempre por esse travão?
Às vezes, mas às vezes também me chateava. Depois acabei por achar que não valia a pena perder muitas energias com isso, mas quando ainda não se tem jogo de cintura é difícil, porque mais do que nós até são os nossos familiares que acabam por sofrer, com as parangonas de jornais ou revistas que muitas vezes não são verdade. Essa exploração, de tentarem fazer parecer o que não é, não me agrada nada. De resto, com a exposição com o público só tenho boas experiências. Sou muito acarinhada e tento retribuir ao máximo, não ando escondida, não deixo de fazer a minha vida por o meu trabalho ser público.
Qual é a relação que se cria a trabalhar com alguém de forma tão direta há tantos anos, neste caso o Jorge Gabriel?
Facilita em muitas coisas. Há aqueles códigos de comunicação que temos porque já nos conhecemos muito bem, e às vezes vamos falar e dizemos a mesma palavra – aquilo que acontece às vezes aos casais que já estão juntos há muitos anos, em que já pensam a mesma coisa ao mesmo tempo (risos). Temos personalidades diferentes, o que é bom, registos diferentes, e portanto acho que esta parelha funciona.
Os casais quando estão juntos há muito tempo, por vezes, também ficam irritados com pequeninas coisas do outro. Nunca tiveram essas mini picardias?
Acho que não, não tenho nada assim a apontar.
É inevitável as pessoas tornarem-se amigas quando trabalham com esta proximidade? Aconteceu convosco?
Sim, claro. Sei que posso contar com o Jorge e ele sabe que pode contar comigo. Acima de tudo gostamos muito do que fazemos. Sei que ele gosta muito deste programa, e é tão empenhado como eu para fazer o melhor produto possível.
Sente a responsabilidade e o peso de trabalhar para a estação pública ou sente que se trabalhasse para um privado não haveria diferenças?
Acho que há sempre uma responsabilidade maior quando se está num organismo público, porque estamos sempre a ser escrutinados por tudo e mais alguma coisa. Mas quem toma as opções da estação ou do canal não são as caras que estão à frente. Nós somos apenas a face visível de um programa, de algo muito maior que está por detrás. Em termos diários, claro que estamos sempre a querer mais condições para trabalhar, a querer a melhor equipa técnica possível porque isso também nos dá mais possibilidades criativas.
Ao longo deste tempo na televisão foi tendo outros desafios, como o Cosido à Mão ou as Danças pelo Mundo. Há outras áreas para lá da moda e da dança que gostava de explorar?
Gosto sempre que me desafiem para coisas novas. Por exemplo, o Cosido à Mão foi completamente novo para mim, nunca tinha tido uma experiência direta na área da moda, e adorei. Correu muito bem, tanto que se fez logo a seguir uma segunda série. Para já ainda não estão criadas as condições para uma terceira, mas isso também teríamos que perguntar ao senhor diretor (risos). E adorei o Danças no Mundo, onde tinha o casamento perfeito entre dança e viagens. Portanto os desafios até podiam ser de novo nestas áreas. Gosto muito da Praça da Alegria mas gosto muito de vez em quando de sair e de fazer outras coisas diferentes, nunca deixando a Praça.
E gosta de sair do estúdio?
Gosto de fazer exteriores, mas não gosto só de fazer exteriores porque sai-nos da pele. É um trabalho muito mais exigente, porque quando não estamos no ar estamos a ser solicitados pelo público que nos rodeia, é non stop. Estamos ali 8 horas de programa a ser solicitados, mas também tem coisas boas.
Sente que esses programas de exterior são importantes para as populações dos locais que os acolhem?
São importantíssimos.
Acha que um canal como a RTP tem uma responsabilidade acrescida em termos de divulgação e aproximação para esses locais?
Ui, então não tem? A Praça da Alegria então tem imenso essa função, sem dúvida. A Praça sempre foi um cartaz privilegiado para isso, e agora puxando um bocadinho a sardinha para o facto de estarmos a norte do país, de ser um veículo para que essas pessoas tenham visibilidade de uma forma mais acessível, porque estamos mais próximos. Mas claro que a Praça é para todo o país.
Por falar em Norte: uma vez usou um cachecol do FCP em direto e foi muito criticada.
Foi uma coisa… Ai meu Deus!
As pessoas perdem um bocadinho a noção dos limites da crítica?
Para mim não faz sentido este tipo de reações tão extremadas. Não foi essa a minha intenção na altura, nem nunca será. Assim como pus aquele cachecol poderia ter posto o de Portugal. É público que sou do FCP, não quis estar a esconder, mas não quis ofender ninguém nem estar a acicatar claques ou clubites.
Faria outra vez?
Se calhar agora depois da celeuma que deu já pensava duas vezes, mas qual é a diferença entre eu dizer que sou do
Porto ou estar com um cachecol? Temos que falar dos limites do entretenimento, outro tema tão em voga especialmente a partir do momento em que passámos a ver programas do segmento da manhã com conteúdos que não existiam, e até com a presença de políticos ou a célebre chamada do Presidente da República. Acha que há limites? Quais são?
Já convidámos o Presidente para vir ao nosso programa, e ele já aceitou o convite, agora só falta marcar na agenda (risos).
E os limites?
Apesar de estarmos a par da atualidade e de termos alguns comentadores que fazem esse trabalho, como seja o professor Pinto da Costa, como seja o dom Januário Torgal Ferreira, que comentam a atualidade – e que pode ser qualquer coisa, desde crime a uma notícia excelente sobre um aluno brilhante – acho que não se explora em demasia a desgraça e o crime na Praça da Alegria, o que é algo que, na minha opinião, se explora em demasia em programas de entretenimento. E nós, felizmente, não temos isso.
Para si é uma medalha de honra?
Não sei se é uma medalha, mas se tivesse que o fazer ia-me custar bastante.
Mas faria?
Pois, depende da forma. Tudo depende da forma como o conteúdo é dado e embrulhado, e o tempo que isso representa para o resto do programa. Mas acho que às vezes se extravasam um bocado esses limites do drama.
Fez recentemente 49 anos. É mais difícil para uma mulher envelhecer na televisão do que para um homem?
(risos) Pois… É um bocadinho, é, porque estás em constante confronto com a tua imagem e tens essa pressão. Se estivéssemos noutros países em que valorizam muito mais os apresentadores com mais experiência era mais fácil: aqui não, temos muito a pressão da imagem e da jovialidade.
Porque acha que isso acontece e o que se pode fazer para isso começar a mudar?
Se calhar a nossa atitude, de uma forma generalizada, tem de mudar. Por outro lado a população também está a envelhecer, e os 50 de hoje são os 40 de ontem, e os 40 os 30 de há uns anos. Não vamos deixar de trabalhar porque temos umas ruguinhas, até porque passamos a ter outras coisas muito melhores, que refinam. Passamos a ser mais ponderados, a fazer escolhas melhores. E se há coisas que são melhores, passamos a ser também melhores profissionais – e se houver cada vez mais gente a passar esta mensagem, temos mais oportunidades. E se calhar os outros começam também a mudar a sua mentalidade.
Onde se vê no final da nova década?
Não faço esses planos. Gostava muito de poder continuar na área da comunicação, agora se estarei à frente de um programa ou não, não faço ideia.