Foi presidente da Câmara de Portalegre, deputado, vice-presidente da Assembleia, secretário de Estado do Deporto e secretário de Estado da Defesa. Nos últimos anos continuava a exercer a atividade política como deputado, cargo para o qual foi consecutivamente eleito desde 1975. Júlio Francisco Miranda Calha morreu no sábado passado, 28 de março, na sequência de um AVC.
A notícia da sua morte foi avançada pelo ex-presidente da Câmara de Lisboa João Soares. «Morreu hoje Júlio Francisco Miranda Calha. Vítima há dias de um AVC, Miranda Calha era um veterano quadro do Partido Socialista. Desempenhou, por várias vezes, cargos nos Governos PS. Nas áreas da Defesa, e também do Desporto», escreveu João Soares no Facebook.
«Era, até ao final da anterior legislatura, o único parlamentar eleito sempre desde a Constituinte. Pelo PS claro, de que era um indefetível. A sua família, e amigos mais chegados (entre os quais me conto) deixo o testemunho do meu pesar, e sentidos pêsames», acrescentava.
Nascido a 17 de novembro de 1947, Júlio Francisco Miranda Calha licenciou-se em Filologia Germânica e tinha ainda o curso superior de Ciências Pedagógicas. Militante do Partido Socialista, foi responsável pela fundação do núcleo do PS no seu distrito natal depois do 25 de abril. Entrevistado pelo SOL em abril de 2018, respondeu não ter grandes arrependimentos na longa carreira: «Geralmente, senti-me bastante confortável com o trabalho que fui fazendo».
Entre os vários cargos exercidos, destacam-se o de presidente da Câmara Municipal de Portalegre, presidente da Assembleia Municipal de Portalegre e governador civil de Portalegre.
Exerceu funções de deputado na Assembleia da República, tendo sido eleito pela primeira vez nas eleições para a Assembleia Constituinte (25 de abril de 1975). Desde então foi sucessivamente reeleito em todas as eleições seguintes, até 2015. Deixou a atividade política no final da XIII legislatura (2015-2019).
Na legislatura anterior (2011-2015) foi vice-presidente da Assembleia da República, quando a presidente era Assunção Esteves.
Ao longo de uma carreira política que durou mais de 40 anos, Miranda Calha foi ainda secretário de Estado da Administração Regional e Local, secretário de Estado do Desporto e secretário de Estado da Defesa Nacional. Publicou os livros Dois Anos de Governo, Dois Anos de Desporto e Um Rumo para o Desporto.
Na área da Defesa, fez parte da Assembleia Parlamentar da União da Europa Ocidental, tendo sido presidente da Assembleia Parlamentar da NATO e da Comissão de Segurança e Defesa da Assembleia Parlamentar da NATO.
Curiosamente, não gostava de se afirmar inequivocamente de esquerda. Acerca da sua bússola política, em 2018 respondeu assim à pergunta se era de esquerda: «Não digo nem que sim nem que não. Sou de centro-esquerda, que é aquilo que é normal [risos]. O PS é um partido popular, não é um partido populista. Agrega os diversos setores da sociedade. Foi assim que se afirmou e é essa a sua cultura».
No plano político, Miranda Calha esteve sempre próximo de Mário Soares. Na sua óptica, a maior herança que ex-Presidente da República deixou foi «a ideia de Europa, de liberdade, de democracia, de pluralismo». Também apoiou as candidaturas de Jaime Gama à liderança deste partido, assim como as lideranças de José Sócrates e de António Costa.
A morte de Miranda suscitou reações de diversos quadrantes. O primeiro-ministro enviou uma nota à Lusa onde dizia: «O PS rende homenagem à memória de Júlio Miranda Calha, que dedicou toda a sua vida à construção e consolidação do Estado Democrático, como parlamentar, governante, dirigente e militante».
António Costa relembrou o impressionante currículo de Miranda Calha, destacando o seu percurso único como deputado desde a Assembleia Constituinte. E apresentou as condolências, falando em nome «dos seus camaradas».
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota publicada no portal da Presidência confessou que «foi com muita tristeza que recebi a notícia da morte súbita de Júlio Miranda Calha, com quem partilhei no longínquo ano de 1975 a responsabilidade de deputado à Assembleia que elaborou a Constituição Portuguesa».
Também Marcelo recordou o percurso do deputado: «Licenciado em letras e professor no início da sua carreira, especialista em matéria da Defesa, chegou até a ser o mais antigo deputado do Parlamento, para o qual foi eleito sucessivamente desde a Constituinte, suspendendo apenas o mandato para exercer funções governativas. Atlantista convicto, animou a Comissão Portuguesa do Atlântico e foi Presidente da Assembleia Parlamentar da NATO».