Cinco meses depois dos primeiros casos de covid-19 detetados no país, e quase três meses depois do início do desconfinamento, os portugueses ainda não voltaram à rua como antes da pandemia. Os relatórios de mobilidade feitos pelas operadoras móveis mostram que as deslocações associadas ao comércio e lazer, de cafés a centros comerciais, mas também museus ou por exemplo bibliotecas, estão agora 13% abaixo do que era habitual antes da pandemia em todo o país, quando a quebra chegou a ser bastante superior durante o estado de emergência. No que diz respeito aos transportes públicos e locais de trabalho, ainda se está um terço abaixo do que era normal antes da covid-19, sendo que a Google usa como referência o mês de janeiro.
Os relatórios feitos semanalmente por esta operadora desde o início da epidemia mostram também que, em Lisboa, as movimentações parecem ainda mais contidas do que no Porto: a Sul a mobilidade associada a lazer e comércio registava na última semana ainda uma quebra de 34% face à média de janeiro, enquanto no Porto era de 16%. Nos transportes, a quebra é de 49% em Lisboa, enquanto no Porto é de 32%. Em Faro, apesar das limitações do verão com covid-19, nota-se um aumento da afluência tanto no comércio como nas praias e espaços livres face a janeiro, como é expectável dado que no inverno há sempre menos pessoas na região. No comércio, há um aumento de 32% na circulação e nos espaços livres, o que inclui parques e praias, de 252%, quando no resto do país também há mais pessoas nos espaços livres, mas a diferença em relação a janeiro é de 70%.
Esta semana o Conselho de Ministros decidiu medidas para a próxima quinzena, mantendo a área metropolitana de Lisboa em estado de contingência e com regras mais apertadas para o comércio, que continuará a ter de fechar às 20h. O país continua a assim a duas velocidades, agora com mais margem para alguma vida noturna, apesar de bares e discotecas continuarem fechados – podem funcionar como cafés e fechar mais tarde no resto do país.
Lisboa sai do vermelho, Norte com mais casos
Lisboa continua a concentrar o maior número de novos casos de covid-19, agora com uma tendência decrescente, o argumento invocado pelo Governo para levantar o estado de calamidade nas 19 freguesias com mais casos. Ainda assim, o Executivo fala de grande estabilidade desde o início do desconfinamento, quando desde 4 de maio a região de Lisboa teve três vezes mais casos do que tinha tido até então e cinco vezes mais casos do que a região Norte, que tinha sido o epicentro na primeira fase da epidemia e onde as infeções baixaram.
Analisando os boletins diários da DGS, constata-se que nos últimos sete dias se manteve a tendência de diminuição de novos casos em Lisboa, sendo o abrandamento ligeiramente inferior ao que se registou na semana passada. No total, registaram-se de sexta-feira da semana passada até esta sexta-feira 1210 novos casos, o número mais baixo das últimas semanas. E o suficiente para tirar a grande Lisboa do patamar de incidência muito elevada com que aparecia há semanas nos mapas publicados diariamente pelo Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças, onde surgia a vermelho escuro como um das zonas de maior risco da Europa. Agora está a laranja (com uma incidência nos últimos 14 dias entre 20 e 59,9 casos por 100 mil habitantes, ainda perto do limitar superior, mas já abaixo dos 100 casos que registou nas últimas semanas).
Já na região Norte, onde o cenário continua mais calmo do que em Lisboa, houve nos últimos dias uma nova subida dos novos casos, que tinham diminuído na semana passada. Neste período de sete dias foram registados 260 novos casos, o que compara com 188 na semana passada. O Norte já tinha registado nas semanas anteriores um ligeiro aumento de casos, que se inverteu, sendo preciso esperar para perceber a evolução. As últimas estimativas do Instituto Ricardo Jorge para o RT, o indicador que calcula a taxa de novos casos a partir de cada infetado e que dá uma ideia sobre a trajetória da epidemia, são de 0,94 a nível nacional, sendo que no Norte voltou a subir ligeiramente para os 0,97. Em Lisboa a equipa do INSA calcula um RT de 0,92. Os valores mais elevados surgem nas restantes regiões do país, todas com um RT acima de 1: 1,01 na região Centro, 1,14 no Alentejo e 1,09 no Algarve. Com têm menos casos, as variações refletem-se mais rapidamente neste indicador: no Alentejo foram reportados 81 novos casos esta semana, o que compara com 77 na semana passada. No Algarve foram reportados 77 novos casos, o que compara com 61 na semana passada. São mais do que acontecia no início do desconfinamento, mas por exemplo equivalem ao que acontece em dois concelhos da grande Lisboa em 24 horas.
Portugal em contraciclo
Na previsão global, o INSA continua a apontar para uma descida dos casos, o que a confirmar-se aponta para um agosto em contraciclo com o que se passa em Espanha, França, Bélgica, Reino Unido ou mesmo Luxemburgo, que neste momento é o país com maior incidência de novos casos por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias.
Portugal estava esta sexta-feira com uma incidência a 14 dias de 30,9 casos por 100 mil habitantes, o valor mais baixo dos últimos meses. Em Espanha, onde toda a região da Catalunha surge agora a vermelho no mapa do ECDC, a incidência situa-se nos 53,6, o segundo mais elevado na UE. Vários países mantêm ainda assim restrições para quem viaje para Portugal. A Dinamarca retirou esta semana o país da lista de restrições, o que entra em vigor este sábado. O Reino Unido, que sexta-feira suspendeu os planos de desconfinamento e adiou a reabertura de teatros e salas de espetáculos e tem vindo a registar diariamente um aumento dos casos, tem mantido a obrigação de isolamento de 14 dias a quem regresse de Portugal. Uma petição lançada por uma enfermeira portuguesa a pedir que seja permitido aos imigrantes visitar as suas famílias sem serem penalizados no regresso ao trabalho juntava sexta-feira quase 2000 assinaturas.