Na semana em que se assinala a ‘Semana da Mobilidade’ e em que foi apresentada a ‘Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030’ com referência às questões da mobilidade, nomeadamente nas cidades, e quando se assiste a intervenções relevantes na mobilidade em Lisboa, torna-se incontornável abordar este tema determinante para a vida das pessoas.
Um novo paradigma para a mobilidade urbana é vital. A utilização do automóvel tem de diminuir. Defender que tudo fique na mesma não tem futuro. Mas as novas políticas para a mobilidade têm, simultaneamente, de respeitar as pessoas e a vida quotidiana.
As áreas metropolitanas caracterizam-se, entre outros aspetos, pela grande mobilidade interconcelhia, que tem tradução na intensidade das deslocações pendulares diárias. A cidade de Lisboa, por exemplo, vê aumentar diariamente a sua população para o dobro face ao número de residentes.
Em Lisboa, cerca de 60% das emissões de gases com efeito de estufa e de partículas poluentes são provenientes dos transportes e estes são responsáveis por cerca de 30% do total de energia consumida. O objetivo de mitigar as alterações climáticas e de melhorar a qualidade do ar nas cidades – logo, a qualidade de vida – passa, decisivamente, por uma nova abordagem da mobilidade nas cidades.
São estes impactos que têm de ser considerados, por um lado, na premência de mudança de paradigma da mobilidade nas cidades, mas também, por outro lado, nas consequências para a vida das pessoas. É Este equilíbrio entre a mudança e o respeito pela vida do dia-a-dia das pessoas deve ser assegurado quando se planeiam e implementam alterações necessariamente profundas.
No âmbito da Visão Estratégica do Plano de Recuperação Económica recentemente apresentada, consta um subcapítulo dedicado às cidades com um conjunto de ideias e propostas que parecem consensuais: a aposta nos transportes públicos, a diminuição e eletrificação da frota automóvel, a promoção da mobilidade ativa ou a prioridade ao peão.
Mas nem tudo o que é importante e deve ser parte de uma estratégia de mobilidade ambiental e socialmente sustentável está presente nesta proposta. Talvez não tivesse de estar. Mas deveria estar no âmbito de políticas municipais e metropolitanas de mobilidade.
Para além da visão macro da gestão dos transportes nas áreas metropolitanas, importa dedicar atenção aos moradores dos centros urbanos, em particular nas zonas históricas. Devem ser asseguradas soluções de transporte local capazes de satisfazer as necessidades de deslocações intra ou inter bairros dedicadas aos residentes. Esta oferta deve passar pelo desenvolvimento de soluções inteligentes de transporte a pedido com caráter flexível.
Por outro lado, o elevado número de população escolar com necessidades específicas deveria conduzir à criação de uma rede de transportes escolares, dando resposta mais eficaz a horários específicos e aliviando a rede de transportes públicos.
Também deve ser dada resposta específica às empresas geradoras de grandes fluxos de procura de transportes públicos ou aquelas que, pelos seus horários provocam a utilização de transporte individual.
O automóvel deve ser evitado mas não pode ser proibido porque, em muitas circunstâncias, as pessoas necessitam de o utilizar e devem ter direito a circular e a estacionar.
Estes desígnios são, incontornavelmente, parte de um novo paradigma para a mobilidade nas cidades e começam a integrar as exigências das comunidades.
A mudança faz-se respeitando as pessoas e as suas necessidades, promovendo alternativas, mas não violentando e prejudicando a vida das pessoas. Afinal, as cidades são, sobretudo, as pessoas.