Há já algum tempo que me debato com a necessidade da sesta no pré-escolar, tendo até escrito há dois anos uma crónica intitulada ‘Deixem as crianças dormir’.
Continua a indignar-me que, sabendo a importância que o sono tem no desenvolvimento físico, mental e intelectual das crianças, por vezes ainda não lhe seja dado o devido valor.
Tal como a alimentação, o sono é um processo fisiológico que não deve ser descurado. Sabemos que ao longo dos anos vamos diminuindo a necessidade de horas de sono e também que a necessidade que um bebé tem de descansar em vários momentos ao longo do dia nos primeiros meses, se vai espaçando ao longo tempo, passando depois para duas sestas, só uma e finalmente nenhuma.
Mas tal como qualquer outra necessidade, também o sono varia de criança para criança e, tanto na escola como em casa, deve haver um acompanhamento atento das mudanças a esse nível.
Se, por um lado, apesar das recentes indicações do governo e de uma maior sensibilidade, ainda muitas escolas continuam a não apresentar solução para as crianças que necessitam de dormir a sesta – sobretudo por falta de recursos humanos ou físicos –, por outro, há muitas que, pelas mesmas razões, não têm forma de deixar acordadas as crianças que já não têm necessidade de dormir.
Ou seja, continuamos a assistir a um desrespeito pelo sono e não se pode permitir que não sejam dadas condições às escolas para fazer esta diferenciação ou que este aspeto não seja considerado prioritário.
Tal como é grave não permitir que uma criança de três anos, que ainda durma a sesta em casa e que beneficie em fazê-lo, não o possa fazer na escola, também é um absurdo obrigar crianças de quatro, cinco ou seis anos a fazê-lo só porque não há condições para que fiquem acordadas.
Não passa pela cabeça de ninguém obrigar uma criança a fazer chichi quando não tem vontade, ou a não permitir fazê-lo quando está aflitinha. Por que se pensa que com o sono será diferente?
Como é possível obrigar uma criança sem sono a estar num desconfortável catre durante horas sem fazer barulho? E se o sono a vence e acaba por adormecer é sensato impedir que adormeça tranquilamente à noite, na altura em que o sono será realmente reparador? Não se chama a isto desregular os sonos? Aquilo que se vê muitas vezes nos bebés que dormem de dia e estão acordados à noite. Aqui não é muito diferente e desequilibra também o bem-estar familiar. Ter crianças excitadíssimas aos pulos na cama à noite quando os irmãos querem dormir e no dia seguinte têm de acordar cedo não é de todo ideal.
E o mesmo se passa inversamente, com crianças que deviam ter ainda dois tempos de sono e chegam a casa cansadíssimas, sem conseguirem ter um momento de qualidade com a família, cheias de birras e necessidade de dormir.
Tanto em casa como na escola, as crianças devem ou não fazer a sesta mediante uma avaliação atenta e consciente entre pais e educadores da sua necessidade. A questão é demasiado importante para ser determinada pela conveniência ou pela falta de meios.