Vivo atualmente no distrito de Viseu que, antes, não conhecia. Sou alentejano e ainda conheci o suficiente da vida desses campos, das relações entre os latifundiários e os trabalhadores agrícolas. Depois, conheci bem a vida da zona de Lisboa, desde o seu ‘cosmopolitismo’ intelectual à cintura industrial. Por razões profissionais tive, depois, algum contato com o ‘resto’ do país, do Minho à fronteira beirã. Acompanhei, em novo, pelas notícias e a literatura, os dramas dos excedentes populacionais e da emigração clandestina, do peso da igreja e dos caciques locais, do espírito rebelde da ‘Maria da Fonte’ e das heroicas lutas contra os franceses. Agora, julgo estar a ‘perceber’ muito melhor estas terras e gentes, ambas abandonadas, a viverem das poupanças da velha emigração e das esmolas de sobrevivência dos ‘fundos europeus’. É como um conjunto de organismos ‘ligados à máquina’, nos ‘cuidados intensivos’ ou em lares de 3.ª idade. Aqui, como por quase todo o país, nunca houve uma ‘burguesia empreendedora’, vocacionada para transformar estas sociedades ainda marcadas pelos traços culturais do ‘ancien régime’. No entanto, quer as terras como as gentes contêm potencialidades extraordinárias. Com democracia participativa que desprendesse e mobilizasse vontades e recursos e com uma boa dose de autogoverno, toda esta região poderia converter-se num ‘celeiro de Portugal’ e num vulcão de criatividade inovadora.
Em vez de uma região ‘deficitária’, em decadência social e económica, ligada à máquina dos ‘fundos’, poderíamos ter uma potência que muito acrescentaria à nossa atual fraca potência nacional. E este pensamento poderia estender-se a todo o país.
Agostinho da Silva dizia que o maior contributo que Portugal poderia dar à ‘Europa’ era ensiná-la a viver com os outros, sem arrogância ou espírito de superioridade, isto é, a perder a vocação colonialista que Natália Correia tão apropriadamente lhe atribuía.
Enquanto não formos fortes, humana, económica e espiritualmente, estamos vocacionados, como acontece hoje, a sermos uma colónia dentro da UE. Sim, somos governados por ‘cipaios’, por capatazes do estrangeiro, seja este ‘europeu’ ou ‘americano’, vocacionados para lhes ‘aviar pratos’ quando cá vêm apanhar sol. Pouco importa que se digam de ‘direita’ ou de ‘esquerda’, ‘progressistas” ou ‘conservadores’, ‘liberais’ ou ‘iliberais’… Isso é só espetáculo intelectualoide para nos adormecer enquanto colonizados.
O presente caminho não é nada bom para Portugal e é igualmente mau para a ‘Europa’, que só sabe fazer o que sempre fez, sem ideias atualizadas e válidas para um Futuro, europeu e mundial. Os americanos fazem dela ‘gato-sapato’ usam-na e manipulam-na como bem entendem. Agora, com o Biden (que ninguém se iluda!), espera-se que se acelerem os pontos de confrontação com a Rússia, o seu alvo principal. A ‘Europa’ vai ficar bem ‘queimada’ nessa aventura. E nós,
Portugal, no fim disso tudo, nem com batatas ficamos para comer.
É preciso reconstruir Portugal, no espírito e no corpo, para que possamos ‘ser ouvidos’ e podermos ensinar à ‘Europa’ como estar no mundo que se aproxima.
É preciso reconstruir Viseu e todas as regiões portuguesas; é preciso refazer as relações com África, com a América Latina e o Oriente; é preciso trabalhar com Espanha e com todos povos ‘inferiorizados’ da Europa; é preciso sacudir o jugo, para salvar Portugal e a própria Europa, para configurar um mundo viável e Humano…
É necessária, mais do que nunca, na urgência que a breve prazo se irá colocar, a maior unidade dos portugueses, a partir de uma plataforma democrática e patriótica. É preciso, desde já, trabalhar em conjunto as ideias sobre a estratégia, as táticas e o programa a levar a cabo para reconquistar a dignidade e a soberania nacional num quadro de grande cooperação internacional.