Como é que o Conselho Europeu organiza a escolha dos procuradores para o órgão competente?
Remete-se a solicitar aos governos um representante do país ou socorre-se de um processo de avaliação que combina a indicação de nomes com a passagem por um crivo de apreciação de técnicos por ela escolhidos?
Portanto, ou repousa na vontade dos governos ou entende acrescentar-lhe um outro fator de exigência e de independência.
Foi a segunda a escolha do Conselho.
Dois dos governos não seguiram a regra e ultrapassaram-na objetivamente.
Os demais adotaram-na como garante da transparência.
O Governo português encontrou um tertium genus.
Solicitou ao Conselho Superior do Ministério Público a escolha dos três nomes a enviar a Bruxelas.
Foram abertas candidaturas, apresentadas e só depois o mesmo Conselho definiu os critérios de apreciação. Soube-se agora.
Enviados os nomes ao Conselho Europeu, suscitou este a apreciação pelos peritos europeus.
Não concordaram eles, como estavam livres de o fazer, com a ordenação dos nomes indicada.
Optaram por um deles, uma candidata.
Entendeu o Ministério da Justiça manifestar a sua discordância. Definiu-se, assim, a tal posição diferenciada da regra aceite pela imensa maioria dos Estados.
Para a Reper foi enviada uma nota esclarecendo alguns pontos do curriculum do procurador preferido que lhe dariam vantagem.
Se assim, não fosse, dificilmente se compreenderia que fosse feita a nota. De outro modo seria absurda por desnecessária
O Conselho segue a preferência do Governo português, não sem a definir, como o fez em relação à indicação dos outros dois países, como estranha ao método geral seguido.
Vários peritos europeus apresentaram uma reclamação pela decisão do representante português.
Silêncio total.
Um belo dia descobre-se a nota enviada.
Mais se conclui que continha erros em relação ao curriculum do candidato.
Incomodado, o próprio declara ser alheio aos erros.
Ouvida, a ministra diz que nada sabia da nota.
Entalado, o diretor-geral da Política de Justiça diz não ter sido sua a responsabilidade e dá a entender ter o seu conteúdo origem no gabinete da ministra.
Demite-se. Publica uma esclarecedora nota, também.
A nota é mandada apagar do site do Ministério.
O ex-diretor-geral mete os pés pelas mãos e tenta retratar-se.
O Presidente da República declara a sua perplexidade.
O Governo corrige a nota enviada então a Bruxelas.
O primeiro dos ministros recebe a ministra e comunica manter a confiança nela.
Moral da história: estão todos desculpados.
O Governo não esteve de acordo com a escolha e defendeu outro nome, o seu.
Alguém tentou ajudar, empolando os dados curriculares.
Ninguém é responsável.
O redator da nota está na clandestinidade.
O problema está resolvido sem remissão.
Protesta a candidata excluída.
Interrogam-se os partidos todos pelo mistério.
E, no fundo, é tudo tão simples.
O Governo achava três nomes demasiados, era indicada a escolha do primeiro, era um exagero a exigência dos peritos independentes.
Discute-se hoje a democracia e a pandemia.
Exagero claro.
Um obscuro funcionário, no segredo de um ministério, murmura o que o governo quer e a sua vontade é lei.
Nota-se muito?