Os telefones usados por Duarte Lima em 2009, sobretudo um com número suíço, que o colocam nos locais e no período temporal em que ocorreu o assassínio de Rosalina Ribeiro, são as provas-chave do processo-crime que o Brasil remeteu para julgamento em Portugal e que foi esta semana recebido na Procuradoria-Geral da República. Esse telefone suíço era usado pelo ex-deputado para falar com os elementos da rede de branqueamento de capitais Monte Branco de que era cliente – um facto que foi assumido por dois dos principais arguidos neste caso, numa conversa entre ambos intercetada neste caso, em que ambos analisavam a investigação do SOL sobre o envolvimento de Lima na morte de Rosalina.
Ao abrigo de um acordo de cooperação, a Justiça brasileira pede a Portugal que julgue o caso, depois de considerar não ter condições para fazê-lo, tendo em conta que Lima está em Portugal e que, se fosse condenado no Brasil, nunca seria extraditado para cumprir pena. A PGR e a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, terão agora de se pronunciar e verificar se o pedido cumpre os requisitos no acordo de cooperação judicial entre os dois países, que prevê de facto a possibilidade de um julgamento deste género, mas que até hoje nunca foi acionada.
Despistar as autoridades Segundo os autos do processo agora remetido a Lisboa, um dos telemóveis que Duarte Lima utilizou no Brasil na altura em que a companheira do milionário Lúcio Tomé Feteira foi assassinada não só lhe pertencia, como fazia parte do tipo de serviços que a rede suíça disponibilizava aos seus clientes para estes escaparem à vigilância das autoridades. No verão de 2011, o SOL avançou que a Polícia brasileira suspeitava que Duarte Lima era o responsável pelo homicídio de Rosalina, ocorrido a 7 de dezembro de 2009. Para despistar as autoridades, o advogado utilizara quatro telemóveis, entre os quais um registado na Suíça. Após a publicação da reportagem, o próprio Duarte Lima deu instruções a um dos elementos da rede para desativar o cartão do telefone e o número ficou indisponível. Nos dias seguintes, as autoridades portuguesas que investigavam o caso Monte Branco intercetaram ao telefone Nicolas Figueiredo e José Pinto (colaboradores de Michel Canals, o líder da rede suíça, que foi gestor das contas de Feteira e de Rosalina e também de Duarte Lima no banco UBS). Comentando o artigo do SOL, um perguntou então ao outro se já tinham desativado o telemóvel de Duarte Lima.
Terá sido, aliás, o próprio Duarte Lima a despertar a atenção das autoridades brasileiras para esse facto quando, dois dias depois do desaparecimento da sua cliente, comunicou que apenas se deslocara de Belo Horizonte ao Rio de Janeiro para se encontrar com Rosalina após um telefonema desta na véspera, para o seu número oficial de advogado. Ora, a lista de chamadas dos telefones de Rosalina indica que o seu último telefonema para Duarte Lima ocorreu seis dias antes da morte. O advogado nem sequer atendeu, tendo retribuído a chamada uma hora mais tarde e do número suíço.
Foi também este telemóvel com número suíço que Duarte Lima usou para contactar a brasileira Marlete Oliveira, sua secretária pessoal – o que levou a Polícia a concluir que, para não deixar rasto, utilizara na sua estada no Brasil mais dois móveis ‘buchas’, ou seja, sem assinatura. Na véspera do crime, dia em que as autoridades consideram que Lima fez o reconhecimento da zona onde Rosalina apareceria morta, voltou a usar o número suíço para contactar a secretária. Estas ligações levaram a Polícia a concluir que se verificava uma “grande possibilidade” de o utilizador dos dois telemóveis ser o mesmo, uma vez que “os dois telefonemas são feitos com o intervalo de um segundo e são efetuados do mesmo local, ficando registados na mesma antena celular”. Na altura, durante a sua investigação, o SOL verificou que os ‘buchas’ estavam desligados e o telemóvel suíço tocava, mas ninguém atendia. Após a publicação do artigo, este número ficou inoperacional.
Foi através das chamadas recebidas por Rosalina Ribeiro, nos dois dias em que Duarte Lima permaneceu no Rio de Janeiro, que os investigadores determinaram que o advogado estaria a usar no país dois telemóveis em roaming: um com cartão português sem assinatura e um com cartão suíço, de onde também houve contactos com Rosalina Ribeiro seis dias antes da sua morte. E é pela localização celular, que permite identificar o percurso do utilizador desses aparelhos, e pelo fluxo das chamadas efetuadas para Marlete nesses dois dias, que as autoridades brasileiras têm a convicção de que o advogado os teria na sua posse e que, na véspera do crime, obedecendo a um plano, circulou durante mais de três horas na zona onde o corpo de Rosalina viria a ser encontrado (conhecida por Região dos Lagos).
O levantar da suspeita A descoberta de ainda um terceiro cartão de telemóvel, também português e sem assinatura, que apenas serviu para contactar Rosalina na véspera e no dia em que esta foi morta, e cujo número apenas difere de um dos outros telefones nos três últimos algarismos, indica, segundo as autoridades brasileiras, tratar-se de cartões da mesma série, que a operadora terá emitido no mesmo dia e que poderão ter sido vendidos à mesma pessoa na mesma loja. Foi este, aliás, o primeiro número que despertou a suspeita nos investigadores e os levou a estabelecer desde logo uma relação com a pessoa com quem Rosalina, a 7 de dezembro de 2009, fora ao encontro.
O MP brasileiro sustenta que Duarte Lima assassinou Rosalina Ribeiro depois de ambos se desentenderem por causa de 5,2 milhões de euros que esta colocara nas suas mãos, desviados da herança de Tomé Feteira: o advogado quereria que ela assinasse uma declaração em como não lhe pagara aquela quantia e ela recusava.
Recorde-se que Duarte Lima está presentemente a cumprir seis anos de prisão a que foi condenado no caso BPN/Homeland.