Opinião de Filipa Moreira da Cruz
Sou uma otimista incorrigível. Acredito que melhor é (quase) sempre possível. No entanto, a minha tendência para ver o copo meio cheio tem sido duramente posta à prova. E nesta altura de balanços sou confrontada com várias realidades que me deixam uma sensação agridoce. Temo que 2021 venha a ser um déjà-vu do ano que acaba de terminar. Nada de novo no horizonte. E esta tendência vai durar. Infelizmente, a espécie humana não aprendeu nada com o maldito vírus. E quando este for exterminado, graças à vacina, virão outros. E ainda não estamos preparados.
É urgente mudar quase tudo. O nosso comportamento egoísta, egocêntrico e desmesurado ameaça constantemente a vida no único planeta capaz de nos acolher, a Terra. E se pensamos que o pior já passou, estamos enganados. A nossa resiliência será testada com frequência. A humanidade precisa de cair várias vezes para aprender. E nem assim consegue evitar os erros do passado. A história é cíclica e está recheada de padrões repetitivos. Os seres humanos são, por natureza, preguiçosos. É mais fácil não mudar nada. Evitam-se discussões e atritos. Além disso, se continuar tudo na mesma, haverá sempre uma razão para criticar os maus da fita do costume.
O ano que agora começou não será capaz de eliminar o vírus para sempre nem de apagar as atrocidades cometidas durante séculos. Não deixarão de existir “fábricas de bebés” na Nigéria. Porque vale tudo em troca de dinheiro. Até mesmo roubar crianças para satisfazer os caprichos sórdidos dos ricaços. Também em África, esse continente amaldiçoado, as vidas dos animais selvagens não serão poupadas devido à escassez de água. Esse bem precioso e raro vale mais que o ouro, mas é negligenciado. Os homens são obrigados a matar os animais em nome da sua sobrevivência. O Brexit ainda vai dar muitas dores de cabeça à União Europeia e ao Reino Unido e as consequências socioeconómicas irão atravessar o oceano Atlântico.
Continuaremos a usar máscara, o desemprego irá aumentar e os impostos também. Alguém terá de pagar os estragos da pandemia. A classe média está em vias de extinção. Os pobres estão ainda mais pobres. E os ricos… milionários assumidos sem escrúpulos nem pudor. Assistimos, impotentes, às diversas injustiças sociais. A lista de exemplos é longa. Deixo-vos um. A empresa americana General Electric anunciou despedimentos coletivos em todo o mundo. O responsável? A covid-19, claro! Paradoxalmente, o PDG Larry Culp não abdica do seu bónus de 47 milhões de dólares.
O nosso país não é exceção à regra. Infelizmente, também nos portamos muito mal. Fiquei chocada com a morte do imigrante ucraniano Ihor Homeniuk, espancado até à morte com murros, pontapés e um bastão extensível num país europeu que se diz contra a violência e o racismo. Não menos grave foi a falta de responsabilidade das autoridades. «Não vi nada, não sei nada, não digo nada». E o Governo, o que fez? Virou a cara para o lado. Como de costume. A prioridade é injetar mais milhões de euros na TAP, empresa falida há vários anos, onde os administradores não dispensam os seus ordenados chorudos. E quem paga? Os contribuintes. Who else?!
Portugal será o centro das atenções a nível nacional e internacional. As eleições a 24 de janeiro podem vir a ser uma surpresa. Ou uma telenovela sem fim. Por outro lado, a presidência do Conselho da União Europeia, durante o primeiro semestre, tem objetivos ambiciosos: Portugal pretende uma União Europeia mais resiliente, social, verde, digital e global. Tudo pode acontecer. Ou talvez não. Provavelmente, ficará tudo na mesma. A reviravolta está nas mãos dos cidadãos. Há muito tempo que deixei de acreditar nos políticos, mas confio na maior parte dos outros seres humanos. São eles os protagonistas da mudança. A esperança é a última a morrer. O resto… são histórias.