O Presidente da República fez dois vetos em menos de 48 horas às alterações aprovados nas regras do Parlamento. E devolveu à Assembleia da República tudo o que, constitucionalmente, podia deste pacote de medidas. Dito de outra forma: foi um ‘cartão amarelo’ ao acordo alcançado entre PS e PSD para mudar algumas regras na ‘Casa da Democracia’.
Marcelo Rebelo de Sousa exigiu mais debates sobre a construção europeia, em plenário, e travou o aumento do número de assinaturas nas petições para serem admitidas a discussão em plenário. Só não travou a redução do número de debates quinzenais com o primeiro-ministro, porque não se pode imiscuir no regimento da Assembleia da República.
Porém, Marcelo não deixou de fazer passar o recado a quem aprovou a presença bimensal de António Costa no Parlamento, abandonando-se a solução dos debates quinzenais, pedindo equilíbrio, porque não se pode passar do «80 para o 8». Mas não se ficou por aqui.
«Os debates, em democracia, nunca são para preencher calendário. Ouvi alguém dizer que não fazia sentido. Faz sentido fazer debates para preencher calendário porque é isso a democracia», declarou Marcelo Rebelo de Sousa na passada quinta-feira, à margem de um périplo por várias unidades hoteleiras de Lisboa. Curiosamente, o deputado Duarte Pacheco, do PSD, questionou se se devem fazer mais debates apenas para «cumprir calendário». A reação servia para responder ao veto sobre os debates dedicados à construção europeia, feito por Marcelo Rebelo de Sousa. Em causa estava a redução dos atuais seis debates por sessão legislativa para duas. Esta solução «não se afigura feliz», escreveu o Presidente da República na mensagem enviada ao Parlamento. Em relação aos debates quinzenais, sobre os quais Marcelo nada pode fazer, o Presidente deu o seu próprio caso como exemplo: «Já fiz um comentário, a título de exemplo. Como eventual recandidato à Presidência da República: debates com todos os candidatos».
Mas Belém voltou ao ataque nas críticas para falar dos debates sobre a construção europeia. E apontou outro exemplo: o da chanceler alemã Angela Merkel, que vai ao Parlamento alemão antes de todos os conselhos europeus: «Está a cumprir calendário, mas está a fazer democracia», atirou Marcelo Rebelo de Sousa, para concluir que «quando as instituições começam a fechar-se porque acham que há debates a mais há qualquer coisa que não é boa para a democracia». Mais claro não poderia ser. BE, PCP, CDS e PAN aplaudiram a posição de Marcelo. Já o PS prometeu ter «em consideração» o veto de Belém, enquanto o PSD remeteu para mais tarde uma posição final.
As petições
O chefe de Estado também vetou as novas regras para as petições. A versão aprovada elevava de 4 mil para 10 mil assinaturas o número necessário para que as petições fossem discutidas em plenário. Abaixo das 10 mil seriam remetidas para discussão nas comissões parlamentares. Para Marcelo, esta solução dava «um sinal negativo para a Democracia portuguesa».
Nos argumentos usados, Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que «o número de petições desceu em 2018 e 2019, relativamente a 2017, e não ocorreu o temido aumento do uso do envio por e-mail», minimizando os argumentos usados para proceder a esta alteração. Mais: «Num tempo já complexo para a reforma e a atualização dos partidos políticos e de aparecimento de fenómenos inorgânicos sociais e políticos de tropismo anti sistémico, tudo o que seja revelar desconforto perante a participação dos cidadãos não ajuda, ou melhor, desajuda a fortalecer a democracia».
Assim, Belém considerou que «por imperativo de consciência» devolvia o texto ao Parlamento. De realçar que a proposta inicial das petições era do PSD. E previa que fossem necessárias 15 mil assinaturas para que o texto subisse a plenário. Numa negociação com o PS, o limite passou de 15 mil para 10 mil, num processo que motivou críticas noutros partidos.
Os socialistas e os sociais-democratas registaram a opinião de Belém, mas, por agora, não se comprometem com soluções. A partir de setembro, o assunto volta a debate no Parlamento com uma certeza: Belém não quer a redução da chamada fiscalização ao Governo, designadamente, numa altura de crise sanitária, social e económica.