Foi o último estranho a entrar na nobre linhagem dos campeões de Inglaterra de futebol. Que país se pode dar ao luxo de ter tido 24 vencedores do campeonato? Só mesmo um país excecional com um futebol excecional! Neste momento em terceiro lugar da Premier League, o Leicester (eles dizem Lester) teima em provar que o título conquistado em 2015-16 não foi um mero bambúrrio, a despeito da surpresa que provocou. Apesar de tudo, quando passamos os olhos pelo troféus conquistados pelo clube dessa cidade do East Middlands, a norte de Birmingham mas a sul de Nottingham, encontramos apenas títulos secundários: três vitórias na Taça da Liga – 1963–64, 1996–97, 1999–2000; sete vitórias no campeonato da II Divisão – 1924–25, 1936–37, 1953–54, 1956–57, 1970–71, 1979–80, 2013–14; campeão da III Divisão em 2008-09. Na Taça de Inglaterra, nem uma vitória. Só finais perdidas: 1948–49, 1960–61, 1962–63, 1968–69.
Se nos últimos tempos, o Leicester tem andado na crista da onda, muito se deve, obviamente, ao trabalho de gente que preparou cuidadosamente o clube para se instalar na Premier League e por lá ficar per omnia saecula saeculorum. Um desses homens foi Craig Robert Shakespeare que já tinha estado no clube como treinador até decidir aceitar a proposta para se tornar no responsável por toda a área desportiva. Foi ele que trouxe Claudio Ranieri para o Leicester, o treinador italiano que parecia avesso a conquistar títulos mas acabou por fazer um trabalho absolutamente extraordinário, levando-o ao ponto mais alto da sua história.
Fosse
O Leicester nasceu no ano de 1884. Não é nenhum menino. A sua primeira designação oficial foi Leicester Fosse FC. O Fosse vinha do nome do campo onde a equipa recebia os seus adversários, situado em Fosse Road. Seis anos mais tarde, Fosse tornou-se demasiado pequeno para um clube que tinha sido aceite para participar na Football League. A mudança era inevitável. A nova morada, a partir de 1891, passou a ser Filbert Street e o Fosse caiu, passando simplesmente a Leicester City FC.
Como costuma ser prática em Inglaterra, o Leicester Fosse foi criado por um grupo de alunos da Wyggestone School. Antes de se fixar definitivamente (bem, não definitivamente, porque hoje em dia têm como casa o King Power Stadium, fruto da remodelação do Walkers Stadium) em Filbert Street, a rapaziada andou com a casa às costas, desde Victoria Park, a oeste da cidade, ao bem mais pomposo Belgrave Road Cycle and Cricket Ground. Em 1907-08, subiu pela primeira vez à divisão principal rodeado pela natural alegria dos seus adeptos. mas a festa só durou uma época. De novo relegado, o Leicester viria a cair numa profundíssima crise financeira durante a I Grande Guerra.
Os esforços levados a cabo por industriais da cidade que arriscaram na contratação de alguns dos bons treinadores ingleses como Peter Hodge e Willie Orr, e num avançado-centro poderoso chamado Arthur Clarence Hillier Chandler, que chegou ao clube em 1923, reativaram o sangue da agremiação que passou por uma fase de sobe-e-desce. Chandler, por seu lado, tornou-se no maior goleador da história do Leicester. Natural de Paddington, nascido no dia 18 de junho de 1894, tornou-se aquilo que, hoje em dia, James Vardy significa para os Foxes. Vindo do Queens Park Rangers, em 393 jogos marcou o exagero de 259 golos. Um herói que os adeptos jamais esqueceram.
As raposas
O epíteto de Foxes (raposas) só entrou para o léxico de Leicester em 1948. Nesse ano, os dirigentes do clube decidiram alterar o equipamento, talvez por não se sentirem confortáveis dentro de uma camisola negra com uma lista diagonal azul e calções brancos. Optaram por camisas azuis e calções brancos e foram buscar como símbolo o animal mais frequentemente caçado na região Leicestershire, a raposa, sendo as caçadas a cavalos e com cães famosas na região. «Tally-Ho!».
Se a raposa terá, ou não, trazido sorte aos rapazes de Leicester, não se sabe. O facto é que o seu crescimento no futebol inglês tornou-se progressivo, sobretudo quando atingiram pela primeira vez a final da Taça de Inglaterra, em 1949, perdendo para o Wolverhampton. Entre novas descidas e subidas, mais duas finais da Taça, em 1961 e 1963, deram ao clube um prestígio que não tinha tido até então.
No próximo domingo, O Leicester recebe o quase-campeão Manchester City. Está na luta pela presença na Liga dos Campeões. Algo que revela muito do seu poder nos dias que correm. A oito jornadas do fim do campeonato, têm cinco pontos de avanço sobre o quarto, o Chelsea, e dez sobre o campeão da época passada, o Liverpool. Tudo motivos para que as raposas corram felizes pelos relvados de Inglaterra…