Os estudos, os políticos e a comunicação social trazem consigo coisas que nunca se tinham visto em Portugal. De repente acordámos e somos todos muito racistas. Eu até fiquei com medo! Um conjunto de pessoas de máscara junta-se para reviver os tempos de Klan Klux Klan que, diga-se, nunca existiu sequer em Portugal.
Imagine-se uma coisa destas: nós, portugueses, afinal somos racistas!
Eu cresci na periferia de Lisboa. No meu bairro havia muita gente vinda de muitas culturas diferentes vindas das nossas antigas colónias. Os meus pais são das beiras. Eu já nasci em Lisboa. Tal como muitos dos meus amigos, cujos pais nasceram em Angola, em Moçambique ou em Cabo Verde, mas eles já nasceram em Lisboa.
Estudei em escolas difíceis no meu tempo: Camarate, Catujal, São João da Talha!
Havia problemas com as pessoas de outras culturas? Havia! Havia problemas entre portugueses? Havia!
O que penso é que havia problemas! E não precisamos de adjetivar as coisas!
Claro que nos chamávamos nomes uns aos outros? Claro que sim! E atacávamos a cor da pele? Sim! Como atacávamos o peso excessivo de alguém ou as características mais incomuns que cada um tinha.
No meu tempo dizia-se que as pessoas eram gozonas, hoje fazem bullying.
Eu era um franzino, magrinhito, que levava de todos!
É verdade que não era racismo, porque tanto se metiam comigo os luso descendentes como os afro descendentes.
Agora gostamos muito de catalogar as pessoas e as suas atitudes, mas o que eu penso, realmente, é que perdemos o respeito uns pelos outros.
Estamos a dividir cada vez mais a sociedade e a exigir direitos para cada setor da nossa sociedade ocidental. Exigimos acabar com a discriminação racial, a discriminação sexual, a discriminação e o preconceito para com as pessoas que são diferentes de nós.
Fala-se cada vez mais numa sociedade que integre as diferenças de todos.
Mas todos temos a sensação de que quanto mais vincamos as diferenças dos outros, mais desrespeito temos uns pelos outros.
Um dos problemas é que usamos as nossas diferenças, ou melhor, exibimos as nossas diferenças para nos vitimizarmos ou como arma de luta contra alguém ou contra alguma coisa. No fundo as diferenças são muitas vezes usadas como arma para atingir determinados objetivos.
Se acho que há pessoas que não respeitam as outras culturas? Sim! Se acho que há pessoas que não respeitam a autodeterminação sexual? Sim!
Não acredito, no entanto, que sejamos assim um povo tão intolerante como aquilo que estamos a pintar nas páginas dos nossos jornais.
Acredito profundamente que este tipo de abordagem e de sensibilização que estamos a fazer na nossa sociedade só está a gerar maior clivagem entre as pessoas em vez de as aproximar.
Eu trabalho na Mouraria, que é, talvez, o bairro com maior diversidade cultural: chineses, paquistaneses, indianos, nepaleses, romenos, ucranianos e, claro, portugueses. Nunca me lembro de ter havido algum problema com origem na diferença cultural nestes dez anos em que estou ali a trabalhar. A maior fonte de conflitos está na droga e não na diversidade cultural.
Porque aquilo que nos falta mesmo é educação e respeito. Tudo o resto são invenções das clivagens académicas de muitos que nunca viveram nestes bairros nem tiveram contacto com eles.