As principais metas para Santos Silva, passam pela chegada a junho com o Quadro Financeiro Plurianual (QFP – o orçamento para 2021-2027 da UE) e ter todos os regulamentos aprovados e os programas de recuperação nacional de cada país lançados. Outras áreas também importantes serão a vacinação a nível europeu e mundial contra a Covid-19, o “impulso” do pilar social da UE, e o estreitamento das relações internacionais entre a Europa e o resto do mundo.
“Chegar ao fim da presidência com o QFP no terreno” e “ter todos os regulamentos aprovados e os programas de recuperação nacional de cada país lançado” é um dos principais objetivos do “semestre português”
A questão do bloqueio do orçamento europeu pela Polónia e pela Hungria ficou resolvido no último Conselho Europeu, cabendo agora à presidência portuguesa da UE aprovar as regras associadas e coordenar os processos de ratificação nos parlamentos nacionais.
Sobre o Fundo de Recuperação e Resiliência (Next Generation EU), que se encaixa nos 750 mil milhões de euros, a liderança portuguesa terá de assegurar que todos os membros da União Europeia entregam os seus planos de recuperação a tempo, tendo Portugal entregue o seu a 15 de outubro, o primeiro dia em que era possível fazê-lo.
“A lógica do Fundo de Recuperação é diferente da lógica dos fundos europeus propriamente ditos. Neste caso, há um adiantamento inicial, a proposta da Comissão é que seja 10%, mas depois os pagamentos são feitos numa lógica de reembolso, portanto cada Estado faz a despesa e depois é ressarcido por parte da Comissão Europeia", esclareceu Santos Silva em entrevista à Lusa.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros espera que “ainda no primeiro semestre possa verificar-se o tal adiantamento dos 10%”, referindo-se à primeira tranche que cada Estado-membro irá receber do Fundo de Recuperação e Resiliência, do qual Portugal receberá cerca de 15,3 mil milhões de euros em subvenções.
Esta libertação dos 10% da tranche só poderá acontecer, no entanto, quando a presidência portuguesa consiga uma maioria qualificada dos 27 para aprovar os planos nacionais dos Estados-membros.
O pagamento em retorno destes 750 mil milhões de euros deverá ser feito através da emissão de dívida pela Comissão Europeia, que poderá ser paga através de recursos próprios da UE, como um imposto baseado nos resíduos de plástico (a introduzir em 2021), ou um futuro imposto digital. Esta realidade necessita, no entanto, que seja alterada a legislação europeia sobre os ditos recursos próprios, um processo que exige uma decisão unânime dos Estados-membros.
O MNE mostra assim alguma preocupação com o complexo processo de ratificação do aumento do teto dos recursos próprios, que é indispensável à entrada em vigor do orçamento europeu para 2021-2027, e espera que seja "o mais curto possível", para poder “chegar ao fim da presidência com o QFP no terreno, com todos os regulamentos aprovados e os programas lançados".
São seis meses para concluir este processo, afirma Santos Silva. A seguir à entrega dos planos de recuperação, o Conselho terá de aprová-los, relembrando que, se assim o entender, cada Estado pode fazer “uma espécie de apelo” ao Conselho Europeu.
Durante estes seis meses, o QFP prevê o lançamento de vários programas, nomeadamente o programa Erasmus, o novo Corpo Europeu de Voluntariado, o Horizonte Europa e o Europa Criativa.
Vacinação gratuita e universal
Para Santos Silva, o terceiro desafio desta presidência será o processo de vacinação a nível europeu, e a sua gratuitidade, bem como o compromisso da Europa no apoio na vacinação mundial, para a qual o MNE diz estar com “um otimismo moderado, real”.
Santos Silva aponta, “com certeza”, janeiro como o mês em que iniciará o processo de vacinação, esperando o mesmo chegar ao fim da presidência "e dizer, não que o processo de vacinação esteja completo em todos os Estados, mas que esteja bem avançado".
Este "será outro evento transformador, haverá um antes e um depois, é um elemento essencial para a recuperação económica e social, nós não [a] asseguramos pondo em perigo as condições de saúde, é o contrário, na medida em que se nós formos eficazes e fortes na resposta à pandemia, nessa medida seremos mais rápidos e mais sólidos na recuperação económica e social", diz.
Um “impulso” no Pilar Europeu dos Direitos Sociais
Sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, Santos Silva diz esperar que exista um “impulso”, com “ponto alto” na Cimeira Social, a decorrer a 7 e 8 de maio, no Porto.
Para tal, espera o MNE que Portugal traga para a mesa temas como a nova "garantia para a infância", a diretiva regulamentar sobre o quadro europeu do salário mínimo, o reforço da garantia jovem, uma nova abordagem política das questões do envelhecimento e, finalmente, a união europeia para a saúde.
A cimeira, refere, irá ser “uma conferência de alto nível reunindo as instituições europeias, os Estados-membros, os parceiros sociais, as organizações não-governamentais e a academia, as universidades e centros de investigação, em torno da agenda social europeia”. “E a realização do Conselho Europeu informal, também dedicada aos temas da agenda social, da qual se espera um grande impulso político para a implementação do Plano Europeu dos Direitos Sociais", agregou.
Os temas passarão ainda pela proteção das crianças, jovens e dos idosos, bem como o salário mínimo europeu, sobre o qual Santos Silva comenta não estar em causa um valor único, uma vez que "seria um absurdo dadas as divergências económicas entre os Estados-membros", mas prefere "garantir um quadro de referência europeu para o salário mínimo".
Santos Silva aproveitou ainda para referir que espera que se discuta e se aplique também "toda a dimensão da igualdade e da não discriminação", com a “participação das mulheres nas administrações das empresas, a diretiva sobre a transparência salarial, a estratégia de realização dos direitos e de não discriminação das pessoas em função da sua orientação sexual".
Uma Europa ligada à América de Joe Biden, e ao resto do mundo
A “Europa global”, ou seja, o plano de relações entre a Europa e o resto do mundo, é mais um desafio para a presidência portuguesa da UE. Santos Silva confessa que gostaria de chegar ao fim de junho de 2021 a poder dizer que Portugal contribuiu "para que a abertura da Europa ao mundo […] se faça de forma equilibrada, olhando para os vários polos que constituem hoje a multipolaridade do mundo". Para tal, espera-se um estreitar de relações, nomeadamente, com os Estados Unidos, que vão empossar um novo presidente, Joe Biden, em janeiro de 2021. "O primeiro semestre do ano que vem será marcado, do ponto de vista da política externa da União Europeia, por este reencontro entre a União Europeia e os Estados Unidos, e eu sei bem a palavra que estou a usar: reencontro. Depois de quatro anos de parênteses, trata-se de reencontrar", sublinha Santos Silva em entrevista à Lusa.
Sobre a eleição de Joe Biden para liderar os Estados Unidos, Santos Silva referiu que "não vai ficar tudo como dantes, mas é um 'momentum' que não pode ser desperdiçado”.
Falou-se, em entrevista, ainda das relações entre o Reino Unido e a Europa, que deverão (ou não) finalizar o acordo do Brexit até ao final deste ano. Para Santos Silva, estamos "hoje mais perto de um acordo". "À data e hora a que falamos, as perspetivas são mais positivas do que eram na semana passada e, portanto, eu diria que estamos hoje mais perto de um acordo sobre a relação futura entre a União Europeia e o Reino Unido", afirmou o ministro na terça-feira de manhã.
O otimismo, justifica, deve-se a que, por exemplo, “por duas vezes […] a presidente da Comissão Europeia e o primeiro-ministro do Reino Unido impediram que houvesse o fecho das negociações sem resultado positivo" e, "sobretudo, porque aquilo que separa as duas entidades é hoje relativamente pouco".