Amaioria dos projetos hoteleiros com abertura prevista para este ano estão cancelados. A garantia foi dada ao SOL pelo presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP). Em causa estava a abertura de 51 novas unidades, num total de cinco mil quartos. «Muitos dos hotéis que previsivelmente iriam abrir este ano adiaram a sua abertura e só irão abrir quando esta situação estiver resolvida, o que é natural, dado que temos praticamente todos os hotéis encerrados em todo o país», afirma Raul Martins.
O responsável traça um cenário negro para o setor. A pandemia provocada pela covid-19 teve como consequência imediata o ‘fim’ do turismo e, segundo as estimativas do presidente da associação, os hotéis vão estar fechados até junho. «O impacto é enorme. Neste momento, os hotéis reduziram custos e têm apoio para poder pagar ordenados. Todos os dias temos vindo a ajustar-nos a uma nova realidade», diz ao SOL.
Ainda assim, a partir daí, o cenário não é animador. Mesmo depois da reabertura dos hotéis, a partir de junho, Raul Martins estima que a ocupação média seja muito baixa, podendo ser, no entanto, melhor nos resorts. «Em 2020, prevemos uma redução de 40% face a 2019, pelo que os resultados serão negativos», acrescenta.
E as perspetivas não são as melhores: «Os preços até à retoma de março de 2021 serão mais baixos do que habitualmente para a mesma época, porque a relação entre a procura e a oferta estará desajustada». No entanto, lembra que «a partir do momento em que haja segurança sanitária, poderemos assistir a um aumento de preços».
Mas para Raul Martins não há dúvidas. O foco do setor é preparar a reabertura das unidades hoteleiras, mesmo que esta seja «lenta e difícil», já que este mercado está também dependente da retoma da aviação. «Quando reabrirmos, tem de haver uma aposta forte no mercado interno e no mercado interno alargado (Portugal e Espanha). Captar e reativar a procura interna é fundamental, porque os outros também estarão a recuperar, quer os destinos concorrentes, quer os nossos principais mercados emissores», afirma ao SOL.
Perdas até 1,4 mil milhões
As perdas das receitas turísticas em Portugal deverão atingir entre 1,28 e 1,44 mil milhões de euros entre 1 de março e 30 de junho, segundo um inquérito da Associação da Hotelaria de Portugal. Estas estimativas resultam de um questionário feito entre os dias 1 e 7 de abril junto de 60% dos associados da AHP, para avaliar o impacto da pandemia de covid-19 no setor.
Este valor representa uma deterioração face à anterior estimativa, que apontava para uma perda de 500 a 800 milhões de euros de receitas turísticas.
Num cenário «menos pessimista», e tendo em consideração os valores de receitas turísticas e hoteleiras registados em 2019, a associação antevê perdas de 80% de 1 de março até final de junho (contra os anteriores 30%), num valor na ordem dos 1,28 mil milhões de euros, e uma queda de 80% de dormidas (contra 30% no anterior inquérito), com 11,8 milhões de noites perdidas.
Já num cenário «pessimista», as perdas chegam aos 90% nas receitas e nas dormidas, o que se traduz numa diminuição de 1,44 mil milhões de euros e de 13,1 milhões de noites no mesmo período.
A grande maioria dos hotéis optaram por fechar portas, pelo menos durante abril e maio. E, segundo o mesmo inquérito, cerca de 94% das unidades hoteleiras pretendem implementar o regime de layoff – encerramento total ou parcial da sua atividade económica –, em que a maioria pretende colocar entre 80% e 100% dos trabalhadores em casa, numa média de 85%.
Face a este cenário, a AHP estima que serão colocados neste regime cerca de 51 mil trabalhadores, num total de 60 mil que existem em todo o setor.
Mais de 75% das unidades hoteleiras já recorreram ou pretendem recorrer às linhas de apoio de financiamento ao turismo, nomeadamente à linha de crédito para as empresas do setor, dotada de 900 milhões de euros.
Fim do alojamento local?
Raul Martins admite que «vivemos momentos complicados» e, como tal, acredita que «é possível que muitos dos imóveis utilizados atualmente para alojamento local passem para o mercado do arrendamento tradicional, que até aqui tem tido pouca oferta».
A tendência já tinha sido admitida pelos responsáveis do setor ao i. O presidente da APEMIP lembra que o turismo levará algum tempo a recuperar desta pandemia e, como tal, «a quebra na procura turística irá sentir-se decerto neste negócio e é possível que alguns proprietários optem por recolocar estes imóveis no arrendamento habitacional, para continuarem a obter um rendimento fixo que permita cobrir o investimento feito».
A opinião é partilhada pela CBRE. «É possível que os proprietários de imóveis destinados ao arrendamento de curta duração façam a conversão para produto de arrendamento de longa duração, para mitigar as perdas causadas pelo surto da covid-19 e consequente quebra imediata do turismo», revelou Francisco Horta e Costa, managing director da consultora.
Impacto no PIB
Uma redução de 25% na atividade turística, quer do turismo de visitantes não residentes quer do turismo interno, devido à covid-19, levará à redução de 2,9% do PIB anual em Portugal. As contas são do Instituto Nacional de Estatística (INE), que divulgou esta quarta-feira o sistema de matrizes simétricas de input-output para a economia portuguesa referentes a 2017, que permite analisar as interações entre as diversas atividades económicas internas e destas com o exterior, em termos de transações de bens e serviços.
De acordo com o organismo, a pandemia de covid-19 «terá impactos significativos e transversais na economia portuguesa». E acrescenta que «o turismo que, de acordo com a conta satélite do turismo, corresponderá a 11,3% do PIB [produto interno bruto] em 2018, será um dos setores mais afetados pela atual crise, sendo expetável uma contração significativa da sua atividade».
O INE diz ainda que, de acordo com as hipóteses de funcionamento e os resultados deste sistema de matrizes, cada euro de variação de despesa nas quatro grandes componentes da procura agregada determina variações no mesmo sentido das importações e do PIB.