O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, começou ontem a ouvir os partidos com assento parlamentar sobre o Orçamento Suplementar, a votar no dia 3 de julho. Mas as questões sanitárias, designadamente o aumento de casos na região de Lisboa e Vale do Tejo, foi o denominador comum das declarações à saída das audiências. E houve recados para o Governo, mas também para Marcelo Rebelo de Sousa.
Na prática, a conclusão de cinco audiências traduziu-se num conjunto de críticas, designadamente do CDS, do PAN e da Iniciativa Liberal (IL), sobre o discurso adotado nas várias fases de desconfinamento em relação à situação de Lisboa e Vale do Tejo.
O primeiro a lançar o alerta (e a crítica) foi a Iniciativa Liberal. João Cotrim de Figueiredo, o presidente da IL, deixou recados tanto a São Bento como ao Presidente da República: “Os dados que existem, incluindo os de que o Presidente da República pode dispor, não são suficientes para concluir porque é que Lisboa tem uma deteção de casos de infetados tão diferente de outra zona do país. O que é diferente na zona de Lisboa, o tipo de trabalho? Não me parece. O tipo de transportes? Não me parece. O número de testes? Ninguém sabe”, afirmou o deputado à saída da audiência. E exigiu mais clareza sobre os dados de Lisboa e Vale do Tejo na reunião no Infarmed, já amanhã, com os epidemiologistas, insistindo que é preciso garantir que “os dados sejam muito claros”, mas também a respetiva “comunicação sobre esses dados”. Já sobre o Orçamento Suplementar, Cotrim de Figueiredo (que votou contra o documento) voltou a dizer que a proposta “não tem qualquer espécie de visão ou estratégia, como já não tinha o Plano de Estabilização Económica e Social, que se concentra apenas nesta fase e não se preocupa com a recuperação”. Na prática, “parece que se remete tudo para o Orçamento do Estado para 2021 e que está tudo à espera dos dinheiros que Bruxelas há de enviar e dos critérios que Bruxelas há de definir”, argumentou João Cotrim de Figueiredo.
Mais tarde, o CDS, pela voz do seu líder, Francisco Rodrigues dos Santos, também falou em equívocos sobre o que se está a passar na zona de Lisboa e Vale do Tejo e no duplo critério do Governo: “É necessário que o Governo consiga dar o exemplo ao nível dos comportamentos, separando aqueles que são permitidos daqueles que não são autorizados”, atirou Francisco Rodrigues dos Santos, pedindo responsabilidade ao Executivo.
Para o líder do CDS, o Governo não pode “autorizar espetáculos no Campo Pequeno quando na mesma praça não são permitidas corridas de touros” ou dizer que não existe mais verba para apoiar as famílias e, “ao mesmo tempo, aparecerem sempre novas verbas para injetar no Novo Banco”. E deixou mais uma farpa, antes de concluir a sua intervenção: “O Governo não se pode congratular com a receção da fase final da Liga dos Campeões e dizer que isto é um prémio para os profissionais de saúde quando está a disputar a liga dos últimos ao nível do controlo das infeções por covid-19”. E até criticou o “aparato mediático, até carnavalesco” do evento que juntou António Costa, o Presidente da República e o presidente da Assembleia da República.
Já o PAN recuou um pouco mais no tempo para lançar a crítica. Para André Silva, foi prematuro “o levantamento do estado de emergência” e não foi devidamente acautelada a mudança de narrativa para evitar “uma falsa sensação de segurança”. O PAN apoiará medidas mais restritivas e até punitivas para combater a propagação do vírus na zona de Lisboa e Vale do Tejo.
Já o Chega alertou que “Portugal não aguenta voltar atrás no desconfinamento numa altura em que toda a Europa está a desconfinar”. Para André Ventura, não se pode entrar em contraciclo; caso contrário, seria “triplamente trágico”. Dito de outra forma: são precisas medidas mais restritivas, mas sem avançar já para cercas sanitárias sem ter toda a informação. Por seu turno, a Iniciativa Liberal avisou que precisa de ter todos os dados para apoiar medidas mais restritivas das liberdades.
Por sua vez, o PEV frisou que apoiará todas as medidas que tenham o respaldo técnico da Direção-Geral da Saúde e o acordo dos autarcas, mas lembrou que as soluções mais punitivas são sempre “de última linha”, manifestando reservas sobre esta estratégia.
Sobre o Orçamento Suplementar, o PEV insistiu que é necessário travar qualquer tipo de apoio a empresas sediadas em offshores (o Bloco também defende a mesma ideia).
Nas audiências da manhã, a marcação de eleições regionais dos Açores não foi abordada, mas o Chega manifestou o seu “desconforto” com a saída de Mário Centeno do Governo, considerando que não há uma estratégia efetiva na proposta de Orçamento Suplementar para acautelar os riscos da crise (mais noticiário nas págs. 2-3).