Por Filipa Moreira da Cruz
Portugal anda, quase sempre, nas bocas do mundo. Muitas vezes pelas piores razões. Contrariando esta tendência, no início da pandemia, fomos considerados um exemplo a seguir. Uma precipitação dos que conhecem mal o espírito lusitano. A imprensa estrangeira enaltecia o ‘milagre português’. Vários amigos diziam-me que o meu país estava de parabéns. Eu concordava timidamente porque sei que não há fartura que sempre dure. E estava certa. Infelizmente.
O que falhou? É sempre mais fácil julgar quando não acontece connosco. No entanto, atrevo-me a especular que talvez tenhamos pecado por excesso de confiança. Começamos por gerir bem e achamos que estávamos safos. Como no futebol. Marcamos um golo aos 3 minutos e já cantamos vitória. Resultado: não conseguimos segurar o resultado. Às vezes, damos a volta por cima com um lance à Figo ou à Ronaldo, segundos antes do apito final. Mas nem sempre é assim.
E com a covid-19 as coisas estão a correr mal. Muito mal. Novembro foi um mês negro e janeiro tem-se demonstrado ainda mais impiedoso. Os casos positivos aumentam diariamente e as mortes são às centenas. Longe estão os animadores números de maio ou junho. Médicos e enfermeiros, exaustos, sentem-se impotentes face ao drama nacional. É impossível salvar todas as vidas humanas.
E o que faz o Governo? Opta por um comportamento bipolar, como de costume. E isto não é apenas típico da ‘geringonça’. Há várias décadas que esquerda, direita e centro desgovernam o país. Sem escrúpulos nem pudor. O dinheiro da União Europeia gasto na saúde, na educação e na cultura? Não, sejamos originais. Construamos autoestradas que estarão sempre vazias. Estudar no estrangeiro? Não, as universidades portuguesas são excelentes, mas emigrem quando terminarem o curso porque não há trabalho em Portugal. Consumir o que produzimos? Não, poupem porque terão de pagar a má gestão da TAP. Queixar-se? Não, calem a boca e contribuam com os impostos que ajudam a dissimular branqueamento de dinheiro, corrupção e falcatruas.
Fiquem em casa» são as palavras de ordem, mas… Levem as crianças à escola, utilizem os transportes públicos apinhados e, sobretudo vão votar. Porque o voto é um direito e quase um dever. E assistam ao ballet descoordenado de norte a sul com os candidatos à presidência em campanha pelo país confinado. Esta telenovela teria uma certa graça se não fosse exigido um esforço colossal à população para combater o vírus. Muitos perderam o trabalho e outros tantos viram os seus ordenados baixar drasticamente.
O Governo culpa os irresponsáveis que não usam a máscara corretamente. Aponta o dedo aos que não se confinam. Condena os que se recusam a trabalhar à distância. Tem razão, mas não dá o exemplo. Fecha os olhos a certas aglomerações, não adia as eleições, envia as crianças e os jovens para a linha da frente, vacina indivíduos em cargos no poder, mas que não são considerados prioritários. Nada de novo no país que se contenta em ter mais de 300 dias de sol por ano.
O verdadeiro milagre português seria o Governo (e a oposição, tão cúmplice!) ter a honestidade e coragem de admitir que errou no combate ao vírus e em tantas outras situações. Não nos esqueçamos que 2020 foi vergonhoso em vários aspetos e 2021 começou da pior maneira. Ainda assim, não perco a esperança e fico à espera de boas notícias do meu país.