Ao lado do comandante do Boeing 737, Isabel desfrutava da vista aérea de Lisboa e preparava-se para ajudar na aterragem. Devido à sua inexperiência, teve de ser ajudada para não causar um ‘acidente’. O aparelho acabou por aterrar no aeroporto da Portela em segurança e Isabel suspirou de alívio. Apesar do voo não ser real, mas sim realizado num simulador, a sensação de autenticidade impressionou a jovem copiloto. «Tive medo de fazer asneira, pois não consegui deixar de olhar para a paisagem a ver se via a minha casa, e dei um ‘solavanco’ no comando que nos ia despistando. Mas senti-me uma verdadeira personagem do Top Gun», confessou. Depois foi a vez de Reis aventurar-se até à Madeira.
Levantou voo em Lisboa e passado uns minutos estava a descer para uma das pistas mais emblemáticas da aviação aérea. «É um espetáculo, estou farto de fazer essa viagem como passageiro, mas nunca pensei que iria ter tanto gozo a fazê-la como copiloto», desabou no final.
Os dois copilotos puderam realizar a fantasia, durante uma hora, de estarem aos comandos de um Boeing 737, mas só o conseguiram porque tiveram a ajuda de quem sabe. «A maioria dos voos são feitos com um instrutor porque a maioria das pessoas que chegam aqui não têm noção nenhuma de como se faz a pilotagem de um avião. Nem sequer o motor conseguem pôr a trabalhar, seria altamente frustrante se não tivesse alguém que os guiasse», explica José Costa, responsável pela AeroSim Experience, ao b,i.
Não são só curiosos e sonhadores que se querem sentar ao cockpit deste ‘avião’ estacionado numa pacata rua de Lisboa, como acrescenta José Costa: «Desde os mais entusiastas pela aviação, a estudantes de pilotagem que estão nas escolas a tirar os seus brevês, assim como pilotos que precisam de fazer treino de procedimentos porque num simulador destes é perfeitamente possível fazer isso já que permite simular um voo igual a um real». «Pode-se simular avarias, planos de voo, treinos de aterragem e descolagens. Pode-se fazer o que se quiser, o avião pode ser posto em qualquer parte do mundo, a voar a uma determinada altitude ou a voar a uma determinada velocidade. Por exemplo, se quisermos aterrar em Lisboa 30 vezes seguidas é fácil. Basta dizer ao avião para se voltar a posicionar a determinada altitude e o piloto pode estar só a treinar as aterragens».
O simulador de voo conta com uma réplica em tamanho real do cockpit; mais de 24 mil destinos em todo o mundo; mais de 30 destinos em alta definição; plataforma de voo totalmente funcional e uma tela de projeção curva de 220º que proporciona uma imersão total e os mais variados detalhes do solo.
Isabel e Reis não fizeram a viagem completa, mas podiam tê-la feito se estivessem dispostos a gastar mais horas, já que no simulador também é possível fazer um voo completo – desde a preparação do avião: ligar baterias, sistemas, carregar a rota e fazer todas as afinações para que o possa avião possa descolar e depois avançar com os procedimentos todos para a aterragem: aproximação à pista, baixar o trem, posicionar os flaps – exatamente como se tivéssemos num voo real.
Este simulador não está certificado, mas José Costa admite que isso não é uma prioridade. «Neste momento estamos mais virados para o público geral. Sei que há muitos pilotos que frequentam este tipo de simuladores sobretudo quando estão parados há algum tempo para fazer um refreshing».
Além disso, também é pensado para pessoas que têm fobia em viajar e que podem tentar o programa de terapia aeronáutica.
Como surgiu a ideia?
José Costa admite que sempre teve esta paixão, apesar de nunca ter pensado em seguir a carreira de piloto. «Sempre gostei de máquinas e quanto maiores, melhores. Mas há 20 anos comecei a interessar-me mais pela aviação». E, tal como acontece a todos os apaixonados por esta área, começou por apostar num computador e a começar a ‘voar em casa’.
O gosto foi crescendo e ainda em casa juntou-se a companhia área virtual – a British Airways que a par do negócio tradicional de aviação também disponibiliza este tipo de serviços – o que já lhe exigia uma certa disciplina. «Havia uma série de voos que tinha de fazer por mês, determinadas rotas a realizar. Era viver um bocadinho como se fosse uma experiência quase real», no entanto, o responsável sentiu que queria ‘um bocadinho mais’.
Foi a partir daí que começou a procurar ‘desafios maiores’ e encontrou este tipo de simuladores. «Comecei por fabricar as minhas próprias peças e a comprar algumas em Espanha. O simulador foi crescendo, mas de repente olhei para aquilo e achei que queria uma coisa mais acima. Conclusão: vendi tudo e comecei a comprar peças a um dos líderes mundiais da fabricação de simuladores que fabricam, por exemplo, para a NASA, para Boeing e para uma série de companhias aéreas que usam o mesmo estilo de simuladores para treinos dos seus próprios pilotos».
O projeto e a sua paixão foram ganhando cada vez maiores contornos e dimensões, ao ponto de a casa ter ficado pequena para estes desafios. «Tinha tudo montado em casa e esta estava moldada à volta da sala do simulador. Deixou de fazer sentido. A casa era antiga, tinha de ser reforçada e se o simulador cabia lá dentro, o mesmo não acontecia com os visuais», confessa.
Foi fazendo pesquisas e estabeleceu alguns contactos até que que chegou à AeroSim Experience no Canadá. Tornar a sua paixão num negócio foi um passo. Nasceu assim a AeroSim Experience em Portugal. Abriu portas em Lisboa no início do ano e a montagem do simulador foi praticamente feita pelo próprio, não fosse ele um autodidata. «Tratei das cablagens, fiz as soldaduras, a montagem de painéis, etc., depois só tive de esperar que viesse um australiano para montar o sistema visual que é o melhor sistema que existe».
José Costa admite, no entanto, que o aparecimento da pandemia trocou um pouco as voltas ao seu negócio. «Vamos tendo alguns curiosos, mas a covid-19 trouxe algum desconforto às pessoas em circular ou em estar junto de outras pessoas. Um receio que aqui não faz sentido porque cumprimos todas as normas da DGS».
Em relação ao investimento que fez garante que «é muito significativo» porque todas as peças «são muito caras». Mas está convencido que o negócio poderá tornar-se rentável entre dois a três anos, no entanto, «tudo depende das vendas».
Projeto futuro
Outra aposta é um caça que funciona com a realidade virtual. «É um F18, anda a 2000 e tal quilómetros por hora e pode ser assustador por ser tudo muito rápido. E assim que põe os óculos, consegue ver a 360 graus e tem acesso a várias missões: desde combate aéreo, bombardeamentos, aterragens, descolagens, voo informação e a missão mais engraçada é a aterrar num porta-aviões mas é a mais difícil. No Canadá, onde há vários simuladores iguais a estes, a primeira vez que alguém conseguiu aterrar num porta-aviões foi um piloto da marinha americana, mas eles não sabiam. É preciso aterrar a alta velocidade, o porta-aviões balança e se falhar a aterragem tem de continuar a voar. Mas para já é um projeto futuro».