Myanmar em greve geral contra o regime militar

A junta militar birmanesa, conhecida pela sua brutalidade, ripostou com força letal, sendo acusada de matar pelo menos dois manifestantes

O Myanmar entrou em greve geral esta segunda-feira, em protesto contra a tomada de poder por uma junta militar. Lojas, bancos e fábricas estão paralisados desde ontem. Multidões inundaram as ruas de várias cidades, mas o exército birmanês, o Tatmadaw, conhecido pela sua brutalidade, não ficou parado. Logo no primeiro dia da greve geral, foram mortos dois civis que participavam num protesto em Myitkyina, no norte do país. O fumo provocado pelo disparo de granadas e gás lacrimogéneo contra os manifestantes impossibilitou determinar com clareza a origem dos disparos, mas “tanto a polícia como os militares estavam presentes”, esclareceu uma testemunha à Reuters.

Não é a primeira vez que os militares abrem fogo real contra manifestantes, desde que derrubaram o Governo Aung San Suu Kyi, no início de fevereiro. Após protestos massivos, o maior banho de sangue deu-se a 3 de março, quando pelo menos 38 manifestantes foram massacrados e outros tantos ficaram feridos.

Além de balas, o exército birmanês reprimiu os manifestantes com gás lacrimogéneo, projéteis de borracha e granadas de choque. “É horrível, é um massacre. Nenhuma palavra pode descrever a situação e os nossos sentimentos”, descreveu uma jovem ativista birmanesa à agência norte-americana. 

 

Lavar a imagem Não é de espantar que a junta militar seja alvo de duras críticas pela comunidade internacional. A desumanidade dos ataques descritos nos jornais e televisões internacionais causou ultraje por todo o mundo.

Confrontado com as acusações, o Tatmadaw recrutou um antigo oficial dos serviços secretos militares israelitas, Ari Ben-Menashe, para explicar a “verdadeira situação” que se vive no país. Suspeitos de atrocidades e incompreendidos pelos líderes internacionais, os militares explicam, que San Suu Kyi, a líder afastada, não é inocente. Ben-Menashe tem tentado convencer a comunidade internacional que Suu Kyi é culpada de perseguir os rohingya, uma minoria birmanesa alvo de genocídio.

Ironicamente, o Tatmadaw é que é acusado do crime pelas autoridades internacionais desse crime, enquanto San Suu Kyi protegia os militares, inclusive negando o genocídio em Haia, perante o Tribunal Penal Internacional. A recusa da líder democrata em criticar os assassínios em massa danificou irreparavelmente a sua imagem no estrangeiro como Nobel da Paz, distinção que lhe foi atribuída em 1991.

Este é o calcanhar de Aquiles da líder democrata e aquele que a junta militar pretende atingir. Agora, o Tatmadaw até tenta justificar que as eleições de novembro – em que o Partido União, Solidariedade e Desenvolvimento (USDP), dos militares, elegeu apenas uns humilhantes 7% dos deputados, e em que o partido de Suu Kyi teve mais de 80% dos votos – foram fraudulentas, por não estarem representadas as minorias étnicas do país. O Governo de Suu Kiy é acusado de as impedir de votar. 

Mas a comunidade internacional não parece disposta a aceitar estas justificações. A Austrália anunciou hoje a suspensão da cooperação militar com Myanmar em resposta à constante repressão dos protestos, que já causaram a morte de mais 50 pessoas e a detenção de 1790 pessoas.