Não constituirá surpresa. Uma boa parte da América aprecia aquele estilo, é sugestionada pelo espetáculo e desperta no seu subconsciente a singularidade isolacionista.
O seu ponto mais fraco foi a forma como geriu a pandemia.
Não porque muitos não viessem a pensar ou constatar o mesmo, mas porque insistir na economia e subestimar a organização da resposta sanitária era uma opção muito arriscada.
Só conseguiria ter sucesso se as coisas corressem bem, se o crescimento do mal se moderasse, se o sofrimento não doesse tanto.
Será que em nome do interesse nacional e da convergência de esforços esta questão poderia ser poupada à controvérsia eleitoral?
Isto é, será que a pandemia se podia poupar à discussão política?
O radicalismo de Trump ajudou.
Os democratas entenderam que não. Fizeram do tema o essencial da sua mensagem.
De um lado a máscara, do outro a ausência dela. De um lado a cautela em relação ao contágio, do outro o apelo à liberdade individual e à supressão das limitações.
E daí a permanente ligação à proteção na doença.
Sendo todas as outras, muitas, questões fraturantes, esta foi essencial.
Entre nós, os temas dominantes também são umas eleições e a pandemia.
De um modo diferente, o poder perde.
Nos Açores foi o que se viu.
Quase sem se dar conta, o PS perdeu a maioria no Parlamento.
Pode queixar-se de toda a gente, convém que se não esqueça de si próprio.
Quanto à pandemia, a história é outra.
Não se pode desculpar o poder com a oposição.
Esta tem feito, da colaboração, política.
Nem por isso as coisas estão a correr bem.
Há uma sensação de perda de tempo, de desorganização, de descontrole.
O primeiro dos ministros é obrigado, falhando tudo o resto, a compensar em intervenções públicas nem sempre bem sucedidas.
Num dia disfarça mal a sua não concordância com o estado de emergência. Não vai ao Parlamento.
Noutro anuncia medidas ao fim da noite para pouco tempo depois enunciar exceções anteriormente negadas.
Noutro, ainda, sendo entrevistado em negação da realidade.
Só ele é capaz de afirmar que não esperava tão cedo a segunda vaga.
Só ele está convencido de que o reforço necessário tinha sido feito com suficiência.
Só ele acha que os demais setores colaboraram e os outros doentes não tinham ficado para trás.
Só ele, cujo Governo nem sequer consegue resolver o tão anunciado plano de vacinação contra a gripe, anuncia que a vacina contra a covid se aplicará com plena eficiência.
Só ele admite aplicar medidas sem ter estimado as compensações indispensáveis.
Só ele, em suma, recusa o falhanço do planeamento, da comunicação, da resposta.
Está em perda.
Não parece extraordinário que o principal partido da oposição comece a assumir o seu papel.
Os apoiantes de poder têm outra preocupação: um quer recusar o orçamento, outro quer fazer o congresso.
Dizia Eça que, para desviar as atenções, o mais à mão era culpar o Bei de Tunis.
Não existindo ele, serve o líder do Chega.