Catorze anos depois da introdução da vacina da meningite C no Programa Nacional de Vacinação (PNV), a vacina da meningite B – na última década o subtipo mais comum nos casos de doença meningocócica invasiva detetados em Portugal e na Europa – passa a ser também gratuita para as crianças no primeiro ano de vida.
O alargamento do PNV, que passa a incluir esta vacina mas também a vacina contra o Vírus do Papiloma Humano (HPV) para rapazes e a vacina do rotavírus, tem efeito a partir de hoje, confirmou ontem a diretora-geral da Saúde.
Já era esperado e aqui a pandemia não trocou as voltas à data anunciada pelo Governo no final do ano passado. No caso da vacina da meningite B, poderão recebê-la gratuitamente nos centros de saúde crianças nascidas a partir de 2019 e, caso já a tenham começado, poderão terminá-la através do PNV até as cincos anos de idade. Já a vacina do HPV, até aqui coberta pelo PNV apenas nas raparigas, para prevenir o cancro do colo do útero, é alargada a rapazes, depois de ao longo da última década terem sido demonstradas mais-valias na prevenção de carcinomas orais e lesões ano-genitais. Deve ser tomada antes do início da vida sexual e será dada aos rapazes com 10 anos, começando por ser administrada às crianças que nasceram no primeiro semestre de 2009. A vacina do rotavírus será dada a grupos de risco, que ainda não foram divulgados pela DGS, e avança em dezembro, dado que agora está em curso a vacinação da gripe.
O alargamento do PNV com estas três vacinas foi aprovado pelo Parlamento na discussão do Orçamento do Estado de 2019. Na altura a decisão, à margem da DGS e do Ministério da Saúde, causou polémica. Seguiu-se uma avaliação técnica por parte da comissão nacional de vacinação e a inclusão foi garantida no OE deste ano, com um reforço de 10,9 milhões de euros no PNV para garantir a compra das vacinas. Ficou garantido que são abrangidas crianças nascidas desde 2019, o ano em que a medida teria entrado em vigor, mas não foi estabelecido um reembolso para as que já fizeram a vacina, indicada no primeiro ano de vida (o esquema vacinal terá três doses aos dois, quatro e 12 meses). A vacina custa 95 euros por dose nas farmácias, o que representa até aqui uma despesa de 285 euros para as famílias, uma vez que já era recomendada pelos pediatras. A vacina do rotavírus, que previne casos de gastroenterite aguda, custa 57 euros. Já a vacina do HPV, ainda menos generalizada nos rapazes, custa atualmente 136 euros por dose.
Jorge Amil Dias, presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, considera “uma medida positiva” o alargamento do PNV. O médico admite que a despesa era elevada e que crianças que nasceram antes de 2019 e não foram vacinadas poderiam beneficiar, mas defende que é compreensível que exista um faseamento. “Enquanto pediatras, mais que tratar crianças queremos evitar que adoeçam. Apesar de ser o grupo mais comum da bactéria, estamos a falar de uma doença que é rara. No mundo ideal dávamos todas as vacinas a todas as crianças. Mas se comprar caviar, sei que vai faltar para as batatas. Com os constrangimentos financeiros que existem, é compreensível que se faça uma gestão parcimoniosa dos recursos à luz dos benefícios”.
O médico antevê que o Estado, comprando vários milhares de doses, provavelmente conseguirá valores mais baixos, o que poderá também afetar os preços no geral, sendo ainda incerto. “A inclusão no PNV nem sempre é um bom negócio para os fabricantes, sabem que os preços que vão contratar com o Estado serão à partida mais baixos. Se começar a haver um decréscimo muito grande na procura, é provável que resolvam cortar a margem de lucro”.
De acordo com o última avaliação do Instituto Ricardo Jorge sobre doença meningocócica invasiva em Portugal, publicada em abril, entre 2007 e 2016 registaram-se 766 casos – 2016 foi o ano com menos diagnósticos, 42 casos no total. A maior incidência é no primeiro ano de vida.
Os casos associados a meningococo C, que chegaram a ser mais de 100 por ano antes da vacina, são hoje residuais e em 2016 não houve nenhum. O grupo B representa 78,2% dos casos e o grupo W e o grupo Y os restantes. Em 2016, o último ano com dados analisados ao detalhe, morreram duas crianças com doença meningocócica invasiva no país. Entre 2003 e aquele ano, concluiu o INSA, houve 102 mortes. No início do milénio havia mais de 20 mortes por ano – foram 27 no ano 2000. O número de óbitos começou a baixar sobretudo a partir do uso da vacina da meningite C, que começou a ser comercializada em 2001 e foi incluída no PNV cinco anos depois. Este fim de semana o Programa Nacional de Vacinação completa 55 anos. Foi criado a 4 de outubro de 1965, na altura com uma prioridade: combater a poliomielite. O último caso foi detetado no país em 1986 e a doença foi declarada oficialmente eliminada em 2002.