Ao ouvir Costa e Silva entende-se quanto o Estado perdeu ao não o ter ao seu serviço.
Foi na atividade privada, numa área intensamente lucrativa, que se fez e construiu esta enorme capacidade de sonhar.
Chegou a sua hora, corre a salvar a honra do convento. O país agradece.
Despreza ele o Estado? Não.
O Estado perturba-o porque define prioridades discutíveis, porque tem recursos mal alocados, porque a organização não é exemplar, porque tem dificuldade em acompanhar a inovação.
E preocupa-o porque é todo este conjunto de debilidades que o torna insuficiente ou ausente.
Ele sabe que há, teoricamente, outro caminho. Fazê-lo desaparecer, por hipótese.
Mas não ignora como a vida seria substancialmente mais difícil sem proteção na saúde, sem garantia na segurança pública, sem funcionamento adequado dos tribunais, por exemplo.
Portanto, Costa e Silva é prudente. Não o Estado acima de tudo, mas o Estado como o nosso mais que tudo.
Fica a dúvida se nestes afazeres e responsabilidades do mesmo Estado se incluem os milhares de milhões que curam as traquibérnias bancárias. Admite-se que sim.
Reforce-se o dito.
E esta simples conclusão lança um apetecível convite à convocação da esquerda.
Vai ser muito preciso, nesta primeira fase de luta contra a desgraça, ter a sua companhia. Falências, desemprego, insuficiência económica, serão o dia a dia esperado.
E, comparando o rol das necessidades que os sucessivos buracos vão destapando com o volume das ajudas previstas na cimeira europeia, podemos antever que a margem de manobra é mínima.
Neste domínio estaremos em plena travessia do deserto, com a água indispensável.
Se nos limitássemos a recuperar o existente acabaríamos na mesma. Voltaríamos à casa de partida.
E não é isto o pretendido.
O que Costa e Silva propõe é utilizar as verbas disponíveis durante os próximos dez anos para alterar o destino do país.
É certo que as duas grandes apostas são por demais conhecidas. O novo aeroporto e a aposta na grande velocidade.
Mas, a estes clássicos, juntam-se outras novidades animadoras.
As empresas, elas também. Os apoios, os incentivos, a digitalização e a baixa em carbono.
Com a importante ressalva dos seis critérios claros para o acesso às ajudas públicas.
A direita espera entusiasmar-se.
As áreas metropolitanas agigantam-se. Adivinha-se um crescimento em estrela prolongando-as.
De fora fica o resto do país e, todavia, existe. Exatamente o que pena pelo interior fora e o que sobrevive nas Regiões Autónomas.
Alguém se encarregará de acrescentar algo mais, de colorir os pontos negros, de renovar a difícil esperança.
A Costa e Silva coube dizer o que é preciso fazer.
A outrem caberá explicar como e com que dinheiro.
Vem em boa altura, quando: os mercados avisaram do suicídio coletivo sem acordo, a Europa emite dívida conjunta e os frugais se alimentam dos rebates.
Tudo, portanto, com muito amor e entusiasmo.
Infelizmente, não pôde ele dizer à Europa o que se devia fazer. O tempo que se tinha poupado…
Felizmente o holandês voador aportou.
Felizmente há luar.