Saber que o seu principal adversário eleitoral é uma mulher, Svetlana Tikhanovskaya, cuja campanha é dirigida por duas mulheres – Veronika Tsepkalo, cujo marido foi impedido de concorrer, e Maria Kolesnikova, que dirigia a campanha de outro candidato que acabou detido – deve ser um desgosto enorme para o velho Presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko. Já se dedicou a explicar porque é que uma mulher nunca poderia ser Presidente: «Colapsaria, pobrezita», explicou, numa visita a uma fábrica de tratores. «É demasiado para uma mulher».
Por mais que Lukashenko aposte no machismo para desvalorizar Tikhanovskaya, a candidata traz consigo uma história que soa familiar a cada vez mais bielorrussos. Antiga professora, dona de casa e mãe de dois filhos, Tikhanovskaya não esconde que passou o último ano a convencer o marido, o empresário Sergei Tikhonovsky, a fazer o que fazem todos os outros: baixar a cabeça. Descreve frequentemente a angústia que sentiu com a crescente popularidade do blog marido, com a vigilância e o medo constante. Tudo escalou quando este se candidatou às eleições presidenciais, acabando detido, sob acusação de ser um agente estrangeiro: para Tikhanovskaya, foi o momento de se erguer e tomar a dianteira.
Nada indicava que a sua candidatura seria desafio sem paralelo ao homem considerado como o último ditador da Europa. É que a frágil oposição Bielorrússia, apesar de ter um inimigo comum, sofre de amargas divisões internas.
Surpreendendo tudo e todos, logo início da campanha, Tikhanovskaya entendeu-se com o resto da oposição, representada por Tsepkalo e Kolesnikova. Em apenas algumas horas tinham um programa comum para uma candidatura de unidade, centrada em três exigências básicas: libertar os prisioneiros políticos, reverter as provisões mais autoritárias da constituição e marcar novas eleições, desta vez livres, dentro de seis meses.
As três mulheres saíram da reunião sorridentes: Tikhanovskaya tinha o punho cerrado erguido, Kolesnikova fazia um coração com as mãos e Tsepkalo um ‘V’, de vitória. Os gestos tornaram-se símbolos da oposição ao ditador, estando omnipresentes na enorme manifestação de apoio à candidatura de Tikhanovskaya, onde se reuniram mais de 60 mil pessoas – arriscando perseguição e prisão
Claro que a rapidez do acordo, a imagem idílica de três corajosas mulheres representando presos políticos, pareceu demasiado perfeitas a alguns – rapidamente a máquina de propaganda Lukashenko agarrou-se ao rumor que haveria mão da Rússia. O Presidente bielorrusso, apesar da sua relação próxima com Moscovo, sempre teve um discurso baseado no nacionalismo: se há coisa que muitos bielorrussos temem é a reunificação com o seu enorme vizinho.
De facto, há algumas ligações: Viktor Babariko, cuja campanha Kolesnikova dirigiu, ganhou a sua fortuna como gestor de um banco propriedade da Gazprom, Valery Tsepkalo, marido de Veronika, fugiu para a Rússia, e Sergei Tikhanovsky teve uma série de contratos com estrelas russas.
Já Tikhanovsky defendeu, em entrevista ao Independent: «Todos sabemos da aproximação de Lukashenko com a Rússia, que lenta mas seguramente levará à unificação integral. Perguntem-se quem é o candidato pró-Rússia».