Sem surpresas, o estado de calamidade em Portugal foi renovado por mais quinze dias e o primeiro-ministro anunciou ontem que a terceira fase de desconfinamento vai avançar. Porém, a área metropolitana de Lisboa (que inclui 18 municípios dos distritos de Lisboa e Setúbal) não terão os seus centros comerciais abertos na segunda-feira. O Governo decidiu que só abrirão portas ao público no dia 5, tal como as lojas do cidadão, caso a situação o permita, e depois de um processo de avaliação e vigilância que será mais musculado nesta área face ao resto do País. Lojas com mais de 400 m2 e feiras aguardam decisão camarária. A reavaliação será feita no próximo dia 4, em reunião do Conselho de Ministros.
Mas há mais: enquanto no resto do país será possível um ajuntamento de vinte pessoas ( respeitando as regras de distanciamento de 1,5 metro ou mais), na área de metropolitana de Lisboa mantém-se a proibição de ajuntamentos de mais de 10 pessoas. O primeiro-ministro, António Costa, reconheceu que a situação na região da Grande Lisboa distingue-se do resto de Portugal, merece «preocupação», contudo «não revela de forma alguma qualquer situação de descontrolo», mas «focos bastante precisos».
O primeiro-ministro recordou, ontem, no final de um longo Conselho de Ministros que «não teria qualquer vergonha de dar um passo atrás», mas que o caso da Grande Lisboa não resulta especificamente do desconfinamento progressivo. Para o Governo, o problema incide sobretudo no «tipo de relação laboral [temporário], ou o trabalho da construção civil, que é agravado por condições de habitabilidade onde um elevado número de pessoas vive no mesmo espaço. Isto tem pouco a ver com locais de origem mas com condições de habitabilidade. Tenho visto muitas referencias ao bairro da Jamaica onde está em curso um programa de realojamento, mas o foco não tem a ver com condições de habitabilidade por isso não nos devemos centrar nessa lógica», avisou António Costa.
E como se resolve o problema? O Executivo vai colocar em marcha o reforço de medidas de vigilância epidemiológica, com a possibilidade de mobilização de testes de outras áreas do país para a zona da Grande Lisboa. Atualmente, esta área do país tem capacidade para 7 mil testes por dia, mas há «possibilidade de recorrer à capacidade de testagem de outras regiões do país, pelo que vai ser feito um esforço muito grande de testagem nesta região», assegurou Costa, apontando o modelo aplicado nos lares, logo na fase do estado de emergência. Para o efeito, também está previsto um plano de realojamento de emergência com o objetivo de separar quem está infetado ou sob vigilância e quem não está. Por exemplo, no caso da construção civil, os veículos de transporte de trabalhadores terão de ser reduzidos a dois terços e com o uso obrigatório de máscara. Nos transportes públicos, até ver, a avaliação do Governo é a de que, na maioria dos casos, a taxa de ocupação tem sido cumprida para acautelar o distanciamento social, exceto um comboio das 06h35 das linhas da Grande Lisboa. Na prática, as restrições na Grande Lisboa resumem-se a três grandes exceções: centros comerciais, grandes lojas e lojas do cidadão devem ficar encerradas, transportes privados de pessoas (designadamente da construção civil) com lotação a 2/3 terços e proibidos ajuntamentos de mais de 10 pessoas. Tratam-se de medidas para poder testar e despistar melhor as cadeias de transmissão.
Mas o Governo decidiu também que os ginásios podem reabrir a 1 de junho (outra novidade), mas sem balneários, com desinfeção permanente e respeitando o distanciamento social. Também os restaurantes podem optar por aumentar a lotação (reduzida até agora aos 50%) desde que os comensais possam estar separados por barreiras acrílicas e cumprindo as normas de distanciamento social (1,5 m). Caso contrário, manterão as regras de lotação a 50 por cento e distanciamento de 2 metros.
O regresso das atividades de ATL ( não integradas na rede escolar) estão adiadas até 15 e junho, mas a época balnear arranca no dia 6 de junho e haverá reabertura dos pré-escolar.
O teletrabalho deixa de ser obrigatório, mas haverá exceções: doentes de risco, com deficiência acima de 60 por cento, ou pais com filhos a cargo até aos 12 anos. Mas nas empresas terão de acautelados horários desfasados e equipas em espelho, ou seja turnos alternados. A Direção-Geral de Saúde pode ainda impor ainda o teletrabalho se as empresas não cumprirem as regras e condições de higiene e segurança.
Os cinemas, teatros e salas de espetáculos podem também reabrir mas com lugares marcados, cadeiras vazias entre espetadores e regras de desinfeção.
Fora da Grande Lisboa, as lojas do cidadão reabrem com marcação prévia e uso obrigatório da máscara.
De acordo com o plano de desconfinamento, na terceira fase reabrem ao público as lojas com área superior a 400 metros quadrados, ou inseridas em centros comerciais. Neste quadro só poderão estar cinco pessoas por cada 100 metros, as lojas terão sinaléticas e avisos sobre a a sua lotação máxima e desinfeções regulares.
De realçar que a partir de hoje serão retomadas as missas presenciais, mas a lotação será reduzida a um terço da capacidade de lotação das igrejas.
Entretanto, o autarca de Loures, Bernardino Soares, lançou o apelo para o reforço de apoio no seu concelho, sobretudo ao nível de profissionais de saúde, leia-se médicos.
Na última reunião de epidemiologistas no Infarmed, o caso da Grande Lisboa levou o primeiro-ministro a mandatar o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, para estabelecer diálogos com várias entidades fora da égide da Saúde para fazer um retrato mais completo da situação. Na reunião com epidemiologistas foi transmitido que estão ativos surtos em treze lares a nível nacional, mais 16 em empresas, e um em serviço de saúde, apurou o SOL.
Lisboa empurra epidemia
Esta sexta-feira, a diretora-geral da Saúde sublinhou que a situação em Lisboa e Vale do Tejo é multivariada e indicou que, além dos surtos na Azambuja e num bairro do Seixal, foram detetados 130 casos em seis obras, mostrando também preocupação com as concentrações em Lisboa nos últimos dias. E fazendo um apelo especial aos jovens.
Os dados nos boletins da DGS mostram que é em Lisboa e Vale do Tejo que têm sido confirmados a grande maioria dos casos, uma tendência que se verifica já desde o início do desconfinamento. Desde 4 de maio, quando o país começou a reabrir, foram confirmados mais 6422 novos casos de covid-19 no país, 1584 na região Norte – durante os primeiros dois meses o epicentro da epidemia – e 4507 na região de Lisboa e Vale do Tejo.
De sexta-feira da semana passada até ontem, os casos aumentaram 17% na região de Lisboa, quando na semana anterior o aumento tinha sido de 14,5%. Nas projeções internacionais feitas pelo Imperial College, no Reino Unido, que permitem uma comparação entre a epidemia nos diferentes países, Portugal é o terceiro país europeu onde os investigadores estimam um RT (o indicador que mede a taxa de reprodução do vírus) mais elevado, tendo previsto que na semana que agora finda se situaria nos 1,28 ((0,87 – 1,58). Acima, a República Checa, com 1,29 e a Rússia, com 1,33. Existem diferentes modelos para calcular o RT e o último balanço feito esta semana na reunião de peritos do Infarmed apontou para um cálculo de 0,99 a nível nacional, com um índice de contágio de 1,01 na região de Lisboa. Esta sexta-feira aumentou ligeiramente o número de doentes internados, para 529 mas numa altura em que a ocupação dos hospitais é ainda assim baixa comparando com o pico que se viveu em abril. Se a pressão vem da situação em LVT, no Hospital de Loures, onde tem havido um aumento de doentes desde a Páscoa, a semana acabou sem mais sobressaltos e um ligeiro alívio, com menos quatro doentes internados face ao início da semana, quando atingiram um máximo de 66 doentes com covid-19 em enfermaria e intensivos.