Portugal encontra-se numa situação crítica em relação à progressão da pandemia de covid-19. De ‘milagre português’, passámos para os primeiros lugares dos países europeus na progressão das infeções. Temos um problema muito sério nos contágios e, fortemente relacionado com este, uma falha gravíssima no rastreio.
Várias são as razões para termos chegado a esta situação dramática. Mas seguramente que uma das causas mais relevantes é a insuficiência no rastreio, uma situação que há muitos meses era alvo de alerta. Pior – o Governo admitiu este problema e durante o verão prometeu corrigir o problema, anunciando, sucessivamente, soluções que se sabe agora que não foram eficazes. Esta semana ficámos a saber que em 87% dos casos de infeção não é conhecida a origem. Ou seja, na esmagadora maioria dos casos não há rastreio eficaz.
Já poucos se recordam, mas o Governo promoveu a aplicação de rastreio – StayAway Covid – para utilização nos telemóveis. Mais, foi até proposto o seu uso obrigatório. Na ocasião, várias vozes colocaram em causa a legitimidade da iniciativa por colidir com os direitos de privacidade dos cidadãos. Por esse motivo, a proposta de lei ficou convenientemente ‘adormecida’ no Parlamento e lá permanece sem qualquer desenvolvimento desde outubro. Infelizmente, esta aplicação acabou por não ser levada a sério, nem pelos cidadãos, nem pelo Governo que desistiu da sua utilidade.
Hoje, perante esta situação dramática de progressão das infeções, com a incapacidade de rastreio e perante este estado de exceção, valia a pena ponderar a utilidade daquela aplicação como instrumento de rastreio efetivo, bem como a sua utilização obrigatória. Não estamos em tempos normais e as restrições e condicionamento de direitos são uma realidade. Se a aplicação é útil, então deve ser utilizada. Se tem de ser adaptada para o uso obrigatório, que seja. O que não é admissível é que não se utilizem todas as ferramentas neste combate.
Perante o atual cenário, o maior erro é a manutenção da atividade escolar sem qualquer alteração, independentemente do nível de escolaridade e sem ponderação, sequer, da possibilidade de ensino misto (presencial e à distância).
Pode justificar-se esta situação nos primeiros anos de escolaridade, pela pouca expressão que o escalão etário entre os 0 e os 9 anos tem nas infeções (que se tem mantido muito baixa) e pelo impacto social que provocaria a manutenção das crianças em casas, necessitando de acompanhamento. No entanto, a insistência em manter a atividade escolar sem alterações nos ensinos secundário e universitário é muito imprudente.
Se é verdade que a doença, no escalão entre os 10 e os 19 anos, não ocupa a parte substancial da percentagem do total dos infetados, o que é relevante é a progressão dos novos casos neste escalão etário que era de menos de 5% no início de setembro e que atinge agora perto de 10%. Este foi o único escalão com crescimento significativo desde o início do ano letivo.
E não é verdade que a comunidade científica esteja dividida quanto à vantagem de suspensão da atividade escolar presencial. A divisão foi entre o ‘agrava muito’ ou ‘agrava pouco’. E entre a comunidade educativa também não há unanimidade. Perante a dúvida, em vez da prudência, o Governo resolveu arriscar. Mal.
Mas se a opção deste confinamento, entre as demasiadas exceções, foi manter as escolas a funcionar com toda a comunidade educativa em contacto, então que se atue neste contexto de modo a evitar que passe a ser este o principal foco de contágio comunitário. Que se teste sistematicamente, que se pondere o critério de prioridade da vacinação e que se avalie a possibilidade da utilização obrigatória de uma aplicação de rastreio na comunidade escolar.