por Francisco Rocha Gonçalves
Vice-Presidente da Câmara Municipal de Oeiras
Todos tínhamos a perfeita consciência de que o exercício orçamental para o próximo ano seria sempre ingrato, de muito difícil elaboração e de ainda mais difícil execução, por ter de acomodar as necessárias respostas à pandemia de covid-19, num quadro que continua a ser de desconhecimento.
Nesta altura, ninguém tem verdadeiramente ideia de como vai reagir a economia nos próximos meses, porque também ninguém sabe como vai evoluir a doença e se teremos, rapidamente, um tratamento ou uma vacina que se mostrem viáveis. Acresce que a construção do orçamento para 2021 está, ainda, limitada com a determinação do governo, desde o primeiro momento, em apenas olhar para a esquerda do Parlamento, para apoio e inspiração. Daí, tem decorrido toda uma encenação de crise, num espetáculo público lamentável de comunicação política.
Este exercício de fazer com que a aritmética parlamentar seja compatível com governo, PS, BE e PCP não perderem a face privilegia, obviamente, o curto prazo e a navegação à vista, com o objetivo claro de garantir uma maioria agora, em outubro, e a aprovação em dezembro.
Em janeiro, depois, logo se verá.
A decisão de percorrer este caminho limitado criou uma proposta orçamental unidimensional: é assistencialista, como deve ser, perante a gravidade de um contexto com amplitude desconhecida; mas termina aí a resposta, esperando, talvez, que a chegada dos fundos europeus componha o apoio necessário à economia, com sorte, a partir do segundo semestre de 2021.
Nem sequer estamos a falar de construir alicerces para o futuro, porque a navegação de cabotagem que se exprime na atuação deste governo não o permite.
Pior é que este exercício orçamental, que é divulgado como uma proposta que “apoia a economia e o emprego”, é maniqueísta, porque ao só olhar à dimensão social, ignora a económica, como se não fossem estes dois lados da mesma moeda. Este esquecimento da atividade económica, e do que com ela está relacionado, está patente na primeira medida destinada às empresas escolhida para o argumentário governamental: “Os impostos não vão ser aumentados”, como se fosse natural que isso acontecesse. Expliquem essa vantagem, por exemplo, a quem viu erodir 40% ou 50% da sua faturação num ápice.
Obviamente, os apoios sociais são necessários, fundamentais, mas devem ser acompanhados de políticas de apoio ao emprego, também necessário e imprescindível, para que haja vida depois da pandemia. Distribuir tem de ser compatível com criar.
Quando enfrentamos uma crise profunda, sem precedentes, a receita não pode ser unidimensional e a ação política divisionária e maniqueísta.
Num momento em que tanto precisamos de ter uma resposta que nos una, enquanto comunidade, optar por forjar tensões é lamentável. Talvez também aqui sejamos salvos pelo bom senso da vizinha ou, em última análise, pelo bom senso do vizinho de Belém…