ADSE. Alargamento vai beneficiar mais de 101 mil e render mais 20 milhões

Funcionários públicos com contrato individual de trabalho podem inscrever-se no subsistema de saúde durante o primeiro semestre. Eugénio Rosa faz contas e deixa alertas.

A ADSE vai ser alargada aos funcionários públicos com contrato individual de trabalho. Esta alteração representa uma entrada de 101 mil novos membros para o subsistema de saúde – cerca de 61% do setor de saúde –, o que terá um impacto líquido de cerca de 20 milhões de euros. As contas são de Eugénio Rosa, que aplaude estas novas alterações. “Na administração pública (central, local e regional) existia uma profunda injustiça que resultava do facto de os trabalhadores com contrato em funções públicas terem o direito de se inscrever na ADSE, enquanto os trabalhadores com contrato individual de trabalho (mais de 101 mil), exercendo as mesmas funções e trabalhando muitas vezes nas mesmas entidades, não podiam inscrever-se na ADSE”, diz o economista – uma situação que, no seu entender, representa uma “grande injustiça e desigualdade”, refere num estudo a que o i teve acesso.

E lembra que a ADSE não é financiada pelo Orçamento do Estado e, como tal, considera que não deve ser vista como regalia dos funcionários públicos. “É atualmente financiada pelos descontos (3,5%) feitos nas remunerações dos trabalhadores e nas pensões dos aposentados da função pública”.

O economista faz as contas e lembra que, entre 2012 e 2020, os trabalhadores e os aposentados da função pública descontaram nas suas remunerações e pensões 4541,9 milhões de euros para financiar a ADSE. No entanto, só nos três últimos anos (2018/2020), as contribuições dos trabalhadores e aposentados para a ADSE somaram mais de 1824 milhões de euros.

Estes números levam Eugénio Rosa a compará-los com os gastos que foram feitos. “Em 2019, a ADSE gastou com cuidados de saúde aos beneficiários no regime convencionado 410 milhões e, no regime livre, 150 milhões, o que dá um total de 560 milhões de euros”. No mesmo ano, os descontos atingiram 608,1 milhões de euros, afirma, apesar de notar que “há ainda as despesas de funcionamento e investimento”.

E deixa um alerta: “É importante esclarecer que, embora os descontos feitos pelos trabalhadores e aposentados sejam utilizados para pagar cuidados de saúde prestados por entidades privadas (Luz, CUF, Lusíadas, Trofa, grupo HPA e mais 30 mil pequenos e médios prestadores privados), a ADSE não é igual a um seguro de saúde privado, cujo objetivo é o lucro, como muitos pensam ou dizem”, refere o economista, acrescentando que, na ADSE, os familiares dos trabalhadores e aposentados, se não têm rendimentos, não descontam, o que não acontece num seguro privado de saúde. “E são cerca de 357 mil. Em 2019, a ADSE despendeu 72,9 milhões com despesas de saúde de familiares”.

O mesmo acontece quando os aposentados cuja pensão deduzida do desconto de 3,5% seja inferior a 635 euros, mesmo beneficiando da ADSE, estão isentos de pagamento de qualquer contribuição para este subsistema de saúde. “No fim de 2020 eram já 64 mil. Não há nenhum seguro privado de saúde que faça isto e a ADSE também não devia fazer, pois uma política social deve ser financiada pelo Estado, e não com descontos dos trabalhadores e aposentados. Na ADSE não há plafond de despesa por beneficiário. Não existe nenhum seguro privado de saúde em que não existam plafonds de despesa. E quando o beneficiário envelhece e se aposenta e os seus custos com saúde aumentam, ultrapassando a maior parte das vezes o desconto que faz, este não aumenta; pelo contrário, até diminui, pois como a pensão é sempre inferior à remuneração no ativo, e é sobre a remuneração e a pensão que se desconta 3,5%, como esta é inferior, o aposentado passa a descontar, em euros, menos, mas a sua despesa aumenta – portanto, o contrário do que sucede num seguro privado de saúde, cujo prémio aumenta muito com a idade.

No entanto, o economista lembra que um trabalhador ou um aposentado, quando faz o seu desconto, não pode pensar que é apenas para si enquanto está no ativo e contribui mais do que despende. “Esse desconto serve para suportar a sua despesa com serviços de saúde e a dos seus familiares, que não descontam nada, e também para, quando envelhecer e os seus custos de saúde dispararem e forem superiores ao seu desconto (em 2019, a contribuição média anual por aposentado foi de 674 euros, enquanto a despesa média também anual foi de 977 euros), poder ter direito a que essas despesas sejam também suportadas pelos descontos dos outros beneficiários titulares, que são ainda contribuintes líquidos porque pagam mais do que gastam, já que a ADSE assenta na solidariedade interprofissional e intergeracional”, refere.

 

Novas inscrições

O economista lembra que para os trabalhadores que entrem no futuro para a administração pública com contrato de trabalho em funções públicas sem termo ou com contrato individual de trabalho sem termo, a entidade empregadora fica obrigada a fazer a “inscrição na ADSE no prazo de um mês a contar da data da constituição da primeira relação jurídica de emprego público a titulo definitivo ou da celebração do primeiro contrato individual de trabalho sem termo”, tal como está previsto na legislação.

No entanto, esses trabalhadores podem renunciar mas, nesse caso, Eugénio Rosa lembra que, se isso acontecer, não podem inscrever-se na ADSE.

Quem pode inscrever-se? De acordo com a legislação, os trabalhadores podem requerer a sua inscrição como beneficiário titular no prazo de seis meses a contar da data de 8 de janeiro deste ano. Mas há exceções: todos aqueles que tenham anteriormente renunciado à qualidade de beneficiário.

Além disso, um trabalhador com contratos a prazo, seja contrato em funções públicas a termo ou contrato individual de trabalho a termo, só a partir do terceiro contrato a prazo é que perde definitivamente o direito de se inscrever na ADSE, e o contrato a prazo atual é considerado como o primeiro contrato.

 

Isentos

Até ao último decreto-lei, para um aposentado com uma pensão que, deduzido o desconto de 3,5%, ficasse com um valor que fosse inferior ao salário mínimo nacional, tanto ele como os seus familiares dependentes ficavam isentos do pagamento de qualquer contribuição para a ADSE. Mas Eugénio Rosa lembra que “com o aumento significativo do salário mínimo nacional anualmente, o número de aposentados isentos estava a crescer rapidamente, constituindo já uma despesa pesada para a ADSE. Em 2020, o seu número rondava os 64 mil, sem incluir os familiares, e a despesa anual suportada pela ADSE deve ter atingido os 58 milhões de euros, tendo como base de cálculo a despesa média em saúde (regime convencionado e no regime livre) em 2019 por aposentado suportada pela ADSE”, refere.

O certo é que a nova legislação faz uma alteração: “O limite de 635 euros é congelado e deixou de ser atualizado com base no salário mínimo nacional, como acontecia. No entanto, os isentos atuais mantêm o benefício mesmo que a sua pensão aumente e mesmo que, deduzindo o desconto, ultrapasse os 635 euros. Os novos aposentados ficam isentos desde que, após a dedução de 3,5%, se obtenha um valor inferior a 635 euros”, diz Eugénio Rosa, acrescentando que “o problema se mantém em parte porque a ADSE continuará a perder elevada receita com estes aposentados isentos e não é ressarcida pelo Estado, apesar da decisão do Tribunal de Contas de que o Orçamento do Estado devia suportar”.