Opinião. Luta contra o “Inimigo Invisível”: o Milagre da democracia israelita

Fala-se muito do milagre português – e, descontando o tom folclórico e exagerado que tal expressão encerra, com razão. Melhor dizendo: é justo falarmos num milagre do povo português. Porque foi, afinal de contas, o povo português que se impôs ao Governo na exigência de medidas para debelar a guerra contra o inimigo invisível (de…

Fala-se muito do milagre português – e, descontando o tom folclórico e exagerado que tal expressão encerra, com razão. Melhor dizendo: é justo falarmos num milagre do povo português. Porque foi, afinal de contas, o povo português que se impôs ao Governo na exigência de medidas para debelar a guerra contra o inimigo invisível (de origem bem visível), e não o inverso.

No entanto, há um outro milagre que tem sido ignorado pelos media portugueses (e não só, infelizmente): o milagre de Israel.

A omissão à referência ao milagre israelita só pode ser explicada por uma razão de habituação: os jornalistas e políticos europeus já se habituaram a ver em Israel a personificação (ou melhor: a estadualização) de um milagre permanente e não sujeito a exceções, que já tendem a relativizá-lo.

 Israel é um excecional milagre – e não um milagre excecional.  

Aplicando, pois, as regras do jornalismo, o milagre israelita no combate ao coronavírus não teria qualquer novidade, não sendo suscetível de notícia: seria a velha lógica de que só deve merecer destaque noticioso o que é bizarro ou foge da norma – o “homem que mordeu o cão” – e não o que é corriqueiro, normal, habitual (não deve ser notícia o “cão que morde o homem”).

Fazendo o justo paralelismo: Israel ser um milagre é a situação corriqueira, habitual, normal – o equivalente, para a teoria e prática noticiosa, do “cão que morde o homem”; donde, há uma justificação compreensível para os jornalistas não se esforçarem em enaltecer tal milagre.

No entanto, a presente prosa surge precisamente da constatação de uma conversa em alguém nos dizia que Israel se encontrava numa situação de verdadeira calamidade pública na sequência do Covid-19 (ou, recorrendo à terminologia mais “técnica”, ao vírus do Partido Comunista Chinês); que Israel seria hoje o verdadeiro pandemónio à face da Terra.

Pior que Israel não haveria à face do nosso planeta; Israel seria uma situação tão trágica quanto a própria China ou a “Itália do Médio Oriente”, como inicialmente alguns grupos ligados ao BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções contra Israel tentaram vender – isto antes de apelarem a Israel para que acelerasse a descoberta da vacina, anunciando aos seus “sócios” que poderiam tomar a vacina israelita sem qualquer problema…a narrativa mentirosa do “apartheid” cede quando os factos são demasiado pungentes para comportarem fantasias…) tentaram veicular.

Encetámos esforços para, na sequência desta conversa, perceber a razão de ser de tal distorção da realidade: rapidamente, percebemos a sua génese. É que, em vislumbre rápido, apurámos que os títulos de notícias portugueses sobre a reacção de Israel a esta pandemia que ora travamos se resumem às seguintes: “ Israel luta vírus com técnicas anti-terrorismo”; “Israel vive dias de agitação com ameaça do vírus e incerteza política”; “Coronavírus ressuscita Netanyahu”, falando-se depois em Governo musculado.

Ora, não comentamos o acerto ou o desacerto de tais títulos: admitimos que alguns deles sejam legítimos. O problema é que, posteriormente, os jornalistas não fazem o devido “follow-up” das medidas adotadas pelo Governo israelita: resultou ou não resultou? O vírus foi ou não foi contido?

É que, relativamente a todos os outros países, fala-se dos resultados concretos e das metas atingidas; quanto a Israel, parece que se fica pelo anúncio geral das medidas, em tom de suspeita ou dúvida existencial. Não é, pois, de estranhar que haja quem ache que Israel é, neste momento, um “Estado Policial”, um pandemónio, em que cada cidadão é fiscalizado detalhadamente, quase perseguido por uma app governamental, e a confusão e o caos e o inferno vivem à solta nas ruas!

Nada de mais errado; nada mais falso.

A realidade é exatamente a inversa: Israel é um dos melhores exemplos no combate à pandemia – integrando a “Liga dos Campeões” dos países que mais eficazmente (e com mais sucesso!) reagiram à guerra do inimigo visível (cuja origem, como sabemos, é bem visível).

Senão, vamos aos factos.

Primeiro: os números, por muito que sejam martelados, não metem.

Ora, Israel registou – até ao momento em que escrevemos – 15 443 pessoas infetadas, 6731 pessoas recuperadas e 201 mortes.

Para as leitoras e os leitores terem uma ideia mais precisa, Israel tem uma população equivalente à população portuguesa: Portugal tem, até ao momento, 903 mortes registadas. Aplicando a mesma bitola jornalística e política, se reconhecemos que Portugal é um milagre, Israel é, por decorrência lógica, um milagre de proporções bíblicas.

Segundo: Israel conseguiu este milagre bíblico aglutinando eficiência das medidas de combate ao vírus – com prudência (e inteligência) na sua compatibilização com os direitos fundamentais dos cidadãos.

O Governo de Israel recorreu aos mecanismos tecnológicos mais avançados para proteger os seus cidadãos, permitindo que o sistema de saúde e de proteção em geral pudessem reagir com maior celeridade e com sucesso. O enquadramento legislativo invocado foi a lei de combate ao terrorismo no âmbito doméstico; soubemos, entretanto, que o Supremo Tribunal de Israel julgou inconstitucional o recurso à inteligência artificial para rastrear os contatos estabelecidos pelos infectados com o vírus.

No entanto, duas notas se impõem, em jeito de recomendação ou de advertência quanto a conclusões precipitadas: primeiro, o Supremo Tribunal de Israel não formulou um juízo definitivo de contrariedade da medida em causa com o direito à privacidade dos cidadãos – antes, exigiu que o Knesset aprove o devido enquadramento legal da deteção e armazenamento dos dados.

O objeto de censura do Tribunal, na verdade, foi a utilização pelo Governo de uma lei não prevista para situações de saúde pública, temendo o efeito de precedente para situações futuras (leia-se: o alargamento excessivo do conceito de terrorismo para cobrir restrições aos direitos fundamentais).

 Por outro lado, há dois propósitos políticos claros do Tribunal.

Primeiro, o Supremo Tribunal visa, com esta decisão, garantir a natureza parlamentarista do sistema de governo israelita, impedindo que haja uma primazia do Governo sobre o Knesset (o que, face à liderança carismática e com uma longevidade só equiparável a Ben-Gurion do Primeiro-Ministro Netanyahu, poderia redundar numa primo-ministerialização do sistema de governo, na lógica da maioria dos juízes do Tribunal de Jerusalém/Givat Ram, presidido por Esther Hayut (já agora: em Israel, o mais alto Tribunal é presidido por uma mulher, o que nunca sucedeu em Portugal, nem no Supremo Tribunal de Justiça, nem no Tribunal Constitucional).

Segundo, o Supremo Tribunal de Israel pretende dar um sinal claro de afirmação dos seus poderes jurídico-constitucionais face a qualquer outro poder, incluindo à Administração.

Isto no contexto em que, no quadro político-partidário, Benjamin Netanyahu (líder do Likud) e Benny Gantz (o cabeça de lista da coligação de três partidos, Azul e Branco) firmaram um acordo que garantirá estabilidade política e evitará uma (indesejada) quarta ronda de eleições parlamentares.

O Supremo Tribunal está, pois, a sinalizar que o acordo político-governamental, com manutenção do Primeiro-Ministro, não significará uma diminuição dos poderes de intervenção do poder judiciário.

Assim funciona uma democracia em que o princípio da separação de poderes opera verdadeiramente; é que o princípio da separação de poderes não é uma construção meramente teorética – para além de um núcleo essencial que reputamos como imprescindível, a sua concretização é contingente no tempo e no espaço, dependendo de circunstâncias pré e supra jurídicas (por exemplo, a dialética política).

Pergunta-se: será que podemos evocar a decisão do Supremo Tribunal de Israel como argumento para bloquear a introdução de um “app” de identificação de “clusters” de infetados em Portugal? Este é um exercício prático de Direito Comparado interessantíssimo; a resposta, na nossa opinião, é negativa.

Isto por duas razões fundamentais: primeiro, Israel, como já vimos, é um sistema parlamentar, ao contrário do português em que os poderes constitucionais do Governo são claramente superiores; segundo, Israel não dispõe de uma Constituição escrita, o que é ainda herança do mandato britânico (dispõe de um conjunto de “leis básicas”, com estilo fragmentado, o que tem potenciado, por si só, um crescente ativismo judiciário).

Já a Constituição Portuguesa é uma Constituição escrita e tão prolixa que pode ser, ao mesmo tempo, limite e fundamento de restrições fundamentais: basta o Governo invocar o interesse público na restrição.

 Mais: no sistema jurídico-constitucional pátrio, basta ao Governo pedir autorização ao Parlamento para ele próprio legislar sobre esta matéria….E, vigorando o Estado de Emergência, até se poderia equacionar a hipótese de o Governo regular a matéria, executando o Decreto do Presidente da República…Portanto, recorrendo aos ensinamentos do Direito Comparado, não se pode transpor, sem mais, o raciocínio do Supremo Tribunal de Israel para o ordenamento jurídico português.

Feita esta digressão, voltemos ao essencial – ao verdadeiro milagre israelita no combate à pandemia.

Menos infetados, menos mortes que a generalidade das democracias – sem abdicar da democracia. E sem faltarem máscaras ou outro equipamento médico.

Com limitação restrita e seletiva de direitos fundamentais.

 Sem formular restrições universais e rígidas de circulação interna e de turismo.

E tudo isto, ao mesmo tempo que os atentados terroristas não cessam e os Ayatollahs endureceram a retórica de ódio contra Israel para desviar as atenções da sua incompetência assassina.

Dir-se-á que Israel se situa em zona do globo não particularmente fustigada pelo vírus.

Ora, esta objeção não procede: primeiro, Israel é um país que recebe muitos turistas e numerosas viagens de trabalho, fruto das crescentes relações diplomáticas e económicas; segundo, compare-se com o está sucedendo no Irão.

O povo iraniano está sendo alvo de uma matança coletiva por parte do regime dos Ayatollahs, com a conivência (no mínimo, silente) dos média internacionais, dos ativistas dos direitos humanos, da ONU e de todas essas instituições do multilateralismo indecente que (ainda?) domina…

Ouviu alguém falar do Irão dos Ayatollahs nas últimas semanas? Quem sofre é sempre o mesmo – o mexilhão, neste caso, o fantástico povo iraniano…

Enfim, terminemos com o lado brilhante da vida em tempos de escuridão: olhemos para o verdadeiro milagre que é, uma vez mais, Israel. 

Que Jerusalém – e a Terra Santa, mais largamente – seja a luz do mundo neste momento histórico delicado.

Fraternidade entre Portugal e Israel: uma coligação miraculosa

 Em tempos de particular dificuldade, os laços de fraternidade revelam-se com mais clareza e intensidade.

Portugal e Israel são hoje países, mais do que amigos, irmãos – como referiu o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa em conversa telefónica com o Presidente de Israel, Reuven Rivlin (na qual este expressou a sua solidariedade amiga e fraterna ao povo português na luta contra a pandemia).

Já o Embaixador de Israel em Portugal – Embaixador Raphael Gamzou –, juntamente com a Câmara de Comércio Portugal-Israel, contribuiu para os esforços da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Marvão na luta contra este inimigo invisível, bem como para a ação socialmente solidária das “Irmãzinhas dos Pobres” (associação fundada em em 1839 para acolher pessoas idosas pobres, sem qualquer discriminação).

Há poucos dias, o Embaixador Raphael Gamzou teve, ainda, a iniciativa de escrever uma missiva de saudação à Comunidade Islâmica de Portugal, expressando o desejo de que, no próximo ano, o Ramadão possa ser celebrado sem distanciamento social ou outros limitações à liberdade religiosa. Saudação, essa, à qual o autor destas linhas se junta – e que já é, em si mesmo, outro milagre habitual de tolerância.