Tentei, acreditem que tentei não escrever sobre isto, mas é impossível.
O mundo e o país vivem um momento particularmente doloroso. Perdem-se vidas, perdem-se empregos.
Ninguém sabe exatamente o que há a fazer.
Gente ligada à direita plutocrática defende a ausência de regras, o primado da economia, a abertura ao perigo.
Dizem que é normal, que a incidência mortal é pequena, que a resistência se obtém pelo contágio generalizado.
Trump faz comícios, Bolsonaro deixa-se infetar no meio dos apoiantes.
Até um ex-primeiro ministro australiano defende que a solução natural é deixar morrer os velhos em nome da salvação da economia.
Na prática, a maioria dos países não procede assim.
Cria regras, restringe, causa limitações, luta pela descoberta de linhas de contágio.
Torna, evidentemente, difícil a vida para que a mesma vida se não torne impossível com a incapacidade de resposta dos hospitais.
Conflitua tudo isto com o nosso sentimento de liberdade, queremos muito estar juntos, conviver, fruir a cultura e o desporto, frequentar os restaurantes, viajar.
Temos aprendido a abrir gradativamente as nossas hipóteses. Respeitamos os outros. Usamos máscaras. Distanciamo-nos. Desinfetamo-nos.
Apesar de tudo há muitas atividades que não são retomadas porque não conseguem garantir a não periculosidade.
E há uma indústria fundamental para garantir o valor das exportações que, a medo, vai recuperando.
Sempre, com a ameaça dos números do nosso descontentamento, com a insegurança dos corredores de transporte aéreo serem ou não encerrados, com a corda na garganta.
E estamos perante um desafio de uma dimensão enorme que é a do regresso às aulas presenciais.
Para complicar ainda mais o cenário, os números de contágios crescem, o outono aproxima-se, a gripe também.
Ora, é exatamente neste momento que o PCP insiste na realização da sua Festa do Avante!.
O que é este acontecimento? É uma forma de angariar receitas para o PCP.
Militantes sem fim dão o seu trabalho gratuito, montam palcos e tendas de comes e bebes, convidam os seus e tentam montar espetáculos sedutores.
Duas ou três intervenções preenchem o espaço à política destinado.
É uma organização de massas para obter massa.
Claro que a inventiva comunista pinta-a de cores berrantes, torna-a transcendente no significado e nos resultados, confunde-a com o exercício da liberdade política.
É natural, diríamos.
Kirkegaard explicaria este comportamento com a superação da religiosidade própria do fanatismo ideológico.
E quem contra ela opine é imediatamente tido como reacionário, anticomunista, autoritário, opressor.
É a tentativa da instalação do complexo de culpa paralisante.
Sabe-se, porém, que os pequenos e médios comerciantes vizinhos encerrarão as suas portas, que a maioria dos artistas não terão oportunidades iguais, que os trabalhadores viverão o receio de dias piores.
A DGS, atenta, veneradora e obrigada, autoriza o evento com regras próprias.
Dizem os especialistas que não inibem a tragédia.
Dentro de pouco tempo se verá.
Se o número de casos se multiplicar, se o SNS agravar a sua crise de resposta, se as restrições à atividade voltarem, todos perderemos e triunfa a ideologia.
Nada de novo. Orwell já escreveu sobre este tipo de triunfo.